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Qualificação

- Publicada em 28 de Abril de 2019 às 21:00

Ensino técnico busca suprir as demandas do mercado

Modalidade passa por transformações estruturais para se adaptar às necessidades corporativas

Modalidade passa por transformações estruturais para se adaptar às necessidades corporativas


DUDU LEAL/FIERGS/DIVULGAÇÃO/JC
Historicamente, o senso comum impõe ao brasileiro uma noção de progressão educacional definida e esquematizada gradualmente. Iniciando na educação infantil, passando para os ensinos Fundamental e Médio, até atingir o nível superior, a relação entre o estudante e os níveis de educação é delimitada dentro de uma perspectiva conservadora sobre as formas de ensino.
Historicamente, o senso comum impõe ao brasileiro uma noção de progressão educacional definida e esquematizada gradualmente. Iniciando na educação infantil, passando para os ensinos Fundamental e Médio, até atingir o nível superior, a relação entre o estudante e os níveis de educação é delimitada dentro de uma perspectiva conservadora sobre as formas de ensino.
Entretanto, através das mudanças nas relações de trabalho e da aproximação acentuada da população com o ensino técnico, a evolução acadêmica começou a assimilar essa modalidade educacional que países como Alemanha, Suíça e Coreia do Sul já realizam há décadas. Fugindo da pretensão de competir com a educação superior, o ensino técnico comemora em 2019 os seus 110 anos de história e de impacto social no País.
No Brasil há mais de 1,9 milhão de matrículas na modalidade técnica atualmente. Segundo os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Estatísticas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) no Censo da Educação Superior 2017, último a ser publicado, o ensino técnico cresceu 5,6% em comparação ao censo anterior. Nos dois anos anteriores, o corte orçamentário no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) interrompeu a expansão que o setor vivia desde 2007 e que atingiu mais de 1 milhão de matrículas em 2014.
A Sinopse Estatística da Educação Básica 2018, publicada anualmente pela Diretoria de Estatísticas Educacionais (Deed) do Inep, desenha a relação entre as regiões mais populosas e o número de alunos técnicos. A pesquisa, a qual permite que um estudante tenha mais de uma matrícula, apresenta a região Sudeste como a campeã em número de matrículas no País, com 820.018, seguida pelo Nordeste (536.772) e pelo Sul (324.236).
A relação de oferta e demanda entre as escolas técnicas e as empresas desempenha o papel de demonstrar as necessidades do mercado de trabalho na área. Além da influência nas competências a serem trabalhadas, as instituições fomentam também a criação de cursos para suprir determinados requisitos do segmento. Esse é o caso do curso técnico em enfermagem da Fundação Universidade Empresa de Tecnologia e Ciências (Fundatec): "em 2015, o Hospital Mãe de Deus nos procurou para criar um técnico em enfermagem. Iniciamos as matrículas em 2016 e foi um dos maiores responsáveis pela escola triplicar de tamanho", conta o diretor da instituição Felipe Homem.
"Nós atendemos a indústria local", aponta o diretor regional do Senai-RS, Carlos Trein. Forte presença na indústria metalmecânica, o Centro Tecnológico Senai de Mecânica de Precisão (Cetemp), em São Leopoldo, segue o modelo de oferecer ao mercado o que ele necessita em termos de deficiência. Essa realidade não é diferente nos mais de 1.276 estabelecimentos que oferecem a modalidade no Estado.
Acompanhando as mudanças no panorama de trabalho, com a influência do empreendedorismo e gestões práticas, a modalidade foi reaquecida. Com uma remuneração menor do que os diplomados na graduação, o profissional técnico acabou sendo mais valorizado em situação de crise econômica, embora ainda persista uma resistência da sociedade perante a suposta disputa entre os técnicos e a academia.
Ao contrário do que ainda persiste no imaginário popular do Brasil, a crítica que separa o ensino técnico da graduação, como se fossem excludentes, não corresponde à realidade pensada no institutos de educação. Além de preparar o aluno para as necessidades práticas que a futura profissão demanda, o ensino técnico já ultrapassou a ideia de formar pessoas sem o enfoque teórico. Como explica Homem, "não há aprendizado da prática sem a teoria".
Nesse sentido, embora o crescimento na adesão à modalidade de ensino, o Brasil ainda apresenta uma disparidade grande entre os dois níveis: "Enquanto na Alemanha, referência no assunto, tem cerca de 50% dos seus profissionais no nível técnico, no Brasil esse percentual é menor do 9%, ou seja, nós somos educados para buscar a graduação", aponta Trein.
Para fortalecer o ensino técnico brasileiro, há uma necessidade maior de investimento do governo sobre à modalidade. Para o diretor do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro-RS), Sani Cardon é necessário um fortalecimento de políticas públicas que incentivem o nível técnico, assim como a valorização dos professores atuantes e da infraestrutura nas escolas, aliados à uma proposta política pedagógica consistente.

Perfil é formado por quem busca melhores condições financeiras

Trein diz que estudantes saem preparados para atender demandas do mercado

Trein diz que estudantes saem preparados para atender demandas do mercado


/DUDU LEAL/FIERGS/DIVULGAÇÃO/JC
A inserção mais veloz no mercado de trabalho atrai jovens e adultos para melhores condições financeiras. Seja para angariar recursos para uma graduação futura, ou estabelecer-se em um mercado já consolidado, o ensino técnico não se restringe somente ao que o ex-presidente Nilo Peçanha caracterizou como "desafortunados" nos primórdios do ensino técnico brasileiro. Além disso, com a expansão do empreendedorismo, os cursos técnicos têm se voltado também às questões de gestão, acompanhando as oportunidades de novas funções dentro das empresas. Não somente como um operador, mas também como gestor, o aluno que busca o técnico tem um objetivo claro em mente: atuar na carreira escolhida.
Para Felipe Homem, diretor da Fundação Universidade Empresa de Tecnologia e Ciências (Fundatec), o perfil do discente que se insere no ensino técnico é bastante abrangente: "quem vem para o ensino técnico é o estudante que busca se qualificar de forma mais rápida para conseguir entrar no mercado de trabalho em si".
Devido ao tempo de formação técnica ser menor do que a acadêmica, somado ao custo reduzido do curso técnico, em comparação à graduação, e o método de ensino voltado para praticidade que o mercado espera, o ensino técnico desponta como um nível a ser mais integrado pelo estudante nas novas relações trabalhistas. Entretanto, Homem alerta que a educação continuada é essencial para o aperfeiçoamento da carreira: "o curso técnico seria o primeiro passo na carreira que o estudante busca seguir, tendo a entrada no mercado de trabalho e com a remuneração necessária para continuar os seus estudos".
Além desse perfil, o diretor da Fundatec aponta para um novo tipo de estudante, mais relacionado com o avanço da tecnologia. Integrado com diversas ferramentas desde o início do seu aprendizado, o estudante busca o técnico para aplicar um conhecimento prévio, obtido através dos novos meios de aprendizagem, como internet.
A possibilidade de estagiar em uma atividade remunerada desde o início do curso somada ao preparo prático da função atrai os estudantes mais jovens. Esse é o caso de Liliana Oliveira, estudante no Centro Tecnológico Senai de Mecânica de Precisão (Cetemp). "Almejava algo que pudesse me colocar rapidamente no mercado de trabalho", explica Liliana, que cursa o técnico em Qualidade. Tanto para Carlos Trein, diretor regional do Senai-RS, quando para Felipe Homem, o perfil do estudante que sai do ensino técnico é claro: alguém que pode chegar em uma empresa e conseguir realizar as demandas pretendidas pelo mercado.

Integrado com o Ensino Médio

Cardon diz que há perdas e ganhos

Cardon diz que há perdas e ganhos


/CLAITON DORNELLES/JC
A lei 13.415 alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Sancionada pelo então presidente Michel Temer em fevereiro de 2017, modificará o funcionamento não só do ensino médio, mas também do ensino técnico brasileiro.
Atualmente, existem três formas de cursar a modalidade técnica: integrada, concomitante e intercomplementaridade. O modelo concomitante, utilizado por estudantes que irão iniciar ou estejam cursando o ensino médio, ocupará maiores espaços a partir de 2020, ano que a reforma do ensino médio entrará em vigor.
Fomentando o crescimento do ensino técnico, o governo pretende aumentar os índices de estudantes cursando o técnico de nível médio. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 2017, das 65,2 milhões de pessoas que estudavam no ensino médio (regular ou EJA), 3,1% frequentavam curso técnico de nível médio.
Com as mudanças na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a carga horária do ensino médio, que hoje é de 800 horas, passará para mil horas anuais. Com o foco nas áreas de conhecimento e na formação técnica e profissional, a mudança visa a instaurar o turno integral e trazer a oportunidade ao estudante de optar pelo ensino técnico ou profissionalizante.
Para Sani Cardon, diretor do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro/RS), a reforma pode ser analisada por duas óticas: "com as mudanças no Ensino Médio, o aluno vai ter esse ganho na questão profissionalizante, mas também pode perder espaço para estudar questões relevantes para adentrar à universidade".

Industrialização está ligada ao aprendizado

Fábrica da empresa Altus, no Tecnosinos: empresa produz sistemas e equipamentos de automação industrial

Fábrica da empresa Altus, no Tecnosinos: empresa produz sistemas e equipamentos de automação industrial


FREDY VIEIRA/JC
A retomada do crescimento na área técnica representa um novo passo na história da modalidade de ensino no Brasil. Em 1909, o decreto 7.566, assinado pelo então presidente da República Nilo Peçanha, criou 19 Escolas de Aprendizes Artífices no território nacional e passou a ser considerado como o início do ensino profissionalizante no Brasil.
Quando o processo de industrialização brasileira teve seu crescimento, o ensino técnico exerceu um papel estratégico para fomentar esse processo. A Constituição de 1937, promulgada pelo presidente Getúlio Vargas, inaugurou os Liceus Industriais, substituindo as Escolas de Aprendizes Artífices que vigorava na época, e buscava qualificar e trazer melhores condições aos trabalhadores.
Com o crescimento da industrialização brasileira, e a consequente necessidade de suprir a demanda de mão de obra do País, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) foi inaugurado em 1942. "Vivíamos a Segunda Guerra Mundial quando o Senai foi estabelecido. Isso acentuou ainda mais a carência por trabalhadores industriais no País", explica Carlos Trein, diretor regional do Senai-RS, referindo-se a saída dos poucos especialistas no Brasil, estrangeiros que acabaram recrutados por suas respectivas pátrias no período.
A ligação entre o ensino técnico e as mudanças econômicas que o Brasil passava foi se modificando com o passar dos anos. Ao contrário da ideia inicial de destinar a modalidade de ensino para os "desafortunados", como alcunhou Nilo Peçanha, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961 buscou igualar o ensino técnico ao acadêmico. Relacionada a essa equiparação, a busca por se adequar aos modelos de países industrializados transformou a prática técnica em uma ferramenta de qualificação para atender a expansão da economia brasileira.
Atualmente, o ensino técnico atende novos propósitos e novas obrigações, embora se mantenha em constante mudança. Seguindo as normativas do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos do Ministério da Educação (MEC), o modelo de cursos técnicos atuais tem a pretensão de promover o desenvolvimento da aprendizagem e da empregabilidade de novas técnicas e tecnologias no trabalho, preparando os estudantes para o exercício profissional, com habilitação reconhecida pelos órgãos responsáveis, como o MEC e as Secretarias Estaduais de Educação. É essa habilitação que diferencia o ensino técnico do ensino profissionalizante, enquanto o primeiro tem o aval do MEC, o segundo não tem essa obrigação.
Essa visão prática e voltada para o mercado de trabalho atua em uma via de mão dupla; tanto do interesse do aluno em se inserir no mercado, quanto das empresas que necessitam de trabalhadores qualificados. A aproximação das empresas com o centros de ensino técnico alimenta uma cadeia de produção de conhecimento e aumenta a gama de profissionais aptos para desempenhar determinadas funções.
"Nós desenhamos o perfil curricular através das demandas de conhecimentos técnicos e habilidades vindas da indústria", explica Trein. No caso do Senai, e de outras entidades do Sistema S, o desenho curricular busca atender, através de uma metodologia de competências, às necessidades do setor o qual o estudante busca se inserir.