Carlos Messalla, candidato do PCB ao governo gaúcho, propõe carga de 30h semanais para funcionalismo do RS

Candidato do PCB ao governo do RS avalia que Banrisul vai ser fundamental, dando linhas de crédito (a pequenos e médios empreendedores)

Por JC

"O Banrisul vai ser fundamental, dando linhas de crédito (a pequenos e médios empreendedores)"
Lívia Araújo e Caren Mello
Candidato do PCB, o chamado Partidão, ao governo do Estado, o servidor público Carlos Messalla traz ao Rio Grande do Sul algumas das plataformas que são resultado de consenso dos comunistas em todo o Brasil e que também fazem parte da plataforma de Sofia Manzano, que disputa o Planalto.

JC VÍDEOS: Como foi a entrevista com Carlos Messalla 

Entre essas propostas, está a redução da jornada de trabalho de 44 horas semanais para 30 horas. Embora Messalla admita que a ideia pode sofrer a resistência do empresariado local, o candidato crê que os benefícios irão se sobressair com o tempo. "O próprio ciclo econômico fará com que o empresário veja que tem funcionários mais saudáveis, que adoecem menos, que produzem mais, e ele está ganhando igual ou até mais do que ele já ganhava". A ideia do candidato, caso eleito, é de implantar a medida primeiramente no funcionalismo estadual.
Messalla também falou sobre questões como o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que pretende rever, e sobre privatizações, às quais o PCB é contrário.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, que encerra a série com os candidatos ao governo do RS, Messalla também falou da mudança de postura do Partidão no que chama de "eleições burguesas", nas quais a falta de representatividade reduz a visibilidade da sigla. "É importante disputar as eleições mesmo com todos os empecilhos que elas nos trazem", acredita.
Jornal do Comércio - Com o PCB tendo uma postura contrária às privatizações, caso eleito, como pretende abordar os processos que já estão em curso no Estado?
Carlos Messalla - Entendemos que não pode haver privatizações dentro do nosso Estado, porque a importância de uma estatal dentro do Rio Grande do Sul e no Brasil se dá justamente por conta do abismo social que temos, então precisamos de estatais fortes, que atendam a população com qualidade. E a gente vê que a própria empresa que comprou a CEEE já está tendo problemas. Sim, a CEEE apresentava problemas, mas temos de saná-los justamente por conta da importância dessas empresas. A nosso ver, setores estratégicos e privatizações que foram feitas recentemente devem ser revistas e as empresas reestatizadas.
JC - Como seria feita essa reestatização?
Messalla - É óbvio que a empresa que comprou teve seus custos, seus gastos, então vamos, de uma forma tranquila, sentar com eles e dialogar, da maneira mais amigável possível, para chegar a um valor que seja plausível para ambos. Talvez, se não conseguíssemos pagar o valor total, parcelaríamos, para ver o que pode ser feito, mas dentro de parâmetros que a população também concorde. Não é algo que o próprio governo vai vir e tomar uma decisão a portas fechadas. Todo o nosso governo vai ser às claras.
JC - Quais seriam as estratégicas para a manutenção da gestão estatal?
Messalla - Não posso cair aqui em uma forma simplista de falar, tipo "todas as estatais", mas seria um fato, pois todas elas têm sua importância. Mas, de forma estratégica, a questão de energia, telecomunicações, toda a parte de informática... todas são questões importantíssimas. Se o Estado não tiver o controle, entendemos que é muito ruim, porque é algo de que a gente precisará para questões futuras.
JC - Falando em futuro, caso seja eleito, seu governo terá de lidar com o Regime de Recuperação Fiscal, que impõe uma série de limites orçamentários aos governos futuros. Qual sua posição em relação a isso?
Messalla - Temos um entendimento que, na verdade até outras organizações já citaram, até a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil)tem esse processo desde 2012, que coloca que a dívida está paga, e nós também temos esse entendimento. O governo federal tem uma atitude em relação à dívida, a trata como se fosse um banco. O governo federal não é um banco, mas a gente está pagando juros sobre juros, de uma dívida que nós entendemos já estar paga. Para o RRF, foi feito um acordo que impede que tu faças investimentos por nove anos. Isso é algo que impossibilita concursos públicos. Isso impediria todos os trâmites que imaginamos aplicar em nossa política no Estado.
JC - O que pensa em fazer? Declarar moratória? Ou seguir pagando as parcelas enquanto se negocia outra saída?
Messalla - Teremos que sentar e dialogar, mas queremos seguir uma linha de não pagamento. Talvez paguemos a primeira e a segunda, porque havia um acordo, mas somos totalmente contrários. Que não seja uma situação conduzida de forma abrupta, mas sendo algo que impedirá o governo do Estado de ter a possibilidade de se reestruturar financeiramente... porque, passados esses nove anos, em que situação vamos estar? Se ele não pode fazer investimento, se ele não pode crescer economicamente...
JC - Entre as bandeiras do PCB, há a redução da jornada de trabalho para 30 horas semanais. Como convencer o empresariado de que isso é factível, em detrimento do lucro?
Messalla - Sim, isso traz um impacto, a gente vê um exemplo claro disso agora, com a suspensão da lei do piso da enfermagem, pois houve um lobby do grande empresariado da saúde. Mas a questão da carga horária é uma bandeira nacional nossa. Entendemos que as 44 horas semanais são algo arcaico para a vida que temos hoje, por todas as questões tecnológicas, todos os avanços que já tivemos. O tempo despendido lá atrás para fazer uma determinada função, hoje já se reduziu ao máximo. Em um primeiro momento, podemos fazer isso junto ao serviço público, mas queremos atingir toda a sociedade, queremos que todos os trabalhadores tenham a possibilidade de trabalhar por 30 horas semanais. O próprio ciclo econômico fará com que o empresário veja que tem funcionários mais saudáveis, que adoecem menos, que produzem mais, e ele está ganhando igual ou até mais do que ele já ganhava.
JC - Isso passa por algum estímulo ao pequeno empresário? De que forma?
Messalla - Entendemos firmemente que, se investirmos no pequeno e médio empreendedores na Capital, nos grandes centros e no interior do Estado, com a agricultura familiar, teremos todo esse ciclo econômico: vai gerar emprego, capital, a economia vai girar... e o Banrisul vai ser fundamental nisso, dando linhas de crédito a esses segmentos.
JC - A candidata à presidência do PCB, Sofia Manzano, fala em estatizar o agronegócio. Crê que isso seja viável em nosso Estado?
Messalla - Nosso partido entende a necessidade de estatização, de fortalecer o Estado. Isso não vai acontecer do dia para a noite. Um processo abrupto acho que traria até mesmo o caos, e não é o nosso interesse. O agronegócio gera um PIB alto para o Brasil, mas onde está esse PIB? Isso é um número, mas no momento em que conversamos, tem gente revirando o lixo para ter o que comer, então alguma coisa está errada. O agronegócio tem que trazer alimentos para a nossa população. Em um primeiro momento, vamos conseguir implantar isso com o pequeno agricultor familiar, que hoje fornece 70% do que vem para a nossa mesa. Existe uma legislação que permite o confisco de terras ociosas, que estão há mais de três anos sem nenhuma utilização. Isso não é invenção nossa. Então vamos fazer um levantamento junto aos municípios. Nossa expectativa é que a ampla maioria das pessoas compreenda que isso será melhor, porque inclusive a gente não vai ter tanto agrotóxico. A gente vai conseguir acabar com a fome aqui no Estado e até poderemos levar (alimentos) para outros estados.
JC - O que pensa para sua estrutura de governo, no secretariado, por exemplo?
Messalla - é importantíssimo que a gente tenha secretarias específicas tanto para a questão racial, que debata profundamente esse tema dentro do nosso Estado, que traga a questão da matriz africana; a questão das mulheres é importantíssima, mas acho também que temos que nos aprofundar na questão de classe. Também acho que uma pasta voltada a políticas para a comunidade LGBTQIA seria importantíssima, e também para a questão indígena no Estado.
JC - Além dos números deficitários na Educação, o cenário de pandemia agravou a situação e ainda promoveu uma evasão massiva, principalmente no Ensino Médio. Como pretende abordar a questão?
Messalla - Minha leitura é que os quadros políticos, as lideranças que tivemos no Estado têm muito a ver com uma educação que formava seres pensantes, e não só mão de obra. Uma escola que nos faz pensar, questionar, dialogar, que nos faz vislumbrar outros horizontes e questionar a sociedade. Mas esse é o fato hoje: temos escolas que não têm luz, sem telhado... em alguns casos estão comprando vagas em escolas particulares para suprir essa deficiência, além da baixa remuneração dos professores, a terceirização de funcionários. É um cenário horrendo. A gente precisa reestruturar as escolas públicas, teremos de olhar todas as escolas que estão com problemas; junto com isso, fortalecer os servidores públicos, acabar com as terceirizações dentro das escolas, fazer concurso, porque também tem um déficit tanto de professores quanto de trabalhadores de escola, e com isso, onde houver possibilidade, começar imediatamente a fazer a escola de turno integral, mas, para que funcione, precisamos ter mais professores qualificados.
JC - Caso eleito, o que pretende implantar em termos de participação popular?
Messalla - Queremos formar grupos de trabalhadores no âmbito dos bairros, faculdades, sindicatos, escolas, pois é nesses locais que as coisas acontecem de fato. Queremos que esses mecanismos do poder popular possam trabalhar junto com a Assembleia. Os próprios trabalhadores organizados saberão da importância de dialogar, de estar em um diálogo constante com os deputados. Vamos ter uma base pequena na Assembleia e não vamos conseguir passar mais projetos, então o poder popular é importantíssimo, a organização da classe trabalhadora. Se não houver uma organização realmente coletiva, o projeto do nosso governo talvez não ande.
JC - Justamente, o PCB está fazendo 100 anos no Brasil e ainda tem pouca representatividade legislativa. Ligado a isso, a cláusula de barreira impede que o partido esteja no horário eleitoral gratuito. Sem essa exposição, como sensibilizar o eleitorado de maneira efetiva?
Messalla - Não é uma tarefa fácil. Depois de ter vivido períodos de clandestinidade, a partir da abertura política (a partir de 1979, com a anistia), o partido teve uma leitura de se salvaguardar das eleições burguesas, de ser um espaço somente de debate, de utilizar o espaço das eleições mais como um espaço de protesto, movimentação. Só que dentro de nosso processo revolucionário, há agora uma nova leitura, na qual estamos criando quadros, disputando eleições. Se formos ver, em boa parte dos estados, temos candidatos ao governo, à Assembleia, tudo isso, então temos uma leitura de que, sim, é importante disputar as eleições burguesas mesmo com todos os empecilhos que elas nos trazem, de falta de tempo de TV, de rádio, o que dificulta muito. Já temos um trabalho que é difícil, porque a população é bombardeada diuturnamente com informações de que a vida dela é assim mesmo, que ela vai ter que trabalhar, que ela não tem o tempo para descansar ou ficar com a família, e isso é normal. É um trabalho difícil mas que a gente faz não só nas eleições: vamos aos sindicatos, às faculdades, aos bairros, estamos em todos os movimentos populares, e vamos onde temos a chance de ir para divulgar nossas ideias, e para mostrar que, sim, temos ideias firmes, mas pensando no conjunto da classe trabalhadora, pensando no poder popular e em uma vida realmente diferente dessa que se apresenta hoje.
JC - Então é de fato uma mudança na estratégia de ação do PCB a partir de agora?
Messalla - Isso já vem de algumas eleições, eu acho que de três eleições para cá.
 

Perfil

Carlos Messalla nasceu no município de Gravataí, em 10 de abril de 1976. Tem Ensino Médio completo e é servidor público federal, trabalhando como funcionário concursado dos Correios. Foi delegado sindical do Sindicato dos Telefônicos do Rio Grande do Sul (Sinttel), ex-dirigente do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios e Telégrafos (Sintect-RS) e membro da comissão racial da Federação Nacional dos Trabalhadores de Correios e Telégrafos (Fentect). Atualmente, é membro da Unidade Classe, onde atua na Fração Correios. Filiado ao PCB, nas eleições de 2020 foi candidato à Câmara de Porto Alegre e obteve 53 votos. Em 2022, candidato em chapa única, Messalla concorre pelo PCB ao governo do Estado, tendo como vice Edson Canabarro. Carlos Messalla é casado e tem três filhas.