De Rio Grande, especial para o Cidades
A poucos metros da Lagoa dos Patos, no centro histórico de Rio Grande, a Casa Central chega aos 84 anos mantendo viva a tradição de oferecer uma ampla variedade de produtos e serviços à comunidade local. Fundada por Taufik Abdonader em 1942, a loja é considerada uma das mais antigas em funcionamento contínuo na cidade, sendo ponto de referência para diferentes gerações de moradores.
Originalmente voltada para a venda de tecidos e alimentos secos e molhados, como arroz, feijão, açúcar e farinha, a loja acompanhou as mudanças no perfil do consumo e se expandiu ao longo das décadas. Ainda na década de 1970, passou a comercializar ferragens, itens de vestuário, utensílios domésticos, materiais de pesca e produtos para montaria. Hoje, conta com mais de 2 mil itens disponíveis para a clientela.
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“Começou com tecidos, que vendiam muito porque havia costureiras. Não existia roupa pronta como hoje. Depois fomos ampliando, incluindo ferragens, utensílios, roupas de chuva, calçados, botas. Era o que a população precisava”, conta Camille Atallah, genro do fundador e atual responsável pela loja.
Atallah começou a trabalhar na Casa Central em 1965, após casar-se com a filha de Taufik. Quando o sogro faleceu, em 1989, ele assumiu oficialmente a direção do negócio, conforme previsto em contrato social. “Trabalhei com ele desde 1965. Após o falecimento, a loja não foi para baixo, continuei e segui até hoje. A situação mudou, o comércio mudou, mas a gente se mantém”, avalia.
Apesar do avanço da tecnologia e da popularização do comércio eletrônico, a Casa Central continua atraindo clientes pela diversidade de produtos e pela tradição. “Hoje tem muita loja especializada, e o comércio eletrônico cresceu. Mas aqui a gente ainda vende de tudo. Um cliente pode vir buscar um cabo de vassoura, uma botina ou uma panela de pressão, e encontra”, diz.
Atual proprietário da Casa Central, Camille Atallah começou a trabalhar na loja em 1965
Josimara Megiato/Especial/Cidades
O impacto da pandemia de Covid-19, no entanto, foi um dos maiores desafios enfrentados pelo negócio. O fechamento temporário do comércio e a mudança no comportamento dos consumidores afetaram diretamente as vendas. “A pandemia fechou tudo. O povo mudou de hábito, passou a comprar pela internet. A loja regrediu, e não foi só aqui. Outros comerciantes também se queixam. Foi uma mudança difícil”, afirma.
Além disso, a ausência de sucessores diretos na administração do negócio é um fator de preocupação para o futuro da Casa Central. “Os filhos foram para outras áreas, como medicina e advocacia. A família cresceu, mas seguiu outros caminhos. Não há continuidade. A loja está chegando ao fim”, lamenta Atallah.
Mais de dois mil itens estão disponíveis ao público para a venda, incluindo tecidos, ferragens, vestuário e utensílios domésticos
Josimara Megiato/Especial/Cidades
Ainda assim, ele reconhece o papel social e afetivo que a loja desempenhou na cidade e na vida da família. “A loja nos sustentou, construiu as casas da família, ajudou muita gente. É um patrimônio. Hoje, as pessoas dizem: vai lá no Taufik que tem. O nome ficou”, resume.
Com 84 anos de funcionamento e mais de 2 mil itens à disposição, a Casa Central permanece como símbolo da resistência do pequeno comércio local diante de grandes redes e plataformas digitais. Mesmo com os desafios, segue aberta, no mesmo endereço, atendendo quem ainda valoriza o atendimento direto e a memória construída em torno de uma loja que atravessou gerações.
Ponto de apoio financeiro para os pescadores riograndinos
Alimentos e materiais de pesca eram adquiridos a crédito, com pagamento previsto para o final da safra
Josimara Megiato/Especial/CidadesA Casa Central também teve papel importante no apoio à economia local. Durante décadas, especialmente entre os anos 1970 e 1980, financiava pescadores da região, oferecendo alimentos e materiais de pesca a crédito, com pagamento previsto para o final da safra. “A gente cresceu com a pesca. Não tinha banco nem crédito fácil. Ajudávamos com ranchos e equipamentos, e o pagamento vinha depois. Era na base da confiança”, relata.
O prédio da loja também abriga, há muitos anos, o Hotel Taufik, que pertenceu à família e leva o nome do fundador. Hoje, a gestão do hotel é separada, embora ainda compartilhe parte do espaço com a loja.
A localização sempre foi estratégica. Próxima ao antigo porto de desembarque de carvão, lenha e outras mercadorias, a região era movimentada por pescadores e comerciantes. “Tudo chegava pelo mar. Tinha carroça que levava para as casas. Era uma cidade movida a lenha, e aqui era um ponto de descarga. A loja foi crescendo nesse ambiente”, relembra Atallah.
A localização sempre foi estratégica. Próxima ao antigo porto de desembarque de carvão, lenha e outras mercadorias, a região era movimentada por pescadores e comerciantes. “Tudo chegava pelo mar. Tinha carroça que levava para as casas. Era uma cidade movida a lenha, e aqui era um ponto de descarga. A loja foi crescendo nesse ambiente”, relembra Atallah.