Comissão da Câmara marca votação de projeto de lei contra união homoafetiva

Deputado Pastor Eurico (PL) afirma que relações entre pessoas do mesmo sexo não podem se equiparar ao casamento ou entidade familiar

Por Cláudio Isaías

Países que permitem união homoafetiva mais que triplicaram em dez anos
A Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados deve analisar nesta terça-feira (19) o projeto de lei que pretende vetar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. A agenda da comissão prevê a discussão e votação do PL 580/2007, apresentado pelo então ex-deputado federal Clodovil Hernandes (PTC-SP). O texto original do ex-apresentador de televisão permite que pessoas do mesmo sexo possam constituir união homoafetiva por meio de contrato em que disponham sobre suas relações patrimoniais. Também dá ao companheiro ou companheira o direito de sucessão de bens adquiridos durante a vigência da união estável.

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Porém, o relator do projeto de lei, deputado federal Pastor Eurico (PL-PE), rejeitou a proposta de Clodovil. Em substituição, ele propõe que relações entre pessoas do mesmo sexo não possam se equiparar ao casamento ou entidade familiar. Na sua justificativa, o parlamentar afirma que, em maio de 2011, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277, equiparou as relações entre pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres, reconhecendo, assim, a união homoafetiva como um núcleo familiar. "Mais uma vez, a Corte Constitucional brasileira usurpou a competência do Congresso Nacional, exercendo atividade incompatível com suas funções típicas", ressalta. De acordo com Pastor Eurico, a "decisão pautou-se em propósitos ideológicos, o que distorce a vontade do povo brasileiro, que somente se manifesta através de seus representantes regularmente eleitos".
A deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS) destaca que o reconhecimento do casamento civil homoafetivo é um direito adquirido desde 2011 a partir de muita luta. "A tentativa da extrema direita de acabar com esse direito faz parte do pacote de retrocessos que fundamentalistas tentam aplicar no Brasil", explica. Segundo ela, a sociedade seguirá lutando por todas as famílias e para que os direitos civis da comunidade LGBTQIA+ avancem, ao invés de retroceder.
Já Gabriel Galli, Especialista em Direitos Humanos, Gênero e Sexualidade e professor do MBA em Diversidade e Inclusão da Universidade La Salle, afirma que este não é um movimento necessariamente novo. "Os parlamentares conservadores atuam diariamente, por meio dos discursos e dos posicionamentos nas mídias sociais, para contestar as garantias de direitos fundamentais que a população LGBTQIA+ conquistou como resultado de sua luta", destaca.
Segundo Galli, muitas vezes os deputados conservadores agem para colocar o campo progressista na defensiva, se aproveitando de temas caros às vidas dessas pessoas para ganho de poder político e mobilização da sua base. "Este movimento precisa servir de alerta para a mobilização dos movimentos sociais em defesa dos direitos humanos, no sentido de compreender que o que foi conquistado por meio de decisões do STF não está garantido para sempre", ressalta.
Para professor do MBA em Diversidade e Inclusão da Universidade La Salle, a sociedade precisa demonstrar o quão triste e revoltante é ver parlamentares usando tempo e dinheiro público para prejudicar milhares de famílias, que se amam e se acolhem independentemente dos padrões que estão postos. "O tempo dos parlamentares e o dinheiro do povo certamente seriam muito melhor empregados se esses políticos se dedicassem a combater os reais problemas do País e não em atuar apenas para inflamar sua base ideológica".
O diretor do Somos - Comunicação, Saúde e Sexualidade, Guilherme Gomes Ferreira, afirma que o projeto de lei é uma violação dos direitos humanos. "É reflexo de uma agenda conservadora e que infelizmente se reacendeu no governo do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro", recorda. De acordo com Ferreira, o conservadorismo no governo passado tentou acabar com pautas LGBTI + e das comunidades negra e indígena.
Em maio de 2011, o STF, de forma unânime, equiparou as relações entre pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres, reconhecendo, assim, a união homoafetiva como um núcleo familiar. Em 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) obrigou a celebração do casamento entre pessoas do mesmo sexo em todos os cartórios do País.