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Legislação

- Publicada em 31 de Dezembro de 2019 às 03:00

MP do Contribuinte Legal gera polêmica

Especialistas dizem que União terá o poder para decidir quem poderá parcelar dívidas

Especialistas dizem que União terá o poder para decidir quem poderá parcelar dívidas


/ rawpixel.com via freepik.com/divulgação/jc
A MP (medida provisória) do Contribuinte Legal, editada pelo presidente Jair Bolsonaro em outubro, dá poderes ao Executivo de celebrar acordos com contribuintes em débito com o fisco utilizando critérios elaborados pelo próprio governo e sem aval do Congresso.
A MP (medida provisória) do Contribuinte Legal, editada pelo presidente Jair Bolsonaro em outubro, dá poderes ao Executivo de celebrar acordos com contribuintes em débito com o fisco utilizando critérios elaborados pelo próprio governo e sem aval do Congresso.
Para especialistas, a norma concede poderes excessivos ao Executivo e permite que o governo adote critérios arbitrários para definir a quem vai dar o benefício de um acordo para sanar dívidas com descontos, o que pode estimular situações de favorecimento.
A MP, que ainda precisa ser aprovada pelo Congresso para virar lei, regulamenta a chamada transação resolutiva de litígio, que está prevista no Código Tributário Nacional desde 1966, mas nunca foi aplicada.
"Sempre existiu uma problemática sobre como regular essa negociação porque os bens públicos são da coletividade e não podem ser liberados para terceiros por conveniência do agente público. O governo não pode unilateralmente decidir, por exemplo, não fazer uma cobrança de imposto", diz o tributarista Guilherme Guimarães Oliveira.
"Abrir mão de receita é algo grave, e geralmente é um poder que se delega ao Legislativo. Todos os Refis, por exemplo, foram aprovados pelo Congresso. Agora, a MP autoriza genericamente o Executivo a fazer isso. É pouco saudável do ponto de vista normativo", diz Luca Salvoni, sócio do escritório Cascione.
O texto da norma afirma que os acordos poderão ser assinados nos casos em que exista dívida ativa do contribuinte com a União e em caso de contenciosos tributários considerados relevantes pelo Ministério da Economia. A dívida ativa é o título por meio do qual a União cobra tributos na Justiça, em geral depois que o contribuinte perde os recursos na esfera administrativa.
Nesses casos, a MP prevê que a União possa conceder até 70% de desconto sobre os valores dos débitos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação pela PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional). O pagamento poderá ser feito em até cem meses. Segundo o governo, esses benefícios poderiam chegar a 1,9 milhão de contribuintes, cujas dívidas superam R$ 1,4 trilhão.
Para as negociações em que o débito fiscal estiver relacionado a um contencioso, o texto da MP também permite ao governo dar descontos sobre o valor da dívida e parcelar o pagamento em até 84 meses.
O texto prevê dois tipos de acordo: por meio da adesão do contribuinte devedor aos critérios estabelecidos em portaria da PGFN ou de acordos individuais, propostos pelo contribuinte ao governo ou vice-versa. Pela portaria, a União já pode fazer acordos com contribuintes que tenham dívidas totais superiores a R$ 15 milhões em casos de capacidade insuficiente de pagamento.
Também há a opção de fazer a tratativa com empresas em recuperação judicial ou falidas e em caso de dívida suspensa por decisão judicial, nesse caso desde que o montante supere R$ 1 milhão. O texto também incluiu a possibilidade de o devedor utilizar precatórios federais para amortizar sua dívida. Para o advogado Rodrigo Prado, sócio do escritório Felsberg, o ponto traz uma inovação.
Na opinião do advogado tributarista Hugo Macedo Segundo, professor da Universidade Federal do Ceará, a MP institui uma espécie de Refis, mas não fala em prazos para adesão e vale apenas para quem o fisco decidir conceder o benefício. "A medida certamente terá validade questionada. O texto fala em negociação do contribuinte com o Executivo, mas a Fazenda e o contribuinte não estão em igualdade de condições. O que deverá acontecer é que os grandes contribuintes serão beneficiados", afirma Macedo.
Macedo salienta, ainda, que os critérios para assinar os acordos, pelo texto da MP, são discricionários. "Cabe ali o que o Executivo quiser, há falta de parâmetro. As regras deveriam ser claras, objetivas e isonômicas", afirma. Para ele, a norma tem dois pontos inconstitucionais.
"O texto busca isentar autoridades que participam da negociação da transação de qualquer responsabilidade administrativa, salvo se ficar comprovada a má-fé para beneficiar terceiros, mas a Constituição diz que MPs não podem tratar de temas penais. Além disso, o texto diz que, se o contribuinte descumprir o acordo, a União poderá pedir sua falência, o que é matéria processual da qual medidas provisórias não podem tratar."

Concentração de poder traz riscos de favorecimento ou de corrupção

Salvoni alerta que concentração de poder pode trazer riscos como o de favorecimento ou corrupção

Salvoni alerta que concentração de poder pode trazer riscos como o de favorecimento ou corrupção


/CASCIONE PULINO BOULOS ADVOGADOS/DIVULGAÇÃO/JC
Para o sócio do escritório Cascione, Luca Salvoni, a concentração de poder pode trazer riscos como o de favorecimento ou corrupção, já que as regras e as balizas para a concessão do benefício são definidas pelo próprio Executivo. "Algum contribuinte pode se sentir lesado por não ter recebido o mesmo tratamento de um concorrente, e isso pode gerar judicialização." Apesar disso, Salvoni afirma que a norma busca resolver problemas do Fisco.
Segundo o especialista, o texto é útil porque se propõe a reduzir o estoque enorme de passivos de créditos considerados incobráveis ou de difícil recuperação e busca resolver contenciosos antigos, o que é bom. "Ainda discutimos débitos do Plano Verão, de 1989. Não tem cabimento", salienta
O tributarista Guilherme Guimarães Oliveira complementa que, geralmente, a legislação já fixa os critérios de maneira clara. No entanto, a MP deixa a cargo do Executivo estabelecer quais serão as premissas para o contribuinte fazer um acordo. "Pelo texto da MP, a administração pública tem carta branca para propor a um contribuinte uma negociação sem trazer a possibilidade de que outro nas mesmas condições possa negociar", diz Oliveira, salientando que, nesse caso, a administração pública passa a exercer um papel que, a rigor, é do legislador.
Para o advogado tributarista Hugo Macedo Segundo, a norma deixa uma brecha para que os acordos individuais celebrados com contribuintes não sejam públicos. "O texto fala em manter o princípio da isonomia e da transparência, mas os condiciona ao respeito do sigilo fiscal. Na prática, poderemos ter acordos confidenciais, o que compromete a transparência." O sócio do escritório Felsberg, Rodrigo Prado, afirma, contudo, que a MP "caminha na tentativa de aproximar mais Fisco e contribuinte para discutir o pagamento de tributos, algo inédito na história do País".
Procurada, a PGFN disse, em nota, que a MP "possui compatibilidade plena com a Constituição Federal". "A MP 899/2019 prevê expressamente a autorização para que os litígios tributários sejam resolvidos através de acordo entre os contribuintes e a administração pública, bem como limites bastante claros e objetivos paras as concessões por parte da administração tributária."
Segundo o órgão, o Congresso dará a autorização para que esses acordos sejam realizados ao aprovar a MP e convertê-la em lei, "segundo balizas objetivas, limites claros e percentuais definidos". Para a Procuradoria, "não há que falar em ausência de autorização pelo Congresso ou mesmo ausência de critérios, não podendo olvidar que mesmo as transações individuais deverão observar balizas previstas em ato da PGFN. 

Simples está excluído do programa

Rodrigues informa que potencial da arrecadação com o programa em 2020 é de R$ 5,5 bilhões

Rodrigues informa que potencial da arrecadação com o programa em 2020 é de R$ 5,5 bilhões


/FABIO RODRIGUES POZZEBOM/ABR/JC
O único tipo de dívida que está excluído do programa é o do Simples Nacional, para empresas com faturamento de até R$ 4,8 milhões. Também estão de fora multas criminais e fraudes fiscais. São exemplos de dívidas de impostos federais que, em tese, serão contempladas no programa: Imposto de Renda, contribuições à Previdência, IPI, PIS e Cofins.
De acordo com o Ministério da Economia, a negociação será aplicada em duas possibilidades: cobrança da dívida ativa e transações de contencioso tributário. No caso de transações na cobrança da dívida ativa, conforme o governo, a modalidade poderá auxiliar na regularização de 1,9 milhão de devedores, cujos débitos junto à União superam R$ 1,4 trilhão.
Nesses casos, os descontos poderão ser de até 50% sobre juros e multas da dívida, que podem aumentar para até 70% no caso de pessoas físicas, micro ou pequenas empresas. O pagamento poderá ser feito em até 100 meses.
Já as transações no contencioso tributário, poderão encerrar milhares de processos que envolvem valores superiores a R$ 600 bilhões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), última instância para recorrer administrativamente de autuações do Fisco, e R$ 40 bilhões garantidos por seguro e caução.
Poderão ser beneficiados devedores cujas dívidas estão em fase de discussão no âmbito do contencioso tributário administrativo ou judicial, em casos cujas controvérsias são consideradas relevantes e disseminadas. As negociações sempre envolverão concessões recíprocas entre as partes.
O edital para negociação poderá prever descontos e prazo de até 84 meses para pagamento. A medida não poderá contrariar decisão judicial definitiva e não autorizará a restituição de valores já pagos ou compensados.
O governo conta com essa renegociação para reforçar o caixa nos próximos anos. De acordo com o secretário especial da Fazenda, do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, a estimativa conservadora do potencial da arrecadação com o programa em 2020 é de R$ 5,5 bilhões. Esse dinheiro deve ser usado para ajudar o governo a fechar as contas no ano que vem. A meta fiscal de 2020 permite que as contas fiquem no vermelho em até R$ 124 bilhões. 

Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional regulamenta o acordo de transação previsto na medida provisória

Portaria nº 11.956, de 27 de novembro de 2019, que regulamenta a resolução de conflitos

Portaria nº 11.956, de 27 de novembro de 2019, que regulamenta a resolução de conflitos


/MARCELO G. RIBEIRO/JC
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) publicou a Portaria nº 11.956, de 27 de novembro de 2019, que regulamenta a resolução de conflitos entre a Administração Tributária Federal e os contribuintes com débitos junto à União - que não cometeram fraudes e que se enquadrem nas modalidades previstas na MP do Contribuinte Legal. Existem três modalidades de transação: por adesão, por proposta individual do contribuinte e por proposta individual da PGFN.
A legislação vigente veda a transação de débitos de FGTS, Simples Nacional, multas qualificadas e criminais. Portanto, são passíveis de acordo com desconto apenas os débitos inscritos em dívida ativa da União considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação - quando a situação econômica do devedor não gera capacidade de pagamento suficiente para o pagamento integral das suas dívidas em prazo de até cinco anos.
O Acordo de Transação por Adesão somente estará disponível mediante a publicação de edital no site, no qual a PGFN notificará os contribuintes que se encaixam na modalidade. No documento estarão previstas as condições, os benefícios e o prazo para adesão. O primeiro edital de transação está previsto para ser publicado nesta primeira semana de dezembro. Após a publicação, o serviço estará disponível para adesão, pela internet, no portal Regularize.
É importante destacar que o Acordo de Transação por Adesão contempla apenas os contribuintes com dívida total de até R$ 15 milhões. Para débitos superiores somente será autorizada a transação individual.
No Acordo de Transação Individual proposto pelo devedor Modalidade serão aceitos devedores com dívida total superior a R$ 15 milhões e determinados tipos de contribuintes como: devedor falido, em processo de liquidação ou recuperação, independentemente do valor da dívida; entes públicos, independentemente do valor da dívida e dívidas suspensas por decisão judicial de valor superior a R$ 1 milhão e devidamente garantidas.
O interessado deverá comparecer à unidade da PGFN do seu domicílio fiscal para apresentar o Plano de Recuperação Fiscal, com descrição dos meios para extinção dos débitos. O Plano deverá conter as informações exigidas no art. 36 da Portaria PGFN nº 11.956/2019.
Já o Acordo de Transação Individual proposto pela PGFN prevê notificação feita pela procuradoria com proposta de transação, por meio postal ou eletronicamente, o contribuinte apto à adesão. O notificado poderá apresentar requerimento de adesão ou contraproposta perante a unidade da PGFN do seu domicílio fiscal. A contraproposta deve estar acompanhada de Plano de Recuperação Fiscal, com as informações exigidas no art. 36 da Portaria PGFN nº 11.956/2019.
As propostas individuais poderão ser encaminhadas a grandes devedores ou determinados tipos de contribuintes, conforme as modalidades a seguir: grande devedor (com dívida total superior a R$ 15 milhões) com capacidade de pagamento insuficiente; devedor falido, em processo de liquidação ou recuperação, independentemente do valor da dívida; entes públicos, independentemente do valor da dívida e dívidas suspensas por decisão judicial de valor superior a R$ 1 milhão e devidamente garantidas.
O acompanhamento do requerimento, de qualquer modalidade, e as notificações de eventuais pendências deverão ser feitos exclusivamente pelo portal Regularize. A cobrança do débito é suspensa enquanto perdurar o acordo.