Extinção do Exame da OAB seria retrocesso

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Formado em Direito há 25 anos pela Pucrs e presidente da OAB/RS desde 2006, Claudio Lamachia trabalhou na advocacia pública como advogado concursado do Banco do Brasil e mantém escritório próprio da família. Além disso, acumula os cargos de presidente da Associação Nacional dos Advogados do Banco do Brasil, vice-presidente da Federação Nacional dos Advogados, diretor do Sindicato dos Advogados do Rio Grande do Sul, e presidente do Fórum dos Conselhos de Classe de Profissões Regulamentadas no Rio Grande do Sul. O presidente reafirma, no Dia do Advogado - celebrado hoje -, a importância da instituição para a manutenção do Estado democrático de direito e critica o que chama de “mercantilização dos cursos de Direito”.
Jornal do Comércio - Nos últimos anos, a OAB adotou uma postura política mais forte, atuando como uma frente pelos direitos e pela democracia. Como o senhor avalia essa atitude?
Claudio Lamachia - A OAB é muito mais do que uma entidade de classe, nós temos um compromisso com a fiscalização do exercício profissional, com a defesa intransigente das prerrogativas dos advogados, por isso adotamos uma postura muito mais ampla. Esse é o nosso valor institucional, mas também temos compromissos como a defesa do estado democrático de direito, da constituição federal, dos direitos humanos, das instituições, da justiça social. Por isso, a Ordem se envolve com tantos temas que são caros para a sociedade, para a cidadania, mas o advogado tem esse dever de representar a cidadania, pois ele é o seu representante, através da sua capacidade de posicionamento e postulatória em juízo. O advogado acaba lidando com bens fundamentais da vida como a liberdade, o patrimônio, a dignidade das pessoas, muitas vezes da própria vida do cidadão. Esta é a nossa função.
JC - Recentemente, o MEC cortou 11 mil vagas em cursos de Direito de baixa qualidade. Entretanto, um mês depois autorizou a criação de outras 1.520 vagas. Isso não é uma contradição? Como a OAB se posiciona em relação à criação de novas faculdades de Direito?
Lamachia - Isso é uma contradição total. O MEC continua não assumindo o seu papel de responsabilidade com relação à criação de novos cursos de Direito e, principalmente, de avaliação dos atuais cursos. Isso causa um prejuízo muito grande para as pessoas. Hoje temos uma proliferação absurda de faculdades, que nos últimos dez anos aumentou vertiginosamente. O MEC, ao autorizar a criação de novas faculdades de Direito, muitas vezes como troca de moeda política, acaba trazendo para a sociedade problemas como a não aprovação de milhares de bacharéis que não têm condições de passar no Exame de Ordem. Temos de qualificar cada vez mais o ensino jurídico e é para isso que serve o Exame de Ordem. O que não se pode deixar de comentar é a falta de observação por parte do MEC. A cada novo pedido de instalação de faculdade, o MEC é obrigado a buscar junto à OAB, por força de uma lei (a Lei Federal nº 8.906), a manifestação sobre a criação. A Ordem tem dado o parecer invariavelmente negativo para estes cursos, entretanto, posteriormente o seu funcionamento é autorizado, no fim das contas, pelo MEC. Este é um equivoco que o MEC comete. Eles deveriam ter mais responsabilidade ao autorizar a criação de uma faculdade de Direito e não tratar o parecer de maneira opinativa e sim vinculativa. Por conta disso, temos faculdades absolutamente despreparadas e não comprometidas com a qualidade do ensino, algumas chegando a funcionar dentro de cinemas, de madrugada, sem bibliotecas, em um evidente estágio de mercantilização dos cursos jurídicos.
JC - O Exame de Ordem, nos moldes atuais, é o ideal?
Lamachia - Muitas pessoas criticam o exame, afirmando que ele é uma reserva de mercado para os advogados. Na realidade, a prova não tem essa intenção. Se 100% dos alunos acertarem 50% das questões, que é o numero que deve ser alcançado para passar na prova, os 100% receberão a sua carteira da OAB. Reserva de mercado seria se apenas um número x de candidatos pudessem receber a carteira. Não existe essa limitação. Outros dizem que a ordem prioriza o Exame porque pensa no lucro que obtém com a inscrição. Isso é um grande erro, pois, se a Ordem estivesse preocupada com o lucro, com o aspecto econômico, se abriria mão do exame e receberíamos esses um milhão e meio, dois milhões de bacharéis nos nossos quadros, que passariam a pagar uma anuidade para a OAB, aí sim, engordando os cofres da instituição. O custo da inscrição é integralmente utilizado na elaboração da prova, portanto, ele não traz nenhum lucro. Digo com clareza que estão na contramão da história eventuais projetos que visem a extinguir o Exame de Ordem. Existem hoje inúmeros outros conselhos de classe que estudam a adoção de um exame de proficiência com a intenção de qualificar seus profissionais. Todos queremos profissionais qualificados, não importa a área. Um cidadão não pode contratar um advogado que seja despreparado. Quem ganha com o Exame de Ordem é a sociedade, que pode contar com profissionais qualificados.