* Com Gabrieli Silva
Um dos grandes desafios para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul é crescer em um contexto de envelhecimento da população e redução na velocidade de crescimento no número de habitantes. Esse cenário, que era uma projeção, se tornou realidade nos últimos, como mostraram os dados do Censo realizado pelo IBGE nos anos 2000.
Diferentemente dos outros estados da Região Sul do País – Santa Catarina e Paraná –, o Rio Grande do Sul teve crescimento demográfico inferior à média nacional. Enquanto a população gaúcha aumentou 1,85% entre 2010 e 2022 (mais recentes Censos realizados), o Brasil ampliou em 6,5%. Há dois grandes fatores que explicam esse resultado: a taxa de fecundidade, que mede a média do número de filhos por mulher, é baixa e o saldo migratório é negativo.
Nesse cenário, 289 dos 497 municípios do Rio Grande do Sul perderam população entre 2010 e 2022, o equivalente a 58,2% das cidades gaúchas.
Chama atenção também que quase metade dos municípios têm de 5 mil habitantes, são 236 cidades nesta situação.
"Historicamente, há uma redução expressiva da população rural. Em 1970, mais de 3 milhões de gaúchos viviam no campo, o que era quase metade da população. Em 2022, são menos de 1,5 milhão, representando cerca de 14% dos habitantes do Rio Grande do Sul. A agropecuária teve grandes ganhos de produtividade, reduzindo a necessidade de mão de obra. Com isso, muitos moradores do meio rural, especialmente jovens, migraram para as cidades em busca de estudo e emprego, fazendo municípios pequenos e rurais perderem a população", avalia o diretor adjunto do Departamento de Economia e Estatística da Secretaria Estadual de Planejamento, Governança e Gestão (DEE/SPGG), Pedro Zuanazzi.
Pedro Zuanazzi, do Departamento de Economia e Estatística, observa que redução da população em áreas rurais é histórica no RS
TÂNIA MEINERZ/JC
Diante dessa reconfiguração populacional, quem se favoreceu foram as cidades médias, entre 100 mil e 300 mil habitantes. "Esses municípios oferecem uma estrutura urbana e de serviços, mas com um custo de vida menor que nas capitais", explica Zuanazzi quanto aos motivos que atraem residentes a esses centros urbanos.
Outro fator de atratividade é a atividade industrial: das 10 cidades com o maior Valor Adicionado Bruto da Indústria (VAB Industrial), apenas duas (Porto Alegre e Rio Grande) tiveram perdas populacionais. "A indústria é mais intensiva em mão de obra e tende a oferecer melhores salários. Por isso, municípios industrializados costumam atrair população, diferentemente dos de perfil mais agrícola ou voltados a serviços de baixo valor agregado. Essa relação é observada no Brasil e em outros países em desenvolvimento", acrescenta o pesquisador.
Divisão regional mostra reconfiguração populacional
Embora a maioria dos municípios tenha perdido população, é possível vislumbrar um tímido crescimento na média estadual. E, ao dividir o Rio Grande do Sul em regiões, é possível observar especificidades locais. Um exemplo é a ampliação intensa das migrações rumo ao Litoral Norte — o que não ocorreu apenas entre 2010 e 2022, sendo observado desde os anos 2000 conforme aponta Zuanazzi.
Entre os 10 municípios que mais cresceram no Estado, seis estão na faixa litorânea, com destaque para Imbé (51,8%), Capão da Canoa (51,2%), Arroio do Sal (42,7%) e Balneário Pinhal (37,7%). O Corede Litoral Norte foi o que mais ampliou sua população entre todas as regiões, com aumento demográfico de 25,8% e 21 dos seus municípios em expansão.
"Entre os fatores que explicam isso está o fenômeno da segunda residência, muitas pessoas que tinham casas de veraneio no Litoral passaram a morar nelas, especialmente, com o avanço do trabalho remoto. Há também a questão da desejabilidade, em que, cada vez mais, as pessoas buscam qualidade de vida e escolhem lugares onde desejam viver, o que favorece cidades litorâneas", pontua Zuanazzi.
A Região Metropolitana, por sua vez, embora concentre a maior parte da população gaúcha e também impulsione o crescimento populacional, tem dinâmicas demográficas bastante diversas entre seus municípios. Porto Alegre, Viamão e Guaíba, por exemplo, perderam habitantes. Por outro lado, cidades do entorno ganharam, incluindo Cachoeirinha, Gravataí e São Leopoldo.
"Parte disso se explica pela migração. Um estudo com base no Censo de 2010 mostrou que Porto Alegre atraía população do Interior, mas perdia pessoas para outros estados. Ou seja, tinha saldo migratório positivo dentro do Rio Grande do Sul, mas negativo fora dele. Ainda não sabemos se o Censo de 2022 confirmará essa tendência, pois os microdados ainda não foram liberados. Além disso, fatores como o custo de moradia, mais alto na capital, e a busca por menor exposição à violência pesam nessa migração. O avanço do home office também contribui", acrescenta Zuanazzi.
A Região Norte, em plena expansão, tem atraído residentes, principalmente para as cidades-polo. Entre elas, Passo Fundo, Erechim e Santa Rosa. "Essa parte do Estado tem uma renda média mais alta e características que a aproximam de Santa Catarina. Há predominância de pequenas propriedades rurais, com alta intensidade de mão de obra, assim como um maior grau de industrialização", pontua o pesquisador.
Por outro lado, a Região Sul tem perdido população. Além das grandes propriedades, com baixa intensidade de mão de obra, conforme aponta Zuanazzi, a falta de diversificação econômica e a menor oferta de serviços como saúde e educação, fazem com que essa porção do Estado perca habitantes. É, ainda, uma área com geração de empregos abaixo da média gaúcha.
A Região da Serra, por sua vez, tem crescido. Especialmente, nas Hortênsias. Já a porção Central do Estado é a última no ranking de participação de PIB e de número de habitantes, embora três dos seus Coredes tenham crescido sua demografia. Os dados, entretanto, ainda não compilam impactos de migrações do pós-cheias, que apenas serão contabilizados no recenseamento previsto para 2030.