Um crime estarrecedor

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Entre os crimes mais hediondos, que deprimem e entristecem o ser humano, estão aqueles praticados por atiradores paranoicos, executados sob ordens "divinais", inspiradas em mensagens secretas, ilusões e alucinações auditivas.
O incremento patológico desse tipo de crime nos conduz a questionar alguns quesitos, em suas linhas gerais. Em primeiro término, pergunta-se: será por acaso que a norma dessas ocorrências esteja, sempre, sob a égide de uma já clássica e múltipla repetição? Por que os funestos episódios, geralmente, não se reduzem a um só? Há, inegavelmente, ocorrências em série levadas, inconscientemente ou não, pela identificação com o "herói" criminoso. Ao imitá-lo, o aprendiz, dono e senhor do pensamento mágico, "absorve" seus comportamentos e características e passa a incorporá-los e a atuar como ele.
Os criminosos dessa desqualificada estirpe cometem os delitos com o propósito de sobressair, de figurar na mídia sensacionalista, como forma de atingir e projetar seu narcisismo primário, conquistando, dessa maneira, o almejado título de herói do crime.
A esse respeito, vale reportar-nos ao último crime, em que o atirador, ao invadir um templo de pessoas negras, na Carolina do Norte, fuzilou-as, matando nove. Vejam o que ele disse a uma sobrevivente, antes de ser detido, quando afirmou que não a mataria para que ela relatasse à mídia o desgraçado ato contra os negros. Suponho que tal declaração verbal reforce o que tenho escrito sobre a ação ignóbil, ao acentuar, em especial, a conduta da imprensa falada e escrita, que dá amplo noticiário sobre esse tipo de crime, provocando aplausos dos racistas, igualmente criminosos como o de Charleston.
O paranoico regozija-se diante de notícias acusatórias, as quais, para as suas normas, seria grave ataque à honra. A tétrica ocorrência soou como um ensurdecedor estrondo a desnortear a opinião pública, já exausta e perplexa em face do assustador incremento das ações criminosas. O funesto episódio assumiu a particularidade de um vendaval a redemoinhar em torno de um espaço claustrofóbico, do qual somos todos prisioneiros, à espera de um novo atentado.
Jornalista e psicanalista