Isadora Jacoby

Há 42 anos, o casarão que ocupa a esquina da Ovaldo Aranha com a João Telles é bastião da cultura porto-alegrense

Desde 1980, bar Ocidente é palco para a cultura de Porto Alegre

Isadora Jacoby

Há 42 anos, o casarão que ocupa a esquina da Ovaldo Aranha com a João Telles é bastião da cultura porto-alegrense

O casarão na esquina da Osvaldo Aranha com a João Telles abriga um dos negócios mais clássicos de Porto Alegre. Clássico porque não há como chamar o Bar Ocidente de um ponto tradicional da cidade. Desde 1980, o espaço é palco para a cultura porto-alegrense e é tudo, menos tradicional. "Isso está na origem do Ocidente, na liberalidade dos costumes. É a característica básica que sobrou da nossa história toda. Não temos preconceitos para costumes. Se não são ilegais, são permitidos. As pessoas estranham porque eu digo: não dancem nas cadeiras, elas são frágeis, dancem nas mesas que são fortes", diverte-se Fiapo Barth, que está à frente do negócio há 42 anos. 
O casarão na esquina da Osvaldo Aranha com a João Telles abriga um dos negócios mais clássicos de Porto Alegre. Clássico porque não há como chamar o Bar Ocidente de um ponto tradicional da cidade. Desde 1980, o espaço é palco para a cultura porto-alegrense e é tudo, menos tradicional. "Isso está na origem do Ocidente, na liberalidade dos costumes. É a característica básica que sobrou da nossa história toda. Não temos preconceitos para costumes. Se não são ilegais, são permitidos. As pessoas estranham porque eu digo: não dancem nas cadeiras, elas são frágeis, dancem nas mesas que são fortes", diverte-se Fiapo Barth, que está à frente do negócio há 42 anos. 
Fiapo lembra que o Ocidente teve início pela inquietação que ele e seu grupo de amigos tinham em relação à noite de Porto Alegre. "Era um grupo de amigos que trabalhava com teatro e gostava muito da vida noturna. Nós nos encontrávamos nos bares do Bom Fim, e achávamos que os bares tinham umas mesmices. Não sabia quando as coisas tinham acontecido, porque as noites eram sempre iguais", rememora sobre a época que foi o estopim para a criação do negócio, que já surgiu para ser no Bom Fim. "Olhamos vários lugares, muitos não nos aceitaram, um grupo de jovens cabeludos. Eu e minha sócia mais atuante passamos de ônibus e vimos que essa casa estava para alugar. Era uma ruína no andar de cima. Quando entrei aqui, vi que esse espaço, tirando os restos de parede, era uma sala toda de janelas maravilhosas de frente para o parque. E aqui estamos", conta Fiapo.
O grupo, lembra, só tinha a experiência de frequentar bares, mas não de gerir um. "Decidimos que íamos abrir uma casa noturna, onde o balcão sustentasse um palco", define Fiapo. O espaço abriu as portas em dezembro de 1980 e, para a surpresa do grupo, o público de pronto abraçou a ideia. "Abrimos numa segunda-feira para, até o fim de semana, sabermos pelo menos se mexer aqui dentro. Abrimos às 19h e às 19h30min já não cabia mais uma pessoa aqui dentro", conta. 
De lá para cá, o Ocidente passou por diversas mudanças, tanto físicas quanto em sua estrutura de negócio. Do grupo original, pouco a pouco, os amigos foram saindo para se dedicar a outras carreiras. O primeiro garçom e o primeiro cozinheiro tonaram-se sócios de Fiapo até cerca de 10 anos atrás, quando o empreendedor passou a tocar sozinho o negócio.
LUIZA PRADO/JC
O espaço foi palco de diversos shows e recebeu muitas visitas ilustres ao longo dos anos. A presença de Caetano Veloso, revela Fiapo, foi um dos momentos mais marcantes da história do Ocidente. "Nunca imaginei também que, lá nos anos 1980, o Cazuza ia aparecer aqui. Mas também era normal que eles aparecessem. Camisa de Vênus, o pessoal do Legião Urbana. Sempre que as bandas vinham para Porto Alegre, alguém trazia aqui, porque era só o que tinha de irreverente na cidade", diz Fiapo, que ainda enxerga o Ocidente como esse espaço em que a liberdade prevalecesse. "Acredito que a gente continue sendo a única coisa irreverente da cidade. As pessoas levam as coisas com muita seriedade, e a gente se diverte. Nenhum de nós conseguiria sair daqui e trabalhar em um lugar convencional. Tu ficas fascinado por juntar as pessoas, ver os filhos que já estão vindo, já estamos quase nos netos. É bacana, porque continua sendo uma diversão, não é uma coisa tradicional. Fomos mudando dentro do possível", percebe. 
A casa, que inicialmente recebia clientes só na sala de cima, foi ampliada com aluguel de todo o prédio. Agora, os cerca de 800 m² recebem clientes tanto para o almoço, com cardápio vegetariano desde o início de sua operação, quanto para as festas e saraus que acontecem à noite. Em breve, a loja que fica na parte debaixo do casarão receberá uma novidade: uma espécie de loja de conveniências para atender os clientes durante a noite. "O Bom Fim carece, depois da meia-noite, de um lugar que tu possas comprar um sanduíche, tomar um café, comprar um cigarro. É um apoio à casa para o momento que as pessoas saírem daqui de madrugada. A ideia é ficar aberto até às 6h nas sextas e sábados", revela Fiapo, que diz estar sem pressa para colocar a novidade na rua.
Com uma história que se confunde com a do bairro, o Ocidente e o seu ponto foram palco de diversas mudanças do Bom Fim ao longo dos últimos 40 anos. Fiapo pondera que o bairro, por um lado, é muito parecido com a região que ele colocou um negócio nos anos 1980. Para ele, a principal diferença está no movimento na rua, que, hoje, é mais bem visto pelos moradores. "Hoje, é maravilhosa a nossa relação com o bairro. O Ocidente tem respeito. No começo, a dificuldade foi ter atraído aquela multidão para a esquina, assustou muito as pessoas. Na época, as pessoas não se reuniam na rua em Porto Alegre", lembra Fiapo. Por volta de 1996, a relação conflituosa com a vizinhança levou ao fechamento da operação noturna do Ocidente por dois anos. O período, acredita o empreendedor, foi fundamental para que a comunidade entendesse a importância do negócio para a região. "A esquina virou um ponto de tráfico, não tinham mais táxis na esquina, não tinha ninguém aqui. Todos os moradores que se queixavam do nosso movimento viram que era muito mais seguro e feliz um bairro com pessoas na rua", destaca.
Mantendo sua clientela fiel e atraindo novas pessoas ano após ano, o Ocidente celebra uma relação estreita com o público. Fiapo diz que as maiores críticas ao negócio partem dele mesmo. "É sempre bom ver o carinho que as pessoas têm pela casa. As críticas negativas que tenho da casa são as que eu mesmo faço. Como, por exemplo, com todo movimento que a gente teve procurando ser cultural, não termos alcançado a cultura negra. Temos uma falha gigante em relação a isso", pondera.
Para o próximo ano, o objetivo do negócio é, além da abertura do espaço na parte de baixo, celebrar os 150 anos da casa em que está alocado. Comprar o imóvel, aliás, revela Fiapo, é a grande meta do negócio. Apesar dos planos para o futuro, é preciso olhar para a trajetória trilhada até aqui. Comemorar 42 anos de funcionamento, com uma constante renovação de público, é um marco para poucos negócios. Para Fiapo, o segredo está na identificação. "Tem que ter um amor pela coisa que tu fizeste. Eu fiz e não vou deixar desmanchar, não vou sair pela porta dos fundos. No momento que começa a ter funcionários durante muito tempo, tem uma responsabilidade muito grande. Não dá para dizer assim: não quero mais", afirma. 
 
Isadora Jacoby

Isadora Jacoby - editora do GeraçãoE

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