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Cinema

- Publicada em 07 de Dezembro de 2017 às 23:16

Viagem interrompida

Em Assassinato no Expresso do Oriente, Kenneth Branagh segue projeto de reler clássicos

Em Assassinato no Expresso do Oriente, Kenneth Branagh segue projeto de reler clássicos


FOX/DIVULGAÇÃO/JC
Quando iniciou sua carreira de cineasta, em 1989, Kenneth Branagh realizou uma versão de Henrique V, de Shakespeare. É importante ressaltar que esta peça também marcou a estreia, como diretor de cinema, de outro nome do teatro britânico, Laurence Olivier, que em 1944 havia iniciado sua filmografia com uma notável adaptação, numa época em que era necessário transpor os temas principais do original para a cena contemporânea. A versão de Branagh tinha outro objetivo e, além de falar sobre dignidade, fraternidade e coragem, também olhava para os males da violência e as consequências dos conflitos bélicos. A cena em que o protagonista percorria um campo de batalha carregando o corpo de um jovem era um movimento de câmara digno de Kubrick. Esta nova abordagem da peça iria deixar clara, com o passar do tempo, uma das características da obra de Branagh como cineasta. No ano de 1994 ele iria, outra vez, se aproximar de um clássico do cinema e da literatura, realizando uma versão de Frankenstein, o romance de Mary Shelley, filmado em 1931 por James Whale. Outra vez, o cineasta não se limitou a recolocar em cena determinados temas. Ampliou a narrativa e encenou as cenas finais do romance, que Whale preferiu ignorar, realizando uma obra mais ampla e também sólida na crítica a uma civilização. Em 1996, o realizador voltou a se aproximar de Shakespeare, realizando uma versão integral, com quatro horas de projeção, de Hamlet, que Olivier também havia filmado em 1948 e que recebeu o Oscar de melhor filme naquele ano. Em 2006, outra aproximação com um mestre, desta vez Ingmar Bergman. A versão que Branagh realizou de A flauta mágica, a ópera de Mozart que o sueco havia levado ao cinema em 1975, não foi exibida no Brasil, um ineditismo constrangedor, ampliado pelo fato de que também não veremos na tela apropriada Così fan tutte, de Michael Haneke, igualmente baseado em Mozart, e também La traviata, de Sophia Coppola, versão da ópera de Verdi.
Quando iniciou sua carreira de cineasta, em 1989, Kenneth Branagh realizou uma versão de Henrique V, de Shakespeare. É importante ressaltar que esta peça também marcou a estreia, como diretor de cinema, de outro nome do teatro britânico, Laurence Olivier, que em 1944 havia iniciado sua filmografia com uma notável adaptação, numa época em que era necessário transpor os temas principais do original para a cena contemporânea. A versão de Branagh tinha outro objetivo e, além de falar sobre dignidade, fraternidade e coragem, também olhava para os males da violência e as consequências dos conflitos bélicos. A cena em que o protagonista percorria um campo de batalha carregando o corpo de um jovem era um movimento de câmara digno de Kubrick. Esta nova abordagem da peça iria deixar clara, com o passar do tempo, uma das características da obra de Branagh como cineasta. No ano de 1994 ele iria, outra vez, se aproximar de um clássico do cinema e da literatura, realizando uma versão de Frankenstein, o romance de Mary Shelley, filmado em 1931 por James Whale. Outra vez, o cineasta não se limitou a recolocar em cena determinados temas. Ampliou a narrativa e encenou as cenas finais do romance, que Whale preferiu ignorar, realizando uma obra mais ampla e também sólida na crítica a uma civilização. Em 1996, o realizador voltou a se aproximar de Shakespeare, realizando uma versão integral, com quatro horas de projeção, de Hamlet, que Olivier também havia filmado em 1948 e que recebeu o Oscar de melhor filme naquele ano. Em 2006, outra aproximação com um mestre, desta vez Ingmar Bergman. A versão que Branagh realizou de A flauta mágica, a ópera de Mozart que o sueco havia levado ao cinema em 1975, não foi exibida no Brasil, um ineditismo constrangedor, ampliado pelo fato de que também não veremos na tela apropriada Così fan tutte, de Michael Haneke, igualmente baseado em Mozart, e também La traviata, de Sophia Coppola, versão da ópera de Verdi.
O novo filme de Branagh, Assassinato no Expresso do Oriente, portanto, não é apenas uma nova versão do romance de Agatha Christie, pois o livro já havia sido transposto ao cinema por Sidney Lumet em 1975. O cineasta está assim dando continuidade àquela parte de sua obra marcada pelo interesse em revisar clássicos. No filme de Lumet, a ênfase era dada à vingança. Agora, Branagh prefere desenvolver outro tema, sem que o outro seja abandonado. Beneficiado por recursos técnicos que ainda não existiam no ano da primeira versão, o realizador pode agora colocar em cena a questão da natureza humana que, movida pelo descontrole é capaz de alterar por vezes o ritual a ser obedecido e também interromper o ritmo a ser seguido pela sociedade humana. Em muitas passagens de seu novo filme, o diretor insiste em utilizar imagens nas quais vemos o trem percorrendo um cenário coberto pelo gelo. Talvez o diretor estivesse pensando nos magníficos planos em que vemos o trem percorrendo a paisagem em Night Mail, um dos maiores documentários britânicos e no qual foi decisiva a participação de Alberto Cavalcanti. A verdade é que a interrupção de tal movimento coincide com um assassinato a ser desvendado pelo protagonista do filme, o detetive Hercule Poirot.
O crime sempre será uma alteração da ordem estabelecida, um rompimento com as normas, uma violação da conduta a ser seguida. As aparências são assim desmontadas e o oculto se torna visível. Poirot, interpretado pelo próprio diretor, é um cultor da simetria, um devoto da elegância, da linguagem correta, dos rituais que conferem dignidade e nobreza a todos os movimentos humanos. Esses são dados que a direção enfatiza, colocando-os no centro da ação. Na cena em que o detetive divide uma sobremesa com o homem que lhe pede proteção, o cineasta destaca todas essas características. Um ator excepcional, Branagh se esmera na construção desse personagem, que parece representar a civilização e que devido à sua atividade é seguidamente colocado diante de vultos que se movem nas sombras, figuras desafiadoras da conduta exigida pelo processo disciplinador. Os sapatos sujos na sequência inicial resumem a temática principal da obra. O filme não está entre os melhores de Branagh, mas é um espetáculo cinematográfico tocado pela inteligência.
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