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Entrevista especial

- Publicada em 14 de Janeiro de 2018 às 22:13

'Eu sou candidato à presidência do Brasil', afirma Ciro

'Esse negócio de vender um país não é neoliberalismo. Isso é canalhice pura e simples', afirma Ciro

'Esse negócio de vender um país não é neoliberalismo. Isso é canalhice pura e simples', afirma Ciro


MARIANA CARLESSO/JC
Mesmo correndo por fora nas pesquisas eleitorais, o ex-governador, ex-ministro e candidato em duas sucessões ao Planalto Ciro Gomes (PDT) revela um entusiasmo declarado pela disputa de 2018. Mas admite que o páreo será decidido após o dia 24, quando haverá o julgamento do recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para suspender a condenação do juiz Sérgio Moro. "A candidatura dele - e digo isso com muito carinho e respeito, é um desserviço a ele e ao Brasil", opina Ciro, que trocou de partido quatro vezes desde os anos de 1990.
Mesmo correndo por fora nas pesquisas eleitorais, o ex-governador, ex-ministro e candidato em duas sucessões ao Planalto Ciro Gomes (PDT) revela um entusiasmo declarado pela disputa de 2018. Mas admite que o páreo será decidido após o dia 24, quando haverá o julgamento do recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para suspender a condenação do juiz Sérgio Moro. "A candidatura dele - e digo isso com muito carinho e respeito, é um desserviço a ele e ao Brasil", opina Ciro, que trocou de partido quatro vezes desde os anos de 1990.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o atual vice-presidente do PDT, passeia pelos mais variado temas, desde erros na condução da economia em 30 anos, a falta de um projeto de nação, fala de uma crise bancária à vista, defende referendo para decidir sobre reforma tributária e tenta se diferenciar do jogo de alianças que marca a coalizão política para governar.
Sobre este tópico, o paulista de Pindamonhangaba, mas que é cearense de berço político, avisa que mesmo que o PMDB "queira se vender, eu não compro". "O PMDB será levado à destruição, vou partir para destruir o PMDB, mas democrática e politicamente", alfinetou.
Jornal do Comércio - O senhor diz que o nacional-desenvolvimentismo colapsou. Por que não deu certo?
Ciro Gomes - Primeiro porque é um modelo de desenvolvimento dependente de capitais externos. O Brasil contratou por muitos anos crédito de alto custo que as crises monetárias levaram todos países que dependiam de fluxos internacionais de capital quebrarem, como o Brasil no período do ex-presidente José Sarney (PMDB), na década de 1980. Outro fator é a superação frenética dos ciclos tecnológicos, o adensamento profundo da tecnologia, e sua ciclagem com grande velocidade, e o País não discutiu isso. Tivemos a emergência da redemocratização, depois inflação, dois ciclos de consumo sem sustentação - primeiro no governo Fernando Henrique (PSDB), que substituiu a ideia de país e nação por uma reeleição e ainda elevou os volumes de importação, e na passagem do primeiro governo Lula - que expandiu em quatro vezes o volume de consumo da população, sem nenhuma providência na produção. O País seguiu se desindustrializando pesadamente. Só não quebrou na mão do ex-presidente porque vivemos um ciclo exótico puxado pelos preços de commodities (grãos, metais e petróleo) e China. Consumo sem produção gera desequilíbrio, o que é insustentável.
JC - Como gerar desenvolvimento sustentável?
Ciro - O que fizemos no Brasil foi ridículo. Se botou a gasolina na fogueira, como a renúncia fiscal adotada. Há tarefas de fundo e outras de virada. As de fundo são levantar o nível de capital doméstico, que está baixíssimo para formação bruta de capital, que hoje é de 14% do Produto Interno Bruto (PIB). Com Lula, chegou-se a 17%. Ao contrário da mistificação neoliberal, o nível de formação de capital não é obra do acaso, mas consequência de arranjos institucionais que a política faz. No caso brasileiro, é preciso fazer reforma fiscal que envolva aspectos tributários e previdenciários, mas para formar capital e não perseguir benefícios pequenos, como eles estão fazendo, porque é ineficaz, como na proposta da reforma da Previdência que tramita no Congresso. Já a reforma tributária que nenhum governo quis fazer é a seguinte: a carga ia nominal de 36%, 35,5%, que está estagnada desde a posse do Lula, mas é uma carga tributária dramaticamente regressiva e estimulante da despoupança, porque ela cobra muito mais de quem deve pagar menos e muito menos de quem deve pagar mais.
JC - O que a reforma tributária deve contemplar?
Ciro - É preciso adotar a dinâmica de um sistema tributário mais progressivo, que basicamente consiga elevar a taxação sobre heranças, hoje limitada ao intervalo de 4% a 8%. O Rio Grande do Sul quebrado, atrasando salário, cobra 4%! É preciso primeiro ter o projeto, depois formular uma estratégia coordenada entre governo, empresariado e universidades. Jamais houve experiência na humanidade em que o "laissez-faire" (deixar fazer, em tradução livre) fosse encarregado de desenvolvimento. Respeito a iniciativa privada, que tem um papel indispensável ao progresso humano, mas ela jamais promoveu desenvolvimento. Até sabe fazer crescer a economia, mas tende à concentração, à iniquidade e instabilidade, como foi a crise de 2008. A terceira coisa a fazer é um profundo investimento em gente. O Brasil tem de decidir, planejar, estabelecer metas e prazos para reverter o quadro vergonhoso da educação, ciência, tecnologia e cultura. O Brasil hoje está proibido de crescer. Temos, por exemplo, um explosivo endividamento das famílias e empresas - 40 milhões de brasileiros estão negativados no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito), e o setor privado brasileiro deve R$ 2 trilhões - desse volume, R$ 600 bilhões são créditos de recuperação duvidosa, segundo os bancos. Ou seja, estão plantando a semente de uma crise bancária. 
JC - Crise bancária?
Ciro - Sim, sintoma disso é que o mercado já repugnou a rolagem de dívida do Brasil. Hoje, o Banco Central é titular passivo de um passivo de R$ 1,184 trilhão de uma canalhice chamada operação compromissada. Ninguém sabe o juro disso e isso vence em quatro dias. Operação compromissada é algo que existe no mundo inteiro.
JC - Venda de estatais a estrangeiros é governo neoliberal?
Ciro - Esse negócio de vender um país não é neoliberalismo. Isso é canalhice pura e simples, porque isto gera um negócio que os economistas chamam de passivo externo líquido. Quando a gente pega três hidrelétricas de Minas Gerais, e vende para o capital estrangeiro, o que acontece é que você entrega o regime de águas do país para o capital estrangeiro. Não é algo ideológico, é corrupção mesmo, de alto coturno. Se tem uma quadrilha no poder no Brasil, isso eu sei bem quem são. Michel Temer (PMDB), Eliseu Padilha (PMDB), Geddel Vieira Lima (PMDB), Moreira Franco (PMDB), isso é tudo quadrilheiro. É bandido.
JC - O impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) foi justo?
Ciro - A Dilma estava fazendo um governo deplorável, muito ruim, mas ela é uma pessoa honrada e o pretexto para derrubá-la foi uma mistificação contábil que todos os presidentes fizeram, a tal pedalada fiscal. E o Tribunal de Contas (da União) aprovou todas prestações de todos os outros presidentes. Então é um golpe de Estado que aconteceu mesmo, e nem remotamente foi por corrupção.
JC - Essa questão da quadrilha instalada no governo, como o senhor diz, vai prejudicar algum dos candidatos na eleição?
Ciro - Ser aliado desse governo é o beijo da morte. Acho que o PSDB cometeu um erro de atacado produzido pelos velhos, que já estão cansados de perder e não têm mais a esperança no futuro, então resolveram cair de boca na esculhambação, tipo o Aloysio Nunes, quando fizeram o golpe. Se eles deixam a Dilma administrar essa loucura de política econômica que ela fez, totalmente errada, e esses números todos que estou lhe dizendo fossem imputados à Dilma, a eleição para eles hoje era um passeio. Se a Dilma estivesse no governo, ela que seria responsabilizada por esses números que eu dei aqui. Que tipo de situacionismo sobreviveria a isso? Nenhum.
JC - O senhor já tem os nomes para a área econômica?
Ciro - Tenho uma equipe monstruosa, mas só vou citar nomes quandos aceitarem. Um cito, que é o Mauro Benevides Filho, secretário da Fazenda do Ceará.
JC - Tem de mudar a forma de se fazer gestão fiscal do governo?
Ciro - O País comigo vai tomar a deliberação de crescer, e o Banco Central perseguirá menor inflação a pleno emprego. Onde estamos que o presidente da República pode ser qualquer um, mas o do BC não pode ter interferência? Evidente que não haverá interferência politiqueira e demagógica, mas vou buscar que os preços se comportem em favor da produção, da parcimônia e do trabalho, e não do consumismo populista. O câmbio tem de estimular a produção, e a taxa de juros será estressada para ficar abaixo da rentabilidade média dos negócios. Inflação boa é inflação zero.
JC - A campanha de 2018 é uma antes e outra após o dia 24?
Ciro - Sim, claramente, e volto a dizer que torço muito que o Lula seja absolvido, e, do alto de sua integridade moral restaurada, prepare um grande diálogo sobre o futuro do País. A candidatura dele - e digo isso com muito carinho e respeito -, é um desserviço a ele e ao Brasil. A ele, porque jamais vai replicar o extraordinário governo que fez. Ao País, porque, se ele for candidato, não se tem mais debate sobre o futuro da nação. É ódio e paixão em relação ao Lula, e projetará por não sei quantos anos esse negócio que está arrebentando com o País. Isso é o que eu penso, e dói em mim.
JC - Se o Lula não concorrer, o senhor vai buscar o PT?
Ciro - Não.
JC - O senhor aceitaria o PT?
Ciro - Aceitaria completamente, mas é só para ser humilde, porque eles não vão me apoiar, como não apoiam ninguém. É sintomático também que o maior e mais importante partido do Brasil não tenha um segundo nome.
JC - Como o senhor vê o baixo desempenho nas pesquisas?
Ciro - Sou um político bastante treinado. Já fui candidato saindo do zero com opositor com 36% e ganhei. Alguém acredita que o (deputado federal) Jair Bolsonaro (PSC) resiste? Alguém acredita que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), tenha 6% dos votos? Desconsidero as pesquisas e trabalho. Vocês estão falando com o próximo presidente do Brasil, esperem para ver. Eleição majoritária é resolvida de véspera. A tendência do voto do eleitor que é posta antes. E a campanha está pedindo alguém ficha limpa, experiente, com história política que possa ser examinada e que não seja radical.
JC - Com quais partidos o senhor tem conversado?
Ciro - Ninguém está acertado com ninguém. Está todo mundo achando que o Lula não é candidato, e todos querem a simpatia dele para herdar a popularidade. Estou conversando com o PCdoB ou PSB, não acertando aliança porque as siglas já têm candidatos.
JC - Se o Lula não puder concorrer, quem apoia o petista apoiaria o senhor?
Ciro - Naturalmente. Por isso essa agressividade, este desespero. Na medida em que Lula saia, ninguém inventa candidato, e eles vão querer inventar um. O mais grave é inventar um, e o próprio Lula pendurado em liminares, porque não acredito que ele vá se prestar a esse papel, que introduziria uma deslegitimação do processo. Mas não vou dar palpite.
JC - Além de PCdoB e PSB, o senhor está pensando em alguns partidos de centro-direita? O PP compôs a base da Dilma.
Ciro - Você acha que alguém ainda responde a esses critérios no Brasil? Eu sou candidato à presidência do Brasil, não é à madre superiora do convento. Estou com um projeto de desenvolvimento nacional que precisa interagir com o Brasil real. Vou pedir muito ao povo que não me mande a Brasília com as mãos e os pés amarrados, vou pedir que votem em deputados federais e senadores que tenham afinidade com esse conjunto de valores estratégicos. Mas ao mesmo tempo, já afirmo: quem o povo eleger, é com ele que o povo vai negociar. Eu sou do ramo.
JC - E o PMDB?
Ciro - PMDB me fará oposição. Mesmo que queira se vender, eu não compro. O PMDB será levado à destruição, vou partir para destruir o PMDB.
JC - De que forma?
Ciro - Democrática e politicamente. Tirando o oxigênio deles, que é roubar do governo. Já para a eleição, quero distância deles. A gente tem de respeitar as peculiaridades e jamais houve uma aliança central brasileira, nem na democracia antes de 1964, nem depois, nem com verticalização autoritária, fazer com que uma aliança central se reproduzisse embaixo. Mas eu tenho recomendado aos meus companheiros para evitar.

Perfil

Ciro Ferreira Gomes, 60 anos, nasceu em Pindamonhangaba, em São Paulo, mas se radicou em Sobral, no Ceará. É advogado, professor universitário, escritor e ocupou diversos cargos eletivos na história da política brasileira. É vice-presidente do PDT. Entre as funções que ocupou, a de governador do Ceará foi a que mais o projetou, entre março de 1991 e setembro de 1994, quando sai para ser ministro da Fazenda no governo de Itamar Franco (PMDB), sucedendo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que disputaria e venceria para o primeiro mandato na presidênci. Ciro ocupou a pasta da Integração Nacional no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT, 2003-2006). A família do ex-governador tem trajetória política no Ceará - o pai José Euclides Ferreira Gomes foi prefeito de Sobral por três mandatos, e os irmãos Cid e Ivo Gomes também ocuparam cargos eletivos. O pedetista concorreu à presidência da República por duas vezes, em 1998 e 2002 pelo PPS. Filiou-se ao Pros em 2013, e em 2015 acabou migrando ao PDT. PDT.ernacionais de capital quebrarem, como o Brasil no período do ex-presidente José Sarney, na década de 1980. Outro fator é a superação frenética dos ciclos tecnológicos, o adensamento profundo da tecnologia, e sua ciclagem com grande velocidade, e o país não discutiu isso. Tivemos a emergência da redemocratização, depois inflação, dois ciclos de consumo sem sustentação - primeiro no governo Fernando Henrique, que substituiu a ideia de país e nação por uma reeleição eainda elevou os volumes de importação,e na passagem do primeiro governo Lula