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Contas públicas

- Publicada em 02 de Janeiro de 2019 às 00:54

Estados não admitem problemas na área fiscal

Rio Grande do Sul reconheceu passivos e destacou esforço para resolver

Rio Grande do Sul reconheceu passivos e destacou esforço para resolver


MARIANA CARLESSO/JC
"A taxa é zero o juro é alto vamos conversar. Ressarcimento pagamento vamos negociar. Aquela dívida de uns anos atrás está bem viva, você não lembra mais." A música "Dívida", da banda gaúcha Ultramen, resume bem a situação de muitos estados brasileiros. 
"A taxa é zero o juro é alto vamos conversar. Ressarcimento pagamento vamos negociar. Aquela dívida de uns anos atrás está bem viva, você não lembra mais." A música "Dívida", da banda gaúcha Ultramen, resume bem a situação de muitos estados brasileiros. 
Com risco de serem punidos, nenhum dos 11 governadores admitiu o problema de falta de recursos para honrar todos os compromissos financeiros do seu mandato, como exige a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Maranhão não negaram. São Paulo, Goiás, Pernambuco haviam afirmado que deixariam recursos em caixa no dia 31 de dezembro. Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Sergipe e Rio Grande do Norte não responderam o pedido de informações da reportagem.
O Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Norte (TCE-RN) confirmou que há "consistentes evidências" de que o estado encerrará o ano com insuficiência de caixa e um volume "significativo" de despesas deixadas para os anos seguintes, os chamados "restos a pagar".
No Rio Grande do Sul do então governador José Ivo Sartori (MDB), a Secretaria de Fazenda reconheceu os passivos, mas afirmou que "todo o esforço é no sentido de atender ao máximo os compromissos" e deixar para o governo de Eduardo Leite uma herança muito melhor do que aquela recebida em 2015. O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) não respondeu.
O Executivo gaúcho fechou o ano de 2018 sem garantir um consenso para a execução do Regime de Recuperação Fiscal. O socorro federal previa a suspensão do pagamento da dívida do Estado com a União por três anos, prorrogáveis por mais três, representando um alívio financeiro de R$ 11,3 bilhões para o Rio Grande do Sul até 2020. Sem a adesão ao RRF, o Estado acumula um déficit orçamentário superior a R$ 20 bilhões, valor superior à folha dos servidores do Poder Executivo de um ano inteiro, segundo informações do governo gaúcho.
Único a conseguir a aderir ao programa de socorro federal, o estado do Rio de Janeiro deve fechar 2018 com um rombo bilionário em seu caixa. A proteção do Regime de Recuperação Fiscal não vale para o caso de um governador em fim de mandato deixar obrigações para seu sucessor sem o respectivo dinheiro para bancá-las.
O governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (MDB), está preso preventivamente em desdobramento da Operação Lava Jato. O vice-governador, Francisco Dornelles (PP), assumiu interinamente. Em nota, a Secretaria de Fazenda do Rio não admite nem nega o risco de descumprir a regra da LRF que exige recursos em caixa em fim de mandato para honrar todas as obrigações.
Apenas cita as dificuldades financeiras do estado fluminense e afirma que "vem cumprindo uma série de medidas de aumento de receita e de redução de despesa com o objetivo de reverter o forte desequilíbrio financeiro registrado nos últimos anos". O órgão diz também que pagará ainda este ano o 13º salário.
O Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) informou que determinou em maio deste ano que o governo fluminense fizesse um planejamento com metas de receitas e despesas ao longo do ano para assegurar o equilíbrio fiscal exigido na LRF "de forma a não prejudicar as gestões posteriores".
Em São Paulo, comandado por Márcio França (PSB), a Secretaria de Fazenda afirma que "as projeções apontadas pela reportagem estão equivocadas, não correspondem à realidade e produzem valores grosseiramente desacertados" e assegura que a atual gestão deixará dinheiro em caixa.
O TCE-SP informou que o caixa paulista estava abastecido com R$ 25,5 bilhões no fim do 4º bimestre, período analisado pela reportagem, mas reconheceu que o dado é da disponibilidade bruta - sem descontar as obrigações que o estado terá com despesas deixadas para os próximos exercícios (os chamados restos a pagar).
Em Pernambuco, onde Paulo Câmara (PSB) se reelegeu por mais quatro anos, a Secretaria de Fazenda afirma que o governo vai cumprir a LRF. O TCE de Pernambuco não respondeu.
O governador de Goiás, José Eliton (PSDB), informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que jamais apresentou ao Tesouro dados sobre o seu fluxo de caixa. Segundo o governo goiano, o resultado fiscal deste ano será devidamente divulgado, quando ficará demonstrado que o estado cumpriu rigorosamente com o que determina a LRF.
O governo do Maranhão sob o comando de Flávio Dino (PCdoB) afirmou que os números ainda se encontram em análise e disse que o estado está fazendo todo o esforço necessário para o devido cumprimento da LRF. 

Ultrapassar limite de gastos com pessoal tem sido comum

Ana Paula lamenta falta de controle por parte de tribunais de contas

Ana Paula lamenta falta de controle por parte de tribunais de contas


/VALTER CAMPANATO/AGÊNCIA BRASIL/JC
Pouco depois do fim do mandato dos governadores, ainda há um clima de incerteza sobre a real situação deixadas nas contas do Executivo estadual. Estimativas feitas com base nos dados apresentados no final do ano passado apontam que 11 governadores corriam o risco de deixar seus estados sem caixa para cobrir despesas realizadas em sua gestão.
Já em novembro, a Secretaria do Tesouro Nacional alertava para o fato de que 14 estados haviam o limite de gastos com pessoal previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A lei determina que os estados não podem comprometer mais de 60% das receitas com essas despesas.
De acordo com o Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais de 2018, divulgado pelo Tesouro, os estados que descumpriram a regra foram Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Sergipe, Acre, Paraíba, Roraima, Paraná, Bahia, Santa Catarina e Alagoas.
O Tesouro informou que a maior parte do aumento de gastos com pessoal entre 2012 e 2017 correspondeu às despesas com servidores inativos (aposentados e pensionistas). Esses gastos cresceram mais que as receitas, que ficaram estagnadas nesses anos, deteriorando as contas locais ao gerarem déficits fiscais cada vez maiores. Apenas de 2016 para 2017, as despesas com pessoal nos estados e no Distrito Federal subiram R$ 25 bilhões, alta nominal de 6,7% e real (descontada a inflação) de 3,75%.
No documento, o Tesouro diz que os cálculos foram feitos de acordo com o Programa de Reestruturação e Ajuste Fiscal, com ajustes para seguir "da melhor forma possível, os conceitos e procedimentos do Manual de Demonstrativos Fiscais (MDF) e do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (MCASP)"
No entanto, a secretaria observa que há diferença nas metodologias de cálculo das despesas com pessoal, sancionadas pelos tribunais de contas estaduais. "Há diversos critérios de apuração da despesa com pessoal. Nesse sentido, alguns estados, por exemplo, não consideram em suas despesas com pessoal algumas rubricas importantes, como as despesas com pensionistas, imposto de renda retido na fonte e com obrigações patronais."
A apuração do cumprimento ou não do artigo 42 da LRF é feita pelos Tribunais de Contas Estaduais (TCEs) no momento da análise das contas de governo e depende ainda de uma interpretação jurídica do texto legal. Esses tribunais, preenchidos por indicações políticas, até hoje não motivaram nenhuma condenação de governador por deixar rombo no caixa, embora a situação já tenha sido verificada em anos anteriores.
"O que está acontecendo com os órgãos de controle? Quem se beneficia com esse processo? Temos que fazer essas perguntas. Não há o controle externo dos tribunais de contas", alerta a secretária executiva do Ministério da Fazenda, Ana Paula Vescovi, que passou os últimos anos lidando com o problema.
Para tentar padronizar as informações, em março deste ano a Secretaria do Tesouro Nacional firmou convênio com os tribunais de contas estaduais. O objetivo é que todos os estados da Federação passem a usar os mesmos parâmetros para atestar o cumprimento, por exemplo, de limites da Lei de Responsabilidade Fiscal, como os gastos com pessoal. Para a secretaria, a falta de uma padronização dificulta a comparação entre as situações fiscais dos estados.
As restrições previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal atingem estados que ultrapassam o limite prudencial (46,55% da receita corrente líquida de gastos com pessoal).

Lei de Responsabilidade Fiscal começa o ano diferente para municípios

Rodrigo Maia foi o responsável por validar o documento na época

Rodrigo Maia foi o responsável por validar o documento na época


/MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL/JC
No apagar das luzes de 2018, pouco antes do Natal, o Palácio do Planalto sancionou uma norma que flexibiliza a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), publicada em edição extra do Diário Oficial da União do dia 18 de dezembro. O responsável por validar o documento foi o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que ocupava a cadeira da presidência da República na ausência de Michel Temer - em viagem ao Uruguai para a reunião da Cúpula do Mercosul. A data limite para sanção era o dia 28 de dezembro.
Considerada uma das pautas-bomba aprovada pelo Congresso nas semanas anteriores ao recesso parlamentar, a medida permite que municípios ultrapassem o limite de gastos com pessoal, sem que haja punição em casos de queda na receita.
Em nota, o Planalto esclareceu que o presidente Michel Temer pretendia vetar a matéria. "As áreas técnicas do governo, ministérios da Fazenda e Planejamento, defendiam o veto da matéria - que poderia ser decidido até o dia 28 de dezembro. E a intenção do presidente Temer era seguir essa orientação, como é de sua praxe."
A LRF define o limite das despesas dos municípios com pessoal de 60% da receita corrente líquida, arrecadada com tributos, descontados os repasses determinados pela Constituição. Antes da sanção da lei, o município que ultrapassasse o limite tinha até oito meses para se adequar. Caso contrário, poderiam ficar sem receber transferências voluntárias e não contratar operações de crédito, salvo as que fossem para reduzir despesas de pessoal ou refinanciar a dívida.
A nova norma permite que os municípios com queda de receita superior a 10% não sofram restrições se ultrapassarem o limite de gastos. A proposta define que a queda deverá ter sido provocada pela redução do repasse do Fundo de Participação dos Municípios ou pela diminuição de receita com royalties e participações especiais. 

Auditores entendem que é preciso repactuar cálculo do endividamento

Soares considera injusta forma de atualização de empréstimos

Soares considera injusta forma de atualização de empréstimos


/FEBRAFITE/DIVULGAÇÃO/JC
O crescimento da dívida dos estados e dos municípios com a União deve seguir em uma trajetória insustentável, caso os juros que incidem sobre os débitos não sejam revistos em todos os contratos em vigor. O indexador da dívida cresce seis vezes mais que a inflação em 20 anos. Esse é um dos pontos apontados pela Federação Brasileira das Associações dos Auditores Fiscais Estaduais (Febrafite) em estudo.
A alteração na forma de cálculo da dívida e mais uma série de propostas devem ser entregues aos governadores eleitos e reeleitos pelos auditores fiscais estaduais. O objetivo é sugerir alternativas às discussões sobre o endividamento dos estados e municípios com o futuro governo de Jair Bolsonaro.
O presidente da Febrafite, Juracy Soares, disse que a maior parte do estoque da dívida dos estados ainda tem como indexador o Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI) mais juros de 6% a 7,5% ao ano para estados e Distrito Federal, e IGP-DI mais taxa de 9% ao ano para os municípios.
De acordo com Juracy Soares, em 20 anos esse indicador sofreu uma variação acumulada de 1.400%, seis vezes maior que a média da inflação do período, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que somou um crescimento médio de pouco mais de 230%.
Segundo o auditor fiscal, a dívida bruta dos estados e municípios com a União chegou a R$ 908 bilhões, de acordo com o Tesouro Nacional. "A forma de atualização desses empréstimos é injusta, porque a União pactuou com estados e municípios usando um índice que é muito superior à média de variação da inflação. Se as receitas dos estados crescem de acordo com o índice da inflação oficial, como é que eles vão conseguir pagar uma conta que cresceu 1.400% desde o fim dos anos 1990 para cá, o que dá quase seis vezes o IPCA?", destacou Soares.
Em dezembro de 2015, o governo federal editou um decreto regulamentando os novos indexadores para as dívidas dos estados, que passaram a ser corrigidos pela taxa Selic (atualmente em 6,5% ao ano) ou pelo Índice Geral de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o que for menor, mais 4% ao ano. A mudança foi resultado da aprovação de um projeto de lei complementar no Congresso Nacional, mas só passou a valer para contratos assinados a partir de janeiro de 2013.
"A maior parte do montante devido continua sendo atualizado com base no indexador anterior, não contempla o recálculo do contrato desde o começo. O que a gente defende é o refazimento dos contratos. Tem que ser calculado com base no IPCA desde o início, senão a dívida continuará contaminada por aquele indexador injusto", argumentou Soares.
Para o presidente da Febrafite, um equívoco foram as desonerações de impostos realizadas pela União que também impactaram na arrecadação dos estados, como no caso redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis e outros produtos industrializados, concedida ao longo dos últimos anos.
"Quando a União isentou a produção de automóveis de IPI, ela acabou fazendo cortesia com chapéu alheio, porque parte do IPI tinha que ser repassada, via transferência constitucional, para os estados, mas aí a União abriu mão de receita que seria dos entes federativos, enquanto equilibrou suas finanças aumentando contribuições", disse o presidente da federação.

Reforma tributária é urgente para amenizar guerra fiscal

JC Contabilidade - ICMS

JC Contabilidade - ICMS


/JONATHAN HECKLER/arquivo/JC
Em relação à arrecadação dos estados, Juracy Soares disse que é preciso enfrentar uma reforma tributária que transforme a atual modelagem do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é o principal tributo estadual, mas tem sido alvo de uma "guerra fiscal" entre as próprias unidades da federação.
"O ICMS, desde o seu nascedouro, foi cobrado na produção, e isso faz com que os estados tentem atrair indústrias usando como aceno a isenção tributária ou redução drástica do imposto. Acaba que essa luta é fratricida, estado brigando contra estado e desequilibrando as contas uns dos outros", sustenta o presidente da Febrafite Juracy Soares.
Para a Febrafite, o ideal seria a transformação do ICMS em Imposto sobre Valor Agregado (IVA), cobrado no destino, sobre o consumo, o que acabaria com a atual "guerra fiscal", que acaba pesando sobre os pequenos e médios empresários. "São esses que acabam tendo que suportar a carga tributária porque não conseguem a isenção ou redução de imposto que as grandes empresas conseguem."