Fundadores relembram trajetória do Grupo Palmares

Por

Na década de 1970, seis universitários negros decidiram rever um importante fato histórico. A proposta era criar uma data comemorativa em confrontação ao 13 de Maio, dia da abolição da escravatura. Para a comunidade afrodescendente, o 20 de Novembro é uma data que representa melhor a história dos negros brasileiros.
Foram esses jovens, fundadores do Grupo Palmares, que ajudaram a instituir o Dia da Consciência Negra. Para resgatar a trajetória do grupo, a reportagem do Jornal do Comércio acompanhou o reencontro de dois dos remanescentes do movimento, o comerciário aposentado Ilmo da Silva e o advogado Antônio Carlos Côrtes.
Os dois relataram ao JC fatos importantes sobre a atuação dos universitários em plena ditadura militar. O grupo, que também era composto por Jorge Antônio dos Santos (Jorge Xangô), Luiz Paulo Assis Santos, Oliveira da Silveira e Vilmar Nunes, se reunia no Centro da Capital. O tema das conversas tinha um propósito: resgatar a identidade da população negra.
A primeira reunião oficial foi realizada no dia 2 de julho de 1971. Foi no segundo encontro, na casa dos pais de Côrtes, que decidiram pelo nome Palmares. Ele explica que os outros integrantes constantemente eram incitados por Jorge Xangô a dizer “não” ao 13 de Maio. “O Jorge e o Luiz Paulo eram os mais indignados e afirmavam que a data não nos elevava culturalmente. Começamos a buscar uma data escolhida pelos negros, e não pelo oficialismo, como era o 13 de Maio”, explica.
Na época, Côrtes, que já era estudante de Direito, dizia que a Lei Áurea era vazia. “O Artigo 1º dizia que ‘fica abolida a escravidão no Brasil’ e o 2º que ‘revoga-se as disposições em contrário’. A justificativa sequer existia, ou seja, excluíram a mão de obra do escravo e o abandonaram”, destaca.
Durante as discussões do grupo, o advogado descobriu o livro O Quilombo dos Palmares, de Edison Carneiro. Após pesquisar esta e outras obras, o movimento se decidiu pelo 20 de Novembro, dia da morte de Zumbi dos Palmares.
Silva explica que começaram a surgir manifestações em todo o País dando apoio à iniciativa. “Tivemos como aliado uma matéria publicada no Jornal do Brasil sobre um grupo de negros em Porto Alegre que contestava o 13 de Maio e era favorável às comemorações no dia 20 de novembro”, acrescenta.
O ex-ativista ressalta que as escolas gaúchas realizavam festejos no dia da abolição e as crianças negras sofriam piadas, o que geralmente acabava em brigas. “Era comum comentários como: ‘vocês foram escravos’! Havia escolas que apresentavam peças de teatro em que as crianças faziam o papel de escravos e prestavam homenagens à princesa Isabel”, conta.
Uma história curiosa é que os universitários foram confundidos com a Vanguarda Armada Revolucionária Popular (VAR-Palmares), que combatia o regime de 1964. O grupo foi até chamado pela Polícia Federal para depor. “Nos ouviram e perceberam que não havia ligação com o grupo político”, ressalta.
O Grupo Palmares encerrou as atividades no fim da década de 1970, porque, segundo Silva, o objetivo dos ativistas já havia sido alcançado. Em seguida, a causa foi assumida pelo Movimento Negro Unificado (MNU), que, com base nas pesquisas dos gaúchos, oficializou a data. Em 1978, o escritor paulista Osvaldo de Camargo, em um evento realizado pelo MNU, em Salvador, propôs que 20 de novembro fosse o Dia da Consciência Negra.