O Carnaval é a mais alta expressão do paganismo e do politeísmo; é a evidência dos mitos primitivos, porque através, dos foliões, revela-se a fábula, a história e profundos segredos escotomizados no inconsciente dos povos. A extravasante loucura dos três dias de ausência das atividades mentais, só encontra seu fim na Quarta-feira de Cinzas. A tão aguardada e extrovertida alegria, contentamento e plenitude, no bojo recôndito do inconsciente encerra uma angústia burlesca; é o clímax da estroinice. O Carnaval é o palco universal da exibição das dicotomias e ambivalências. É um encontro com as aspirações mais singulares, em que o ser humano exibe as aspirações profundas de ser o que não é; e o que almeja ser no cotidiano da existência. O folião, envolto nesse êxtase, extravasa abertamente a culminância das manifestações maníacas, a eclosão dos instintos primários, dos componentes criminais, psicóticos e psicopáticos, em latência nos 300 e muitos dias, quando há uma dissonância das identidades sexuais pela ação confusional de sons disrítmicos, da majestades sonora, de cornetas e tambores, e de chuvas de confetes e serpentinas, obnubilado pela incógnita no universo dos sonhos, encoberto pelas fantasias carnavalescas policrômicas, em igualdade com as de ordem emocional.
Não se ignora que, no Carnaval, há um expressivo incremento de suicídios, o que viria contrariar Epicuro, o imortal fidalgo, a proclamar que "a vida deve ser vivida elegantemente em um sentido pleno". Ao findar as comemorações, a quarta-feira está a espargir as cinzas da depressão, sobre as ilusões, e a magia do fausto e da pompa para realidade da vida, e as aspirações de ser rei ou rainha, encontram nela o seu fim.
Psicanalista e jornalista