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Reportagem Especial

- Publicada em 14 de Fevereiro de 2021 às 22:42

Consumo consciente começa a se popularizar no Brasil

Público passa a fiscalizar os próprios hábitos, tanto em casa quanto nas compras

Público passa a fiscalizar os próprios hábitos, tanto em casa quanto nas compras


MARIANA FONTOURA/ARQUIVO/JC
Todos os dias, consumimos alimentos, água, energia elétrica e diversos outros produtos como roupas ou aparelhos eletrônicos. A história de um produto, no entanto, não começa quando ele chega nas nossas mãos e nem termina quando ele não está mais conosco.
Todos os dias, consumimos alimentos, água, energia elétrica e diversos outros produtos como roupas ou aparelhos eletrônicos. A história de um produto, no entanto, não começa quando ele chega nas nossas mãos e nem termina quando ele não está mais conosco.
A produção de um celular, por exemplo, requer uma grande quantidade de água para ser realizada, e, depois disso, ele ainda precisa ser transportado para as lojas, o que gera a emissão de gases de efeito estufa pelo seu transporte. Além disso, entram nesta conta as condições de trabalho que a empresa oferece para a produção dos aparelhos, por exemplo.
Por isso, é cada vez mais comum que questões sejam levantadas antes de bater o martelo na hora da compra. Como o produto foi produzido? Qual o impacto ambiental da produção? Como a mão de obra foi remunerada? É uma compra necessária? Brasileiros têm começado a se perguntar isso com o passar do tempo, além de também fiscalizar seus próprios hábitos dentro de casa, separando o lixo e economizando recursos como água e energia.
Em 2013, por exemplo, o lixo era separado para reciclagem no domicílio de 47% dos brasileiros, percentual que cresceu oito pontos percentuais nos últimos seis anos e chegou a 55% em 2019, de acordo com o Perfil do Consumidor 2020, divulgado pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI). A Região Sul é a que possui o maior percentual de domicílios que separam o lixo (66%), empatada na margem de erro com a região Sudeste (64%). Fernanda destaca, entretanto, que a mudança de comportamento do consumidor ocorre lentamente. "É importante lembrar que o consumo consciente está muito relacionado ao hábito", ressalta.
Assim como a pesquisa do Instituto Akatu, o Indicador de Consumo Consciente (ICC) de 2019 do Conselho Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) junto do SPC Brasil, que visa acompanhar as mudanças nos hábitos de compra e outras ações cotidianas, também avaliou o consumidor brasileiro. Para o ICC, ele está na condição de consumidor em transição: 57,6% dos entrevistados correspondem a este perfil, enquanto 29,3% podem ser considerados conscientes e 13,1% pouco ou nada conscientes. Em 2015, foram 51,2% considerados consumidores em transição, 21,8% conscientes e 27% pouco ou nada conscientes. Há variações dependendo darenda, idade e escolaridade.
Coordenador de energia e consumo sustentável do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Clauber Leite também acredita que a preocupação da população em relação a esta pauta tem crescido. Acostumado a auxiliar os consumidores através da disponibilização de informações nas plataformas online do Idec, ele percebe um maior interesse das pessoas quanto às questões ambientais na hora da compra de um produto.
"Chegamos em uma situação em que é preciso defender o consumidor de greenwashing", exemplifica. A expressão que significa "maquiagem verde" ou "lavagem verde" se refere às marcas que criam uma falsa aparência de sustentabilidade, sem necessariamente aplicá-la na prática. "Estando no lado fraco da corda, o consumidor não tem como questionar o tipo de informação que lhe é passado, então nós questionamos isto por eles também", completa.

Mudança de comportamento depende do avanço da responsabilidade compartilhada

Quando falamos de consumo consciente, é preciso também considerar o papel do governo, das empresas e das organizações da sociedade civil. Sem o empenho destas partes, não há como levar a pauta adiante, e, por esta razão, a viabilização de políticas públicas, leis, incentivos, educação e alternativas e produtos sustentáveis é ponto fundamental para o debate.
A analista de conteúdo e metodologias do Instituto Akatu, Fernanda Iwasaka, acredita que o poder público precisa oferecer incentivos e estruturas que propiciem a mudança de comportamento dos consumidores e das empresas. É o caso da disponibilização, nos municípios, de um sistema de coleta seletiva mais abrangente, da promoção e do investimento em transporte público e infraestrutura para o uso de bicicletas, a fim de reduzir o número de carros, e da garantia de segurança pública, além do subsídio a empresas que invistam em uma produção sustentável, por exemplo.
Outro ponto importante levantado pela analista é quanto à educação. De nada adianta oferecer infraestrutura e incentivos se não há um trabalho de base que desenvolva o consumo consciente com os alunos. Para isto, é necessário que haja um interesse das secretarias de educação em promover o tema nas escolas. "As legislações não necessariamente precisam agir no sentido de proibição, mas também de incentivos, oferecendo opções para viabilizar esses comportamentos", completa.
Quem concorda com ela é o coordenador de energia e consumo sustentável do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Clauber Leite. "Não podemos colocar toda a conta nas costas do consumidor", afirma. Segundo ele, as políticas públicas são necessárias para responsabilizar, também, as empresas pelo ciclo de vida dos seus produtos. "O consumidor é um agente importante na mudança, mas não é o principal", acrescenta.
O Brasil já possui uma Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída pela Lei 12.305/2010, que propõe metas para a melhoria da gestão de resíduos sólidos no País, fornecendo diretrizes a serem seguidas e alcançadas com a responsabilidade compartilhada entre os diferentes atores sociais. Ela tem como ordem de prioridade a não geração, a redução, a reutilização, a reciclagem, o tratamento e a disposição final ambientalmente adequada dos resíduos nos municípios.
No entanto, de acordo com o coordenador, os acordos firmados para esta responsabilização acabam ficando somente no papel, e a responsabilidade ainda é concentrada nos consumidores. "São pouquíssimos os resultados efetivos", diz.
Segundo o Relatório Brasil 2020 - Vida Sustentável, realizado pela Akatu junto da GlobalScan, consultoria de pesquisa de opinião pública que faz pesquisas de reputação, marca, sustentabilidade, engajamento e tendências, mais de 80% dos consumidores esperam que as empresas informem sobre os seus processos produtivos e cuidem do que está sob seu controle operacional. Isso inclui remunerar os funcionários de forma justa, garantir que seus produtos são seguros e saudáveis, fornecer informações claras sobre os processos produtivos e tratar os funcionários da mesma forma.
Ainda de acordo com o relatório, mais de 70% dos consumidores esperam que as empresas não agridam o meio ambiente, e mais de 60% esperam que as empresas estabeleçam metas para tornar o mundo melhor, priorizando questões relacionadas aos funcionários, produtos e às questões ambientais. Além disso, segundo o Perfil do Consumidor 2020, divulgado pela CNI, 62% dos brasileiros afirmam que já boicotaram marcas ou empresas por pelo menos um dos seguintes motivos: violações a direitos trabalhistas, testes ou maltrato a animais, crimes ambientais, discriminação de qualquer tipo ou posicionamento político.
 

Preço de produtos influencia adesão de consumidores

Com uma melhor seleção de compras e economia de recursos, os hábitos podem se tornar sustentáveis

Com uma melhor seleção de compras e economia de recursos, os hábitos podem se tornar sustentáveis


BRUNA OLIVEIRA/ESPECIAL/JC
Apesar do interesse dos brasileiros em aderir a um consumo mais consciente, muitos encontram dificuldades para a mudança de hábito, tendo o preço dos produtos como a principal barreira. De acordo com o Indicador de Consumo Consciente (ICC) de 2019 do Conselho Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) junto do SPC Brasil, 97,3% dos consumidores entrevistados admitiram ter dificuldades para a adoção de práticas de consumo consciente em geral. A maior parte (36,7%) cita o preço dos produtos orgânicos.
No último Panorama do Consumo Consciente no Brasil, realizado em 2018 pelo Instituto Akatu, a necessidade de esforço para a mudança de hábito é a maior barreira apresentada (60%). Da mesma forma, dentro deste quesito, a percepção dos altos preços é o maior obstáculo (38%), seguida da falta de informação sobre impactos ambientais e sociais (26%).
De fato, muitos dos produtos sustentáveis possuem um preço mais elevado do que os convencionais, o que acaba os tornando mais restritos aos consumidores. Em uma situação em que os consumidores têm à sua disposição dois produtos iguais, sendo um deles fabricado com baixa emissão de poluentes e de resíduos, somente 10% deles optariam pelo produto ambientalmente correto, mesmo que fosse muito mais caro, segundo o Perfil do Consumidor 2020, divulgado pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI).
Esta porcentagem se mantém independente da renda. No entanto, a renda começa a ser relevante quando se trata de uma diferença de preço menor, de forma que, quanto menor o salário, maior o percentual de pessoas que não compra o produto ambientalmente correto, independentemente do preço. "Nós educamos, falamos para fazer uma melhor escolha, mas, se no fim for muito mais caro escolher a opção sustentável, ele não vai escolher", avalia o coordenador de energia e consumo sustentável do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Clauber Leite. 
A analista de conteúdo e metodologias do Instituto Akatu, Fernanda Iwasaka, vê a situação de uma maneira diferente. Para ela, existe um grande estigma de que produtos sustentáveis são mais caros. "Quando pensamos nos produtos orgânicos, eles realmente são, mas sustentabilidade vai muito além disso", complementa.
Não é preciso comprar mercadorias mais caras para consumir de forma mais consciente. Com uma melhor seleção de produtos e serviços e uma maior economia de recursos, os hábitos podem se tornar sustentáveis. Um bom exemplo é quanto à compra de produtos de limpeza, em que é possível optar por uma mistura natural de vinagre e bicarbonato no lugar dos biodegradáveis industrializados. "Precisamos tirar este estigma de que a sustentabilidade é necessariamente elitizada. Há uma visão muito mais ampla do que se pode fazer para ser sustentável", completa a analista.

Indústria busca unir competitividade com sustentabilidade

O setor industrial tem se preocupado cada vez mais com as questões sustentáveis. Ainda com o objetivo final de assegurar a competitividade do segmento, as empresas têm garantido à sustentabilidade um papel central no seu planejamento. De acordo com Davi Bomtempo, gerente-executivo do Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), a pauta relacionada ao meio ambiente e aos recursos naturais tem sido tratada como prioridade na entidade.
"Hoje, o consumidor quer saber como que os produtos são feitos, como os serviços são prestados. Então, a questão climática é o que está nos norteando", comenta o gerente-executivo. Além disso, a sustentabilidade tem sido pauta relevante no mercado internacional, fazendo com que as companhias de todo o mundo direcionem as suas operações neste sentido.
Outro fator relevante é a questão dos investimentos e dos financiamentos. Hoje, grande parte dos recursos direcionados às empresas utilizam o ESG (Environmental, social and corporate governance), índice que avalia as operações das principais empresas conforme os seus impactos em três eixos da sustentabilidade: o Meio Ambiente, o Social e a Governança. A medida oferece mais transparência aos investidores sobre as companhias nas quais eles estão investindo.
"Sabemos que os recursos naturais são finitos e precisamos, cada vez mais, desenvolver formas de se trabalhar melhor, aproveitar melhor e de implementar técnicas de economia circular (conceito estratégico baseado na redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia)", diz Bomtempo. "É uma responsabilidade mútua das empresas, dos consumidores e da sociedade como um todo", completa.
 

Braskem oferece soluções sustentáveis

A Braskem, maior produtora de resinas plásticas das Américas e líder mundial na produção de biopolímeros, é uma das companhias que procura oferecer diversas soluções sustentáveis ao mercado. Entre elas, está o portfólio I'm greenTM, que disponibiliza resinas de origem renovável e reciclada. Segundo a diretora de Economia Circular da Braskem na América do Sul, Fabiana Quiroga, a demanda por soluções sustentáveis vem crescendo cada vez mais por conta da maior procura por produtos sustentáveis pelos consumidores.
Isso pode ser visto pelo aumento de soluções encontradas no mercado com a marca I'm greenTM. Hoje, já são mais de 200 marcas ao redor do mundo que utilizam as soluções da companhia em seus produtos. "A Braskem considera que os poderes públicos, privados e os cidadãos devem atuar juntos na evolução do consumo consciente e na gestão do ciclo de vida do plástico, incluindo o descarte adequado e a reciclagem", afirma Fabiana.
A empresa lançou, ainda, uma metodologia de desenvolvimento que visa reduzir o impacto ambiental das embalagens, criando uma nova maneira de pensar os projetos, desde a escolha do formato e a composição do material até a definição de rotas de circularidade, engajamento do consumidor e solução de fim de vida do produto. O objetivo é fazer com que os recipientes contribuam para impulsionar soluções de reuso, refil e do processo de reciclagem, reduzindo o impacto ambiental e gerando valor para a cadeia como um todo.
A companhia destaca que os plásticos devem ser usados com responsabilidade, reciclados, reutilizados ou recuperados, quando possível, e entende que eles precisam ser adequadamente descartados. Por isso, a empresa procura incentivar o engajamento dos consumidores em programas de reciclagem e recuperação, por meio da educação para promoção do valor dos resíduos plásticos para a economia, e apoiar políticas públicas para melhorar a gestão de resíduos e a cadeia de reciclagem como um todo.
 

Pandemia altera hábitos de consumo

E-commerce passou a oferecer mais opções de alimentação saudável

E-commerce passou a oferecer mais opções de alimentação saudável


/Divulgação/wayhomestudio/ via freepik
A pandemia do novo coronavírus fez a rotina de todo mundo mudar. Com a maior permanência das pessoas dentro de casa, a situação ficou propícia para que uma mudança de hábitos acontecesse. Na visão de Fernanda Iwasaka, analista de conteúdo e metodologias do Instituto Akatu, a quarentena motivou uma reflexão por parte da população a respeito das suas práticas de consumo.
Passando maior tempo reclusas, as pessoas tiveram uma percepção maior acerca da quantidade de resíduos descartados diariamente nas suas residências, por exemplo. Além disso, também houve espaço para uma maior preocupação com a alimentação. "O consumo consciente também passa por uma alimentação saudável, então foi muito interessante neste sentido", comenta.
Segundo o Relatório Brasil 2020 - Vida Sustentável, levantado em junho do ano passado pela Akatu junto da GlobalScan, 68% dos entrevistados pesquisou sobre estilos de vida mais saudáveis e 59% pesquisou sobre estilos de vida ecológicos. A pesquisa afirma que o comportamento provavelmente está relacionado à pandemia.
O coordenador de energia e consumo sustentável do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Clauber Leite, porém, não vê a questão de uma forma muito positiva. Devido ao aumento do consumo por meio de delivery e do e-commerce, houve um crescimento na geração e no descarte de plásticos não recicláveis no País, causando um impacto no meio ambiente. Neste sentido, ele acredita que houve uma piora na situação.
Por outro lado, o aumento do e-commerce possibilitou ao consumidor avaliar diferentes possibilidades de compra, podendo fazer uma escolha de produto mais assertiva. "Isto pode ser uma oportunidade para apresentar opções mais sustentáveis ao consumidor", completa.