Ana Esteves, especial para o JC
Mais uma Expointer se aproxima e, mais uma vez, o cenário econômico não é nada promissor para o produtor gaúcho: endividamento ainda sem solução concreta, juros altíssimos, insegurança no campo pela previsão de um novo ciclo de estiagem e, se não bastassem todos os problemas internos, vem a taxação de produtos do setor primário brasileiro pelos Estados Unidos. Diante desse cenário, a 48ª Expointer abrirá suas portas a partir deste sábado (30), seguindo a tradição de ser a maior feira de agronegócios a céu aberto da América Latina, à espera de, pelo menos, repetir os volumes de público e comercialização de 2024, mesmo diante de um contexto econômico desfavorável.
O presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Gedeão Pereira, acredita que há possibilidade de retração na comercialização, especialmente de máquinas agrícolas na Expointer, em função da dificuldade de tomar crédito, diante do endividamento dos produtores. “Esse cenário vai impactar nos negócios. Já tivemos o exemplo da Expodireto Cotrijal, em março que não anunciou os números de vendas, pois há muita ficção nos números que são anunciados, não conferem com a realidade que é de uma lavoura de arroz que não cobrirá os custos de produção, o produtor está no prejuízo com um arroz a R$ 68,00 e uma lavoura de soja que colheu mal com preço que não é grande coisa”, declara Gedeão. Por outro lado, o setor pecuário tende a apresentar volumes maiores de comercialização nos remates de primavera que iniciam a partir da Expointer.
“A feira é uma grande vitrine e o resultado dela refletirá nos leilões das cabanas, no restante do ano. Esse setor altamente favorável e positivo, diante dos grãos que devem reduzir tamanho da lavoura para não quebrar”, afirma o presidente da Farsul. Sobre o tarifaço, Gedeão afirma que o Brasil está sendo mais prejudicado no setor industrial do que no agronegócio, que “parecia que ia ser muito prejudicado e não foi, especialmente a carne bovina que acabou redirecionada para outros mercados, mesmo antes do tarifaço entrar em vigor”.
A sub-prefeita do Parque de Exposições Assis Brasil, Elisabeth Cirne Lima, diz que a Expointer é um evento que reflete o que está acontecendo no setor agropecuário gaúcho, que passa por um período muito instável. “Tem todas as questões de comércio internacional, que têm sido abaladas por conta de interferências do governo norte-americano de forma muito inusitada, além da crise interna do Estado. Mas acredito que a pujança agrícola do Centro-Oeste e do Norte do País, que não foram acometidos pelas questões climáticas, possa garantir boa comercialização”, afirma. Elisabeth aposta numa repetição de valores de vendas, nesta edição da feira, podendo chegar a R$ 8 bilhões, como ocorreu em 2024. Além disso, a prospecção de novos mercados é uma das prioridades da feira deste ano, movimento que iniciou com o lançamento da mostra em São Paulo e Brasília, considerados os corações comercial e político do País. Os dois eventos trouxeram resultados, com a presença dos embaixadores de Singapura e de Marrocos, países com os quais o Estado não tinha relacionamento. "Se alguns mercados estão sendo fechados ou dificultados, outros estão sendo abertos e a gente está estabelecendo novas parcerias”, acrescentou Elisabeth.
O presidente da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag-RS), Carlos Joel da Silva, acredita que a Expointer terá um perfil diferente, neste ano. “Ao invés de ser uma feira que vai visar negócios, essa vai ser uma feira para mostrar a importância da agricultura e da pecuária do Rio Grande do Sul. Vai ser um local de debate, em busca de soluções para enfrentar o endividamento dos produtores, a questão do Proagro, das crises climáticas que nós estamos vivenciando”, disse. Para o dirigente, a questão do tarifaço também estará em destaque, durante a feira, especialmente envolvendo as cadeias produtivas do tabaco, do mel, da carne e do couro. “Vão haver muitas cobranças para o setor político, pois precisamos de soluções para esses problemas, seja ela através de políticas, de novas tecnologias, de máquinas agrícolas que possam trabalhar essa questão aí ambiental”.
Neste ano, a feira contará com um total de 6.696 animais, aumento de 47,69% no número de inscritos, em função do retorno das aves que, na edição passada ficaram de fora da feira, em função do foco de Newcastle registrado no Estado. São 1.589 animais rústicos, que participam de julgamentos, vendas, leilões ou provas, e 5.107 animais de argola, que vão a julgamento morfológico nesta modalidade. As inscrições de rústicos tiveram um aumento de 18,2% em relação ao ano passado. O comissário-geral da Expointer, Pablo Charão, afirma que houve e um incremento significativo de inscrições de diferentes espécies.
“Tivemos um crescimento de 70% nas inscrições de coelhos, por causa da feira de filhotes. E também se destaca o avanço nas inscrições de rústicos das raças de bovinos de corte Hereford e Braford, que foi 65% superior a 2024. Houve ainda houve um incremento significativo de inscrições de equinos da raça Crioula, chegando a 143%”, complementa. O presidente da Federação Brasileira das Associações de Criadores de Animais de Raça (Febrac), José Arthur Martins, afirma que há muito tempo não se verificava um incremento tão expressivo de inscrições de animais na Expointer, pois mesmo excluindo pássaros e aves que estiveram ausentes no ano passado e que, ao voltarem neste ano, alavancaram o percentual de inscritos, os números seguem elevados.
“São surpreendentes, em relação a 2024, pois, sem aves e pássaros, chegam a 20,93% acima do ano passado, ou seja, continua sendo um número bastante expressivo. Um percentual desses eu não via há muito tempo”.
Martins destacou também o incremento na participação dos animais rústicos. “Isso reflete um sentimento do produtor gaúcho de que não dá para se entregar, tem crise, tem tarifaço, mas o criador segue investindo com a certeza de que o material genético dos animais é bom e esse trabalho precisa ser divulgado”. Martins acrescenta que o propósito dos criadores que trazem seus animais para Esteio se modificou, no decorrer dos anos: antes o foco maior era a comercialização e hoje mais vale uma roseta de grande campeão que funciona como um selo de qualidade. “Ele vai ser marketeado nos leilões de cabana que vão acontecer nesse ciclo de primavera que se abre com a Expointer”, afirma.