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Após descriminalização no Uruguai, especialistas brasileiros debatem sobre a eutanásia
Cuidados paliativos são utilizados em todos os hospitais do Rio Grande do Sul
Tema tabu no Brasil, e por vezes objeto de discussões acaloradas por pessoas sem conhecimento técnico, a eutanásia virou notícia com uma decisão inédita na América do Sul: a Câmara dos Deputados do Uruguai aprovou no dia 6 de outubro o projeto de lei que descriminaliza e regulamenta a eutanásia no País. No Brasil, os especialistas ressaltam que deveria haver pelo menos a discussão do tema pela sociedade brasileira. Eles vão mais longe ao afirmar que, além da eutanásia, seria importante que os brasileiros tratassem de assuntos como o aborto e a descriminalização das drogas.
O primeiro secretário do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), André Cecchini, afirmou que a legislação brasileira em todas as suas esferas não permite a eutanásia. "O Código Penal não permite e isso entra no quadro de homicídio. Ao favorecer alguém, pode se estar cometendo crime de homicídio, mesmo que seja com o intuito de abreviar um sofrimento", destacou. Segundo Cecchini, o artigo 122 do Código Penal não permite a assistência ao suicídio - não é permitido que se induza uma pessoa, facilite ou a ajude a cometer o suicídio (a eutanásia é entendida como um suicídio assistido).
O primeiro secretário do Cremers ressalta que o Código de Ética Médica têm diversas resoluções e, entre elas, a mais importante é a 1805/2006, que autoriza a ortotanásia - permitida no Brasil. Segundo Cecchini, a ortotanásia é a morte correta porque se evita a realização de tratamentos exagerados no paciente - que não vão mais mudar o quadro do doente num processo de morte.
"A ortotanásia é aceita no Brasil e é feita dentro de limites rígidos. Tu entendes que naquele momento não tem porque ferir a liberdade e a autonomia do paciente. Não tem porque os profissionais médicos insistirem em um caminho que não tem mais volta", acrescentou. Com relação à eutanásia, Cecchini diz que, pessoalmente, espera que o País um dia discuta o tema eutanásia.
"O Brasil tem muitas dificuldades de discutir certos temas como a eutanásia, o aborto e a descriminalização das drogas talvez pela origem latina dos brasileiros", ressalta. O neurocirurgião afirma que os povos germânicos e do norte da Europa são mais pragmáticos e alguns estados norte-americanos são mais liberais com relação a eutanásia. "Será que é digno depois de uma vida tão boa que tivemos ficar sofrendo em cima de um leito hospitalar (despido ou violado)?", questiona o neurocirurgião.
O primeiro secretário do Cremers afirma que hoje existe uma especialidade na Medicina chamada de Cuidados Paliativos, composta por médicos que se dedicam a tratar os pacientes e não mais a doença com possiblidade de cura ou a remissão da doença. "Todo o médico busca a cura quando trata uma doença ou pelo menos a remissão. Em alguns casos, não teremos a cura e nem a remissão", ressalta.
De acordo com Cecchini, nos Cuidados Paliativos os profissionais começam a tratar as pessoas para aliviar o sofrimento físico que é a dor ou o sofrimento psicológico. "São usadas técnicas médicas reconhecidas com o uso de drogas potentes derivadas da morfina que são usadas com doses bem elevadas para aliviar o sofrimento dos pacientes", acrescenta. Conforme o neurocirurgião, todos os hospitais do Rio Grande do Sul já tem a terapia paliativa que está muito bem evoluída e é muito bem aceita pelos pacientes.
O vice-presidente da Associação Médica do Rio Grande do Sul (Amrigs), Paulo Emílio Skusa Morassutti, ressalta que a eutanásia necessita de um amplo debate na sociedade. "Existem diversos modelos que são favoráveis a eutanásia no Mundo, como o de Seattle e na Costa Norte dos Estados Unidos, onde o paciente é encaminhado a uma junta médica", explica. Segundo Morassutti, o paciente é avaliado em três processos de escolha. Se caso persista o desejo do paciente de eutanásia, ele recebe os medicamentos no prazo de 60 a 90 dias - barbitúricos onde ele mesmo vai ingerir. Segundo o vice-presidente da Amrigs, no Brasil, o assunto tem que ser muito bem discutido. "A eutanásia tem que passar por um amplo debate técnico na sociedade brasileira", informa.
Sobre a decisão uruguaia
A Câmara dos Deputados do Uruguai aprovou no dia 6 o projeto de lei que descriminaliza e regulamenta a eutanásia, após um amplo debate e árduas negociações que seguirão em discussão no Senado uruguaio. O projeto, que mescla propostas do Partido Colorado (centro-direita) e da Frente Ampla (oposição), de esquerda, teve o apoio de deputados de todos os partidos para alcançar 57 votos de um total de 96. A legislação visa "regulamentar e garantir o direito das pessoas de passarem com dignidade pelo processo de morrer, nas circunstâncias que determinar". O pedido de eutanásia será habilitado para pessoas maiores de idade, mentalmente aptas, que sofram de "uma ou mais patologias ou condições de saúde crônicas, incuráveis e irreversíveis que prejudiquem gravemente sua qualidade de vida, causando-lhes sofrimento insuportável". Quem é contra o projeto argumenta que é necessário melhorar os cuidados paliativos em vez de legalizar a eutanásia.