Cristine Pires, Giovanna Sommariva, Isadora Jacoby
A vida pós-pandemia tem sido um momento de renovação para diversos setores. Só agora, quase três anos depois do mundo ter parado em decorrência da Covid-19, negócios voltam a se reerguer e registrar números positivos. Esse é o caso do Botequim da Alcides, espaço comandado por Cleber Gonçalves, 61 anos, que, no início do ano passado, passou mais de um mês internado no hospital por complicações do vírus. Durante esse período, as portas do boteco tiveram de ser fechadas, e o empreendedor tinha certeza de que era o fim do negócio. No entanto, graças ao apoio dos seus clientes, que ajudaram criando campanhas para manter o negócio vivo, o boteco está de casa nova. Agora, localizado na rua Coronel Paulino Teixeira, nº 423, no bairro Rio Branco.
Fotógrafo por formação, Cleber sentiu que, com a popularização da câmera digital, seu trabalho foi, aos poucos, sendo desvalorizado. Filho do dono de um restaurante, lembrou de algo que seu pai sempre falava: "de comer, ninguém deixa". E foi pensando nisso que decidiu investir no ramo. Em dezembro de 2008, abriu o Botequim da Alcides, que, na época, acomodava cerca de 16 pessoas.
O nome do bar refere-se a rua Doutor Alcides Cruz, onde o negócio começou. Apesar de estar, há pouco mais de um mês, operando em novo endereço do mesmo bairro, o empreendedor afirma que mudar o nome nunca foi uma opção. "O Botequim da Alcides se tornou uma marca, muitas pessoas, inclusive, me chamam de 'seu Alcides', e eu sempre atendo. É um legado que construí durante todos esses anos", explica. Ainda que há pouco tempo no novo espaço, Cleber conta estar vivendo uma dificuldade. "Agora, temos espaço para acomodar 40 pessoas, mas tem dias que não damos conta, é muita gente. É um problema, mas um problema bom", brinca o empreendedor, que está trabalhando em uma alternativa para poder receber mais pessoas.
Como gestor, ele garante que o negócio busca acolher diferentes tipos de público. "Somos um bar eclético, recebemos famílias com crianças, casais de todos os tipos, seja mulher com mulher ou homem com homem. Aqui entra o preto, pardo, branco, amarelo, todo mundo, desde que exista respeito com a pessoa sentada ao teu lado", declara.
Com pratos entre R$ 20 e R$ 40, o fundador ressalta que manter um preço justo, aliado a qualidade dos insumos, é uma das grandes preocupações do espaço. "Não é barato e nem caro, é um preço justo com a qualidade e bom atendimento que oferecemos", acredita. O empreendedor também é responsável pela maioria das receitas disponíveis no cardápio. "Muitas delas são autorais, desde quando era eu que cozinhava. Algumas são legados de chefs que passaram por aqui, e outras adaptadas", revela.
A nova rotina, segundo Cleber, tem tomado a maior parte do seu dia, mas, ainda assim, segue sendo uma experiência gratificante. "Antes da pandemia, conseguia passar menos tempo aqui, ficar mais com a minha família, mas, agora, tenho passado mais de 16 horas. É cansativo, mas é a minha paixão, e estamos sendo muito bem recebidos", completa.
Para retomar a cultura democrática
Popular e democrático. É assim que o empreendedor Roberto Schroeder define o El Aguante, espaço que abriu com sua companheira, Mariana Vasconcelos, na esquina das ruas Miguel Tostes e Cabral. O negócio pretende retomar a cultura de botequim inspirado em espaços tradicionais do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, além das referências dos bodegones uruguaios e argentinos.
Roberto conta que a trajetória até chegar ao negócio foi longa. Após não ter se encontrado profissionalmente nas áreas que estudou, abriu, com Marina, uma cervejaria artesanal. Com a pandemia, o negócio perdeu espaço. "No meio da cerveja artesanal, tinham umas coisas que estavam me incomodando, como lata de R$ 40,00. Cada vez iam para um limite maior para aumentar o valor do custo. Fui pegando ranço da coisa e resolvi voltar para o básico, para o original, e abrir um espaço com preço acessível, popular, democrático", explica o empreendedor que abriu as portas no início de junho.
Inspirado nos clássicos botequins, o El Aguante conta com diversas janelas, tornando o espaço bastante aberto, além de um balcão e mesas espalhadas pela rua. A arquitetura do casarão de esquina no bairro Rio Branco foi um diferencial na hora de escolher o ponto. "Queríamos essa coisa das janelas bem abertas, para ser um lugar que não precise pedir licença para entrar. Ser de fácil acesso. Nunca gostamos daquela coisa de porta fechada", diz o empreendedor.
Para manter a proposta de ser um espaço acessível, o cardápio é composto por insumos que, comumente, têm menores preços. "Nosso prato mais caro da casa é R$ 12,90, que é o sanduíche de pernil e linguiça acebolada na cachaça. Voltamos para as coisas simples. Usamos moela, rabada. Optamos por usar insumos que são de um custo benefício bom, tanto para a gente quanto para o cliente final", garante Roberto, revelando que a escolha acabou se tornando um atrativo. "No fim das contas, não era o nosso objetivo, mas se tornou um diferencial da casa. Não se encontra em Porto Alegre moela, rabada. A linha de cachaças, que achei que seria uma parte mais decorativa da casa por pensar que o gaúcho não tem tanto costume de tomar, é o que mais está vendendo", completa.
Operando de terça a sexta-feira, das 17h às 23h45min, e aos sábados das 12h às 23h45min, o negócio passou a abrir também no domingo por uma demanda da clientela, hoje composta, acredita Roberto, por moradores do bairro. "A vizinhança estava carente. Decidimos colocar almoço no domingo, por exemplo, por causa deles. Tem um boato de que não vale a pena abrir domingo por aqui, mas lotou", conta. Os almoços são servidos aos fins de semana, com um prato fixo a cada semana, e custam R$ 25,00.
Uma das alegrias neste primeiro mês de operação, revela, tem sido ver a bancada funcionando, com pessoas indo sozinhas até o espaço e criando laços. "Tem muita gente que já está voltando, clientes que estão virando amigos. E é muito legal ver a bancada funcionando. Teve um dia que chegou um mineiro, sentou sozinho, ficamos conversando, e, quando saí para atender na rua, já estava conversando e se tornou amigo do cara que sentou ao lado", comemora Roberto.
Espaço do Menino Deus expande e agrega oficina para ciclistas
Quando abriu o Buteco do Aldo (sim, buteco com u mesmo, para diferenciar dos demais), Alexandre Kohls não fazia ideia que o empreendimento, que leva o nome do seu pai, se tornaria um dos pontos mais tradicionais do bairro Menino Deus. Localizado no coração do bairro, o espaço forma fila que avança por muitos metros da rua Coronel André Belo. À espera para servir o bufê livre, com direito a uma carne e suco à vontade por R$ 13,00, estão todos os tipos de profissionais: de executivos de empresas locais a autônomos das mais diversas atividades.
Mas foram os motoristas e ciclistas de aplicativos de entrega e de mobilidade urbana que garantiram a sobrevivência do negócio durante o período de isolamento. "Tivemos que reinventar nossa forma de trabalhar e essa clientela foi fundamental para manter os negócios", diz Alexandre. Assim que o "novo normal" começou a retornar aos poucos, não só a retomada da agenda do Buteco do Aldo agradou a clientela - com refeições a preços baixos desde o desjejum, onde é possível comer um prensado feito em pão de xis por R$ 8,00 com a máquina de café com consumo liberado -, mas a abertura de mais uma unidade, também localizada no bairro Menino Deus, mas do outro lado da avenida Ipiranga, na rua Gonçalves Dias. O novo espaço recebe shows nas sextas à noite. Entre eles, o músico que faz parte da história do restaurante. Lico Silveira tem um público cativo e um fã clube fiel, que lota o espaço.
Alexandre é o anfitrião e está sempre correndo para ver se os clientes, muitos deles que ele conhece pelo nome, estão bem servidos ou precisam de algo.
O cardápio, além do jantar e do almoço, oferece lanches e petiscos, todos com preços baixos para manter o fluxo de público. Na unidade da Gonçalves Dias, o cliente pode fazer uso do Bike Zero, um espaço criado para que os ciclistas possam resolver qualquer problema gratuitamente. Ali, é possível calibrar os pneus, consertar a câmera e lubrificar a correia. Alexandre também preparou um refeitório para quem não pode pagar pela refeição ter onde esquentar a marmita e sentar para comer com tranquilidade, sem cobrar nada por isso.
Neste mês, Alexandre concluiu a reforma do restaurante da André Belo.
"Estamos investindo no que há de melhor e mais moderno para a comodidade dos clientes", diz, orgulhoso, referindo-se às novas mesas e cadeiras e a reestruturação da cozinha.
Para o futuro, Alexandre projeta a construção do terceiro Buteco do Aldo, que já tem espaço definido na rua João Alfredo, e que deve começar a ganhar forma nos próximos meses.

