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Reino Unido

- Publicada em 22 de Junho de 2016 às 20:55

Ser ou não ser UE: Britânicos decidem nesta quinta futuro no bloco

Jovens manifestantes pró-permanência mostram seus argumentos para o plebiscito

Jovens manifestantes pró-permanência mostram seus argumentos para o plebiscito


Niklas HALLE'N/AFP/JC
William Shakespeare está mais atual do que nunca. Ser ou não ser, eis a questão, be or not to be, that is the question – verso que abre o ato III da peça Hamlet escrita pelo dramaturgo inglês morto há 400 anos. Permanecer na União Europeia (UE) ou sair - Brexit (fusão de Grã-Bretanha e saída), palavra da moda para traduzir um dos sentimentos do plebiscito. Mais de 50 milhões de eleitores estão aptos a votar nesta quinta-feira (23) para decidir se a região fica ou não no grande bloco de 28 nações do velho mundo. A votação ocorre 40 anos após o referendum que aprovou o ingresso no então Mercado Comum Europeu (MCE), embrião da UE, em 1975, com voto de 67% dos nativos. 
William Shakespeare está mais atual do que nunca. Ser ou não ser, eis a questão, be or not to be, that is the question – verso que abre o ato III da peça Hamlet escrita pelo dramaturgo inglês morto há 400 anos. Permanecer na União Europeia (UE) ou sair - Brexit (fusão de Grã-Bretanha e saída), palavra da moda para traduzir um dos sentimentos do plebiscito. Mais de 50 milhões de eleitores estão aptos a votar nesta quinta-feira (23) para decidir se a região fica ou não no grande bloco de 28 nações do velho mundo. A votação ocorre 40 anos após o referendum que aprovou o ingresso no então Mercado Comum Europeu (MCE), embrião da UE, em 1975, com voto de 67% dos nativos. 
A divisão sobre que rumo tomar é clara e desponta nas pesquisas e análises e opiniões de quem está no Reino Unido e observadores no Brasil. Nas famosas bolsas de apostas nas casas britânicas, está na frente a permanência. O score até esta quarta-feira (22) estava em 57%, segundo o site Oddschecker, baseado em 21 casas, e os palpites para sair, em 43%. Nas pesquisas de opinião, o jornal The Telegraph (a favor do Brexit) apontou 51% para permanecer e 49% para sair. Na sondagem do Financial Times, que é contra o Brexit, a vitória é do desembarque da UE, com 45% das opiniões, a permanência aparece com 44% e os indecisos somam 11%. O jogo pode mudar e muito. Caso a ilha opte por deixar a UE, haverá um período de dois anos de negociação dos termos desse desembarque.
“Meus amigos daqui dizem que será a pior votação que já tiveram. A televisão, os jornais, a opinião pública, todos estão divididos, ninguém está seguro de nada ainda”, descreve a jornalista gaúcha, com cidadania italiana e livre trânsito na UE, Teresa Frasson Antunes, que reside há 19 anos em Brighton, no litoral inglês, distante cem quilômetros de Londres. “O resultado vai ser surpresa para todo mundo. Só saberemos na hora da apuração. Se ficar dentro ou sair, será por muito pouco voto.”
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Teresa (foto) não tem passaporte britânico, por isso não vota no plebiscito que abre às 7h e termina às 22h no Reino Unido (4h e 19h pelo fuso horário de Brasília, respectivamente), mas sua filha mais velha, Sarah, de 18 anos e que nasceu na Inglaterra, vai. Sarah não está no país, viajou ao Brasil, mas deixou uma autorização para outro cidadão votar por ela, permitido pelas regras do referendum. “Minha filha vota para ficar na UE, pois acha que quem mais vai sofrer são estudantes como ela, que fazem a formação aqui e querem ir trabalhar fora”, explica a jornalista.
A divisão é sentida nas famílias. Segundo Teresa, pais são pelo Brexit e os filhos jovens como Sarah apoiam permanecer. “A classe baixa votará para sair, mas os mais esclarecidos ou classe média e alta estão divididos”, acrescentou a brasileira. Ela ainda cita os temores associados à saída, como eventuais bloqueios a produtos para sair e entrar, já que a ilha perderá vantagens do bloco, mesmo que ainda não adote o euro como moeda. “A preocupação também é o impacto ao inglês que reside no Exterior, que será mais penalizado se vencer o Brexit, além do medo de represálias de outras nações.” 

Moradores ingleses estão divididos

Jovens manifestantes pró-permanência mostram seus argumentos para o plebiscito

Jovens manifestantes pró-permanência mostram seus argumentos para o plebiscito


Niklas HALLE'N/AFP/JC
Em Brighton, o clima reflete a panela de pressão em que se transformou o bloco do Reino Unido, com Inglaterra, Irlanda do Norte, Escócia e País de Gales. Em conversa com a filha mais nova da jornalista gaúcha Teresa Frasson Antunes, Catherina, 15 anos, o diretor da Global Active Study, Luciano Baldauf confessa que prefere a saída do bloco. “É uma decisão difícil, pois tem o lado bom e ruim nas duas opções. Mas vou votar pela saída porque o Reino Unido pode ser muito forte fora da UE”, diz Baldauf. “Seria muito melhor para o povo britânico se pudéssemos controlar nosso próprio destino.” O diretor da escola sabe que a tese de permanecer observa muito a economia, “mas dentro da UE não podemos controlar a imigração, que é um dos grandes problemas hoje”.
Vizinho da gaúcha, o arquiteto aposentado Paul Tester vai votar para ficar na UE. “Será mais seguro para todos nós e economicamente mais estável para o país. Há muitos riscos em sair, e no curto prazo a perspectiva é bastante ruim”, opinou o arquiteto. “Não será vantajoso para ninguém.” Tester se preocupa com os efeitos para o sistema de aposentadoria e defende que a via deve ser a da negociação, para que o Reino Unido seja apoiado em suas dificuldades.
Teresa comenta que, como imigrante que está há 19 anos no Reino Unido, não espera nenhuma mudança. "Quem já está aqui há muito tempo não sofre nada se a Inglaterra sair. Já tenho filhos e uma vida aqui. Vai mudar para quem está chegando agora", vislumbra a jornalista. Para ela, a população que escolheu viver no país torce pela permanência.   

As frequentes indecisões dos britânicos

Jovens manifestantes pró-permanência mostram seus argumentos para o plebiscito

Jovens manifestantes pró-permanência mostram seus argumentos para o plebiscito


Niklas HALLE'N/AFP/JC
Não é de hoje que o Reino Unido se rebela. O casamento com a UE, celebrado em 1975, na época do Mercado Comum Europeu (MCE), também em um referendum, não foi precedido de amor à primeira vista, nem por um namoro apaixonado. Duas décadas antes, a ilha tentou barrar a criação, no pós-Segunda Guerra, de uma comunidade continental por meio da formação de uma associação europeia de livre comércio, com países do norte, recorda o professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Paulo Fagundes Visentini.
Na década de 1970, quando o Reino Unido adere ao MCE, o presidente francês Charles de Gaulle definiu de forma peculiar a estratégia adotada pelos britânicos, recordou ainda o professor. "Ele dizia que o Reino Unido era o cavalo de troia na Europa, pois há duas formas de fazer oposição - ficar de fora gritando ou ingressar e ficar por dentro travando as comissões." A linha anti-UE foi seguida pela dama de ferro Margareth Thatcher e agora é resignificada pelo plebiscito. O professor lembra que, mesmo dentro, o Reino Unido não segue todos os acordos, das regras de trânsito nas fronteiras e ainda mantém sua moeda (libra). São as flexibilidades da comunidade.
A atual crise, para o professor, revela uma atitude corriqueira do reino. "Quando um governo não mostra nada dentro de casa, ergue o tom contra Bruxelas (principal sede do Parlamento Europeu), para mostrar que o problema não é interno", explica Visentini. Foi o primeiro-ministro inglês David Cameron quem lançou a tese do plebiscito, mesmo que hoje tenha se transformado no fiel escudeiro da permanência, ou seja, ser UE, resolvendo a questão. Visentini associa a ideia da saída a resistências britânicas em seguir mudanças para gerar mais estabilidade no bloco, remédios para tratar os males da última crise econômica e puxadas pela Alemanha, a economia mais industrializada e de ponta do bloco.
Algumas mudanças atingem o fluxo de capitais, tema caro aos britânicos e sua economia financeirizada. "Mas a hora do blefe terminou, há desgaste de partidos perante a opinião pública, o eleitorado que defende o separatismo não é sério e articulado, sofre mais os efeitos de fortes emoções", define o professor do Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais da Ufrgs. "Mas há limite nesta briga de casal. A Inglaterra depende do capital financeiro da região, e muitas empresas ameaçam deixar o país, caso percam vantagens associadas à UE", avisou Visentini. O assassinato da deputada trabalhista Jo Cox, parlamentar ligada a causas humanitárias, na quinta-feira passada, abalou o governo. 
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O professor acredita que a permanência deve vencer, mesmo que por margem apertada, e que o Reino Unido deve buscar compensações a eventuais medidas aprovadas pelo Parlamento Europeu. O tema do fluxo de refugiados é caro. A jornalista Teresa Frasson Antunes opina que a ilha ficará na UE, mas avalia que deve haver medidas para lidar com o tema dos refugiados e revolta interna por cortes de benefícios para atender a imigrantes. Visentini reforça que há mais fatores em jogo, como a tensa relação com a Rússia, que gera problemas em todo o bloco.       
O analista pesquisador da Fundação de Economia e Estatística (FEE) Robson Valdez reforça o quadro desenhado rapidamente pelo professor da Ufrgs, mas acredita que o contexto vivido na largada do século 21 mostra uma Grã-Bretanha com economia menos fragilizada que nos anos de 1970, que pavimentou o embarque no bloco. "Hoje a Inglaterra tem uma economia mais dinâmica e pode se sustentar com as próprias pernas", argumenta o analista. Valdez vê uma mistura de expectativas, com muita irracionalidade, o que pode ser um risco na hora de depositar o voto. "O resultado é imprevisível, a disputa é acirrada, há fatores externos em jogo." 
O analista da FEE lembra que o governo de Cameron e a Câmara dos Comuns não são obrigados a seguir o resultado. “Não há vinculação, mas acredito que não ignorariam a vontade popular”, especula o pesquisador. O fator econômico pode pesar, diz, pois o governo fala em perdas de 30 bilhões de euros somente com a retirada de vantagens, estas sim amarradas ao bloco. Uma carta de mil empresas enviada à revista Times, metade delas listada na bolsa de valores, apontou que a saída da UE será sinônimo de incerteza, enquanto a permanência representa mais empregos, comércio e certezas.
Tanto Visentini como Valdez recordam a mais recente e fracassada investida de divisão no Reino Unido, que foi o plebiscito para independência da Escócia. No último ato (do voto), prevaleceu o espírito da comunidade maior. A questão a saber agora é se a lógica vai prevalecer.