À frente da Suzano, a maior produtora de celulose do mundo e uma das primeiras na fabricação de papel, Walter Schalka diz que o governo deve passar por um processo de aprendizagem na sua relação com o Congresso e acredita que a proposta de reforma da Previdência será aprovada. “Conseguimos gerar uma crise sem a oposição bater, uma coisa inacreditável. É preciso aprender rápido”, disse Schalka. Segundo ele, se uma reforma que não desfigure a proposta inicial do governo passar, o País deve receber um volume de investimentos muito grande.
Qual a importância da reforma da Previdência?
Walter Schalka – De zero a 10, ela é 10. Sem reforma da Previdência vamos perder o último ativo que sobra, que é o ativo da esperança de transformação que o investidor estrangeiro tem. O Brasil tem um déficit público que é absolutamente não administrável se não resolvermos a questão da Previdência. E resolver de uma forma tênue é absolutamente insuficiente. Todos os investidores estrangeiros estão olhando para o Brasil esperando o seguinte: vai ter reforma da Previdência ou não?
O senhor está confiante na aprovação?
Schalka – A reforma vai sair. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, pode discutir publicamente com o presidente Bolsonaro, mas ele sabe da importância da Previdência para o Brasil e ele vai apoiar a reforma, zero de dúvida sobre isso. As lideranças dos principais partidos também apoiarão. O que estamos discutindo é quanto a proposta do governo será mexida. O que o Congresso vai querer buscar é uma maior equidade. Os servidores públicos federais, militares, sindicalistas vão brigar para tentar minorar a sua parte. Mas não podemos transformar a reforma da Previdência num Frankenstein.
A proposta do governo prevê uma economia de R$ 1,1 trilhão em 10 anos. Qual patamar seria o mínimo?
Schalka – Se sair 10% a 20% abaixo da proposta, já é um gol de placa. A reforma de Temer ia dar uma economia de cerca de R$ 400 bilhões. Se a proposta for desidratada, não vai gerar credibilidade, não vai adiantar nada. Aí não vem o investimento.
Se tivermos uma economia de cerca de R$ 500 bilhões, vai ser suficiente?
Schalka – Se não passar a reforma é o caos total. Significa a perda de governabilidade, não no aspecto político, mas no aspecto econômico. Não vamos precisar mais de um gestor, mas de um zelador. Uma reforma com economia entre R$ 500 bilhões e R$ 600 bilhões seria insuficiente e exigiria uma segunda reforma em algum momento. Nem sei se seria neste governo. Mas já é um passo muito importante.
O que deve acontecer com os investimentos em caso de aprovação sem grandes mudanças na proposta?
Schalka – O volume de recursos que serão investidos no País será muito grande. E, ao ter esse investimento privado, vamos gerar emprego. As duas outras fontes de crescimento de PIB têm limitações. O investimento do governo está em exaustão, assim como o consumo das famílias. Mas para ter investimento privado precisa ter credibilidade. Se o Brasil perder o momento dessa reforma da Previdência, vamos gerar mais problemas sociais.
Qual é a percepção dos investidores nesse começo de governo?
Schalka – O investidor de longo prazo entende que o Brasil é um país que não trabalha em linha reta e, obviamente, fica frustrado, mais uma vez, de ver que a gente tem uma grande possibilidade de fazer reformas e não está fazendo com a celeridade possível porque ficamos criando essas entropias no processo. Mas, em regra geral, acham que a reforma vai passar. Estão todos se preparando para fazer investimentos no Brasil. Estive na China há duas semanas, e os chineses estão dizendo a mesma coisa. O Brasil tem visibilidade no mundo, as pessoas sabem o que está acontecendo no Brasil e aguardam que o País tome as decisões necessárias.
Os problemas de articulação política do governo vistos até agora são uma questão pontual ou estrutural?
Schalka – É um problema de aprendizado. As pessoas que estão no governo nunca estiveram no Poder Executivo e nunca aprenderam a ter um relacionamento com o Congresso mais positivo. Esse é o processo de aprendizagem que eles vão ter que fazer. Se não fizerem e isso vier a comprometer a reforma da Previdência, será uma perda enorme para o Brasil. Conseguimos gerar uma crise sem a oposição bater, uma coisa inacreditável. É preciso aprender rápido.
Qual é o seu cenário para a tramitação?
Schalka – Devemos votar na Câmara ou no final do primeiro semestre ou no começo do segundo semestre. No Senado vai ser rápido. Quando chegar a hora de votar é que vamos ver se “vai ou não vai”. Caso o governo não aprenda a construir uma maioria sólida de 320, 340 deputados, porque precisamos de 308 deputados para votar, aí teremos um problema. Se a reforma da Previdência passar de uma forma adequada, tenho convicção de que outras reformas virão, já com apoio muito maior da população, porque a economia vai crescer e o emprego também.
Quais seriam essas outras reformas?
Schalka – O Brasil precisa fazer uma reforma do Estado, que é completamente ineficiente. Não falta verba para a educação ou para a saúde, falta é gestão. Temos que fazer também uma reforma fiscal. Há problemas sérios na política de subsídios. O Brasil dá R$ 300 bilhões em subsídios ao ano. Hoje tem R$ 60 bilhões em subsídios na Zona Franca de Manaus. Se acabasse com a Zona Franca de Manaus inteira e desse esse dinheiro para a população era melhor do que dar os subsídios. Conheço uma empresa que compra produtos na China, desmonta lá, embarca para o Brasil, remonta em Manaus e vende aqui. Qual o valor agregado disso para o País? Outro subsídio que tem de terminar é a forma como operamos o conceito do Simples. Sou a favor do Simples, mas não da forma como está.
Essa questão dos subsídios é muito delicada no Congresso. O governo vai ter condições de tocar nesse assunto?
Schalka – O governo tem que comer esse elefante em pedacinhos. A primeira coisa que tem que ser feita é a reforma da Previdência. Depois vamos atacando as outras.
O grande fiador da reforma é Paulo Guedes, o ministro da Economia. O senhor teme uma saída dele caso a reforma seja muito modificada?
Schalka – Não temo porque estou confiante na aprovação da reforma. Mas, caso a reforma não passe ou a proposta seja muito modificada, não tenho dúvida de que ele vai sair.
A volatilidade da bolsa e do câmbio vai aumentar diante da incerteza da reforma?
Schalka – O risco de termos uma maior volatilidade aumentou. Se a sinalização do Congresso fosse positiva neste momento, o dólar não estaria próximo de R$ 4,00. Por outro lado, se a proposta de reforma passar sem alteração, o dólar vai para um patamar muito mais baixo. Com a aprovação, o dólar cai mesmo antes dos investimentos estrangeiros entrarem porque o mercado se antecipa.