Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Empresas & Negócios

- Publicada em 07 de Agosto de 2017 às 11:48

Vem aí o 'PIB da vassoura'


WHATWOLF/FREEPIK.COM/DIVULGAÇÃO/JC
O Brasil entrará na próxima década com informações detalhadas sobre o tempo que as famílias do País dedicam às tarefas domésticas - e qual é o peso disso para a economia. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) planeja lançar, entre 2019 e 2020, a chamada pesquisa de uso do tempo. O levantamento mostrará quantas horas brasileiros gastam para cozinhar, lavar roupa e cuidar das crianças. Além disso, fornecerá os dados para estimar qual é o valor dos serviços que todos fazem em casa, hoje desempenhados principalmente por mulheres e não contabilizados no PIB, o indicador que mede o ritmo da atividade econômica.
O Brasil entrará na próxima década com informações detalhadas sobre o tempo que as famílias do País dedicam às tarefas domésticas - e qual é o peso disso para a economia. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) planeja lançar, entre 2019 e 2020, a chamada pesquisa de uso do tempo. O levantamento mostrará quantas horas brasileiros gastam para cozinhar, lavar roupa e cuidar das crianças. Além disso, fornecerá os dados para estimar qual é o valor dos serviços que todos fazem em casa, hoje desempenhados principalmente por mulheres e não contabilizados no PIB, o indicador que mede o ritmo da atividade econômica.
Para especialistas, as informações do chamado "PIB da vassoura" serão importantes para orientar a formulação de políticas públicas, ajudar empresas a definir programas de gestão e de recursos humanos, aumentar o debate sobre a desigualdade de gênero e até encontrar formas de aumentar a produtividade da economia.
Não há estatísticas oficiais no País sobre o peso dos afazeres domésticos na economia. No mundo, o cálculo é incentivado por organismos como a ONU Mulheres e a Eurostat (agência de estatísticas da União Europeia) para conhecer melhor a economia e, uma vez que a divisão de tarefas ainda é desigual entre os gêneros, levantar o debate sobre as disparidades. Hoje, o número de horas dedicadas pelas mulheres a afazeres domésticos é 2,5 vezes maior que as gastas por homens. Países como França e EUA já têm pesquisas de uso do tempo, enquanto o México é referência em cálculo do PIB de afazeres domésticos, estimado naquele país em 24,5%.
No Brasil, um estudo da economista Hildete Pereira de Melo, pesquisadora da Universidade Federal Fluminense (UFF), estima que, em 10 anos, essas atividades geraram o equivalente a um PIB brasileiro, em torno de R$ 5 trilhões ou 10% do PIB a cada ano. O dado mais recente, de 2015, estima que as tarefas domésticas representaram o equivalente a 11,3% do PIB daquele ano. O número não é comparável com outros países, pois não há uma metodologia padrão internacional para a conta.
A estimativa da economista foi feita com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), que traz informações sobre o tempo dedicado aos afazeres domésticos desde 2001. O cálculo tem com base o salário do empregado doméstico, levando-se em conta que esse seria o valor gasto, caso a família contratasse o serviço. Ou seja, se a tarefa fosse executada por um trabalhador doméstico.
Embora o PIB seja expresso em dinheiro, nem todas as atividades que compõem o indicador são comercializadas. Na agropecuária, por exemplo, a produção das famílias para consumo próprio entra na conta, mesmo sem ser vendida. Mas, enquanto é fácil medir quanto vale um litro de leite produzido na fazenda - seja ele vendido ou consumido pelo próprio produtor -, é difícil estimar o valor do tempo de cada um. A própria metodologia adotada por Hildete é contestada por alguns pesquisadores: afinal, o tempo de cada um tem um preço baseado no tipo de qualificação. A pesquisadora optou por adotar o valor do serviço doméstico, mas não há consenso em relação a isso.
O IBGE é a favor do cálculo. "Fazemos imputações de renda: se faço uma cadeira e não compro uma, aquilo faz parte da minha renda. Sem ter ideia de quanto as famílias estão trabalhando em casa, não se tem ideia de qual é a importância disso na economia", destaca Roberto Olinto, presidente do instituto, que vê os planos para lançar a pesquisa até 2020 como preliminares.
Ex-diretor de Contas Nacionais do IBGE, o economista Claudio Considera assina ao lado de Hildete o estudo. "Há mais serviços disponíveis do que os mensurados e eles representam 10% do PIB. Isso não é pouca coisa." Que o diga a arquiteta Claudia Tavares, de 53 anos. Ela chega a dedicar 24 das 168 horas da semana às tarefas domésticas. O marido, o oficial de Justiça Sinclair Albuquerque, de 44 anos, gasta 10 horas nessas atividades, segundo um questionário informal proposto pelo Globo a três famílias. Pelo método proposto por Hildete Pereira, o "PIB da vassoura" na casa chega a R$ 9.679,28 em um ano. "Já tive babá, faxineira, empregada e faxineira. Financeiramente, não valie muito a pena. Fui mudando meu esquema de vida. Agora, tenho um escritório do lado de casa, em Ipanema. Até os 40, não tinha a experiência de cozinhar e cuidar da casa. Foi uma descoberta", conta Claudia.
Na casa dos noivos Ornella Martins, de 22 anos, e Lucas Lobão, de 27, a ordem é dividir as tarefas. "Procuramos dividir as tarefas de forma igual. Fazemos o que temos mais afinidade. O Lucas sabe cozinhar, então isso fica mais nas mãos dele. Cuido mais das roupas", diz a estudante. O casal Thiago Jatobá e Vinícius Campos, juntos há três anos, tenta dividir ao máximo as tarefas. Mas como Thiago está desempregado atualmente, busca realizar as atividades enquanto Vinícius está no trabalho. Resultado: trabalha 58 horas por semana em casa. "Buscamos dividir as tarefas de forma justa, mas, como tenho ficado em casa, acabo realizando um pouco mais de atividades", afirma Thiago.
Especialistas alertam que um PIB de trabalho doméstico muito alto pode indicar distorções, principalmente quando a divisão de tarefas é desigual. Por isso, a pesquisa será importante para fazer esse diagnóstico, analisa o economista da Firjan Riley Rodrigues, autor de um estudo sobre as horas gastas no deslocamento entre casa e trabalho - que será investigado mais amplamente na pesquisa do IBGE. "Se a pesquisa identificar que um grupo tem uma riqueza não computada maior do que aquela já registrada no trabalho tradicional, é possível pensar em formas de investir socialmente, reduzindo essa produção sacrificada em afazeres domésticos para aumentar a produtividade no horário formal", sustenta Rodrigues.
Para as empresas, as informações sobre o uso do tempo podem ajudar a definir quais benefícios são mais importantes para os funcionários, destaca Nelson Braco, consultor sênior de Capital Humano da Mercer. "Conhecer demograficamente os anseios da população permitirá que as empresas desenhem planos de benefícios flexíveis, de acordo com o público que quer atingir", avalia. Patricia Coli, gerente de Capital Humano e Talent da consultoria Oliver Wyman, acrescenta que a pesquisa mostrará dados difíceis de obter com os funcionários. "Se a empresa sabe onde o empregado gasta tempo fora do trabalho, começa a entender como ajudar. Hoje, a gente tem uma limitação para perguntar coisas da vida pessoal", pondera, ao destacar que as informações públicas do IBGE permitem criar propostas.
O debate sobre a desigualdade de gênero move as discussões. Atribuir um valor a um trabalho ainda desempenhado principalmente por mulheres valorizará um trabalho hoje invisível. "A maior preocupação é com a equidade", defende Hildete. Para a economista Lucilene Morandi, pesquisadora da UFF, do mesmo núcleo que Hildete, trata-se de uma questão de medir o bem-estar - dimensão que historicamente escapa ao PIB. "Quando você discute bem-estar social e distribuição de renda, a parte do trabalho não remunerado deveria ser contabilizado, porque faz parte da qualidade de vida das pessoas", defende. Segundo Lucilene, em alguns países, a aposentadoria é calculada em cima do valor do trabalho, de quanto a mulher ganhou de salário médio ao longo da vida. Quando não se mede o trabalho não remunerado, você está lançando a mulher à pobreza, porque ela terá remuneração menor .
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO