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entrevista especial

- Publicada em 17 de Julho de 2016 às 22:14

Simone Leite defende formação de PPPs com o governo

"Vemos um sufocamento da classe produtiva pela elevada carga tributária", diz Simone

"Vemos um sufocamento da classe produtiva pela elevada carga tributária", diz Simone


MARCO QUINTANA/JC
Primeira mulher à frente da Federação das Associações Comerciais e de Serviços do Rio Grande do Sul (Federasul), Simone Leite (PP) defende as Parcerias Público-Privadas (PPPs) com o governo do Estado para garantir investimentos em meio à crise financeira pela qual passa o Rio Grande do Sul.
Primeira mulher à frente da Federação das Associações Comerciais e de Serviços do Rio Grande do Sul (Federasul), Simone Leite (PP) defende as Parcerias Público-Privadas (PPPs) com o governo do Estado para garantir investimentos em meio à crise financeira pela qual passa o Rio Grande do Sul.
Segundo Simone, o empresariado tem interesse sobretudo em duas áreas: concessão de estradas e presídios. A primeira já teve projeto aprovado na Assembleia Legislativa. A segunda é uma área cuja possibilidade de PPPs já é estudada pela Secretaria Estadual do Planejamento e Desenvolvimento Regional.
Apesar de criticar o aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), elogia a maior parte das medidas de ajuste fiscal tomadas pelo governo de José Ivo Sartori (PMDB), como a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal estadual e a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que congelou o salário dos servidores pelos próximos anos.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, ao elencar as principais dificuldades dos empreendedores no Estado - como a elevada carga tributária e problemas logísticos - Simone conclui que "o Rio Grande do Sul se tornou um lugar caro para empreender". Ela também elogia a aproximação do governo do presidente interino Michel Temer (PMDB) com os setores produtivos e empresariais.
Jornal do Comércio - Como avalia a política de ajuste fiscal do governo Sartori?
Simone Leite - Percebemos um equívoco ao aumentar impostos, ao que somos radicalmente contrários. Aumentar a carga tributária significa reduzir a arrecadação. Temos pessoas muito capacitadas que mostraram ao governo, antes de a medida ser aprovada, as consequências de aumentar os tributos. Além disso, vivemos a questão da guerra fiscal no Brasil, que é algo que precisa ser enfrentado. Muitos estados estão buscando empresas gaúchas ou permitindo, através de incentivos fiscais, que empresas gaúchas empreendam em outros estados. E isso acaba reduzindo a base de arrecadação aqui no Estado. A gente precisa aumentar a base de arrecadação para que mais empresas venham a contribuir com esse bolo fiscal. Já demonstramos nossa preocupação sobre a migração de empresas gaúchas para outros estados para o secretário (estadual de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia), Fábio Branco (PMDB), e para o próprio governador Sartori. Mas entendemos que esse governo assumiu em meio a uma crise muito séria, que impacta no funcionalismo público, no empresariado, na sociedade, de um modo geral. Muitas medidas estão beneficiando o Estado, não a curto, mas a médio e longo prazos. O ajuste fiscal e a lei de responsabilidade são fundamentais para essa recuperação.
JC - Se, por um lado, a Federasul critica o aumento de ICMS, por outro, apoia outras medidas como a Lei de Responsabilidade Fiscal estadual...
Simone - Sim. Há outros pontos que concordamos com o governo Sartori. Também defendemos um orçamento realista, como o que o governador apresentou à Assembleia Legislativa (o que consta na Lei de Diretrizes Orçamentárias, aprovada neste mês). A secretária do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, Ana Pellini, tem feito um trabalho muito importante, agilizando aos processos de licença ambiental. A burocracia (no licenciamento ambiental) atrasa o desenvolvimento econômico, sufoca a atividade produtiva. Também apoiamos o veto ao reajuste dos salários dos servidores da Assembleia, do Ministério Público, do Judiciário, Defensoria Pública e Tribunal de Contas do Estado. Não que o trabalhador não mereça, mas, nesse momento de crise, todos os gaúchos precisam pagar a conta e fazer sacrifícios. O trabalhador da iniciativa privada não vai receber aumento, ele está perdendo o emprego, porque, nós, empresários, principalmente nos últimos dois anos, estamos reduzindo despesas da forma que dá, para que a gente possa sobreviver. Mesmo que os poderes tenham autonomia em relação aos seus gastos, a gente entende que essas medidas (de ajuste fiscal) vão ao encontro dos anseios da população.
JC - Quando o Sartori assumiu, ele apontou as Parcerias Público-Privadas (PPPs) como alternativas de investimentos ao Estado...
Simone - Somos favoráveis às PPPs. Com a Operação Lava Jato, tivemos grandes empresas envolvidas em esquemas de corrupção aqui no Brasil. Isso é um problema. Deve se abrir (as PPPs) também para empresas estrangeiras. Só que temos que ter bons contratos, uma fiscalização eficiente.
JC - Uma PPP que já foi encaminhada ao Legislativo foi a concessão das rodovias gaúchas. Essa é uma área de interesse do empresariado gaúcho?
Simone - Defendemos na Assembleia Legislativa o projeto de concessão das rodovias gaúchas. Sabemos que há marcos regulatórios e legislações internacionais que podem ser copiados, da mesma forma que deve se fazer uma fiscalização eficiente nos contratos. A gente tem o exemplo da própria Concepa, da BR-290, que é um case de sucesso. Todos os dias a gente vê obra, vê melhorias a cada ano, tem uma cobrança que reverte em benefício para o usuário. A sociedade acha que pagamos impostos demais para o retorno que temos em serviços públicos. Quer dizer, a infraestrutura deveria ser muito melhor pela carga tributária que pagamos. Então, a gente deseja que tenha PPPs nas principais estradas gaúchas. Nas federais, já é uma realidade. Se não for através da iniciativa privada, não vamos ter estradas de qualidade.
JC - A Federasul tem o diagnóstico de que áreas, além das rodovias, são interessantes para o empresariado?
Simone - Estávamos discutindo a questão dos próprios presídios. Entendemos que há alguns cases de sucesso na área dos presídios, com um custo menor por preso. Aliás, o custo da iniciativa privada é diferente do custo do poder público, justamente pela excelência e eficiência da gestão privada. Outra questão é em relação às próprias universidades. Hoje é mais barato comprar uma vaga em uma universidade privada, do que manter uma universidade pública. Falamos não da Ufrgs, que já está consolidada, mas principalmente nessas universidades regionais, que são mais descentralizadas. Se a iniciativa privada tem excelência no que faz, por que não aproveitar essa expertise para o benefício da população?
JC - Quais são as maiores dificuldades do empresariado aqui no Estado?
Simone - A carga tributária é uma delas. Os altos impostos fazem com que o empresariado deixe de ter uma certa lucratividade, deixe de fazer novos investimentos na empresa, e principalmente repasse esses custos para o consumidor. Isso faz com que o poder de consumo da sociedade gaúcha também fique menor. Temos a questão das licenças ambientais, que apesar de estar melhorando, ainda demora muito para sair uma licença ambiental. A Lei Kiss é outro empecilho: o empreendedor que vai abrir um negócio novo se depara com uma burocracia enorme, muitas resoluções para serem cumpridas e, depois de fazer todos os investimentos, se dá conta que os bombeiros levam dois anos para licenciar o estabelecimento. O acesso a crédito é outro problema: o micro e pequeno empreendedor têm muita dificuldade de terem acesso ao crédito, enquanto grandes empresas têm acesso a dinheiro barato. No momento em que os empresários mais precisam de capital de giro, de um apoio dos bancos para manter as suas empresas, não tem mais crédito no mercado ou os juros para os pequenos são muito altos.
JC - Quanto ao salário-mínimo regional...
Simone - O piso regional é maior que o salário-mínimo, é maior que o próprio piso de São Paulo, que é uma das maiores cidades empreendedoras e empregadoras do Brasil. Por que a gente precisa pagar um piso a mais? Não que seja injusto, que o trabalhador não mereça, ele merece, mas não temos condição de pagar. A questão do piso não pode ser tratada no âmbito político, com o governador decidindo sozinho qual será o reajuste. Precisamos, no mínimo, ter um cálculo fixo para sabermos quanto vai aumentar todos os anos. Mas um cálculo formulado pela área técnica, não pela política. Com tudo isso - piso regional, elevada carga tributária, dificuldades logísticas - o Rio Grande do Sul se tornou um lugar caro para empreender.
JC - Na última vez que o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati (PDT), palestrou no Tá na Mesa, ele disse que o País só voltaria a funcionar depois que o processo de impeachment tivesse um desfecho. Nesses primeiros meses de governo do presidente interino Michel Temer, deu para perceber alguma mudança?
Simone - Acredito que a gente vá sentir efetivamente a mudança no momento em que a gente tiver estabilidade no cenário político. Ou seja, com a decisão definitiva de a presidente Dilma (Rousseff, PT) continuar afastada e o presidente interino Michel Temer permanecer no poder. Então esse ainda é um momento de turbulência, na minha opinião, até que se consolide essa questão política. Uma vez consolidada, creio que o presidente Temer está imbuído com os melhores propósitos e cercado de bons profissionais, principalmente na área econômica. Algumas medidas impopulares vão precisar acontecer e ele está disposto a isso.
JC - Que medidas acredita que o governo interino Temer deveria tomar?
Simone - Hoje vemos um sufocamento da classe produtiva, por conta principalmente da elevada carga tributária. O presidente Temer se apresentou com o compromisso de tentar outras soluções possíveis para que não haja necessidade do aumento da carga tributária. Na condição de gestores de empresas, sabemos que precisa haver um ajuste fiscal. Não é possível gastar mais do que se arrecada. E hoje o governo federal gasta muito mal. Por isso, também defendemos a reforma do pacto federativo. O que antes era uma pauta política passou a ser também uma pauta das entidades de classe, e uma bandeira que a Federasul tem levantado, a partir da nossa gestão. A gente gera riqueza através do trabalhador, através dos empresários, no nosso município. E o dinheiro dos impostos vai para Brasília e, de forma dispersiva, volta em migalhas. Se o dinheiro ficasse no município, o gestor público teria condição de saber melhor o que a sociedade precisa por estar próximo da realidade local. Precisamos rever isso. Por que tantos servidores, tantos cargos em comissão (CCs)? Com as políticas públicas muito mais voltadas para grandes empresários e pessoas de baixa renda, a classe média acaba não sendo representada e é quem paga a maior parcela da conta. Tudo isso precisa ser repensado.
JC - O presidente interino tem recebido várias entidades do setor produtivo, como por exemplo a Confederação Nacional da Indústria. Como sente essa aproximação com o empresariado? É maior do que era no governo da Dilma?
Simone - Sem dúvida, é maior. Percebemos uma vontade política (de Temer) de estar próximo da classe empreendedora e produtiva. Não víamos isso no governo anterior, porque ele governava para uma classe muito pobre e para grandes empresários. Esse governo se deu conta de que precisa governar para todos.
JC - Pretende concorrer a algum cargo eletivo nas eleições deste ano?
Simone - Não pretendo concorrer em 2016. Hoje um dos meus ideais, como presidente da Federasul e da Mulher Progressista no Rio Grande do Sul, é a inserção da mulher nas entidades de classe, na iniciativa privada e na política. As mulheres precisam ocupar seu espaço. A gente vive numa sociedade muito machista. Depois de 180 anos, tivemos agora a primeira presidente da Assembleia Legislativa (Silvana Covatti, PP). Outro ideal em que tenho investido bastante energia é a participação do empresariado na política, ocupando cargos nas câmaras de vereadores, prefeituras, entidades de classe etc. O Brasil chegou nessa crise, em grande medida, por conta do silêncio da classe empresarial.

Perfil

Gaúcha de Estância Velha, Simone Diefenthaeler Leite tem 39 anos. Fez carreira em Canoas, onde, depois de atuar como professora, passou a administrar a empresa Urano, fabricante de balanças eletrônicas. Segundo ela, deixou o magistério pelas dificuldades em se manter com o salário de professora. Foi a primeira mulher a presidir a Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Canoas. Também foi secretária municipal de Desenvolvimento Econômico de Canoas (2009-2011), na primeira gestão do prefeito Jairo Jorge (PT). Filiou-se ao PP em 2012 a convite da vice-prefeita de Canoas, Beth Colombo (hoje PRB). De 2011 a 2013, atuou como vice-presidente da regional da Federasul no Vale do Rio dos Sinos. Foi uma das lideranças, em 2013, na mobilização do varejo gaúcho em torno do movimento Chega de Mordida, contrário ao pagamento do Imposto de Fronteira. Em 2014, ficou em terceiro lugar como candidata ao Senado. Hoje é presidente da Federasul, cargo no qual fica até 2018. Também preside o movimento Mulher Progressista do PP.