Lei garante indenização a vítimas da talidomida

Por

O publicitário Gustavo Diefenthaeler tem 48 anos, é casado e tem quatro filhos. Como funcionário público em Porto Alegre, leva uma vida normal, considerando as dificuldades de quem é portador da chamada síndrome da talidomida, deficiência que atinge braços e pernas de pessoas cujas mães utilizaram o medicamento de mesmo nome, principalmente nas décadas de 1950 e 1960.
Seu tio, o advogado Valquírio Bertoldo, foi pioneiro na defesa das vítimas da talidomida: em quase dez anos de luta, garantiu o direito à pensão vitalícia aos portadores da síndrome, em 1982. "Toda a batalha começou em Porto Alegre", conta Diefenthaeler. Por isso, ele comemora em dobro a publicação, no Diário Oficial da União desta quinta-feira, da lei que concede indenização por dano moral às pessoas com deficiência física decorrente do uso da talidomida. "Para nós é uma satisfação dupla. Pela conquista financeira e pelo reconhecimento do direito que conquistamos", afirma Diefenthaeler. A lei estabelece indenização por danos morais às vítimas no valor de R$ 50 mil, multiplicado pelos pontos de uma classificação quanto à natureza e ao grau da deformidade de cada pessoa.
Segundo Claudia Maximino, presidente da Associação Brasileira das Pessoas com Síndrome da Talidomida (ABPST), existem aproximadamente 650 pessoas em todo o Brasil que seriam beneficiadas pela decisão, reconhecidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) como portadoras de deficiência em decorrência da talidomida. "A indenização por danos morais se deve a todo o sofrimento daqueles que não conseguiram estudar, trabalhar e deixaram de ter uma família", afirma.
Desenvolvida na Alemanha, a talidomida começou a ser comercializada no Brasil em 1957, sendo retirada de circulação em 1965. O medicamento era receitado a gestantes como calmante e para evitar enjoos. Seu uso gerou milhares de casos de focomelia, síndrome caracterizada pelo encurtamento dos membros inferiores e superiores junto ao tronco do feto, além de deficiências auditiva e visual.
Em 1982, o governo brasileiro passou a pagar pensão vitalícia aos portadores, atualmente em R$ 510,00 mensais. Já em 1997 foi regulamentado o uso de produtos à base de talidomida, aplicados no tratamento de complicações de doenças como Aids, lúpus, mieloma múltiplo e hanseníase. A utilização para mulheres em idade fértil é proibida e, em casos especiais, médico e paciente precisam assinar termo de esclarecimento e responsabilidade.
"O uso é bastante controlado, mas mesmo assim ainda há casos de pessoas nascendo com deficiência", explica a professora do Departamento de Genética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Lavínia Faccini. A venda da talidomida é restrita, mas ainda ocorrem casos de mau uso da medicação: os três últimos foram registrados pela pesquisadora entre 2005 e 2006.
Para Maximino, a indenização chega num momento importante, já que a maioria dos portadores está na faixa dos 50 anos e não pôde conquistar a independência, em razão das dificuldades para realizar atividades e se locomover. Ele, que se considera uma "exceção", passou por 18 cirurgias de reparação. "Eu atingi minha mobilidade graças à possibilidade que minha família teve de me ajudar. Mas tem bastante gente com dificuldades muito grandes", destaca.