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Publicada em 21 de Agosto de 2025 às 07:55

Melhoramento de plantas é base do mercado de sementes

Professor da UFSM Volmir Marchioro tem o trabalho especializado na melhoria de trigo

Professor da UFSM Volmir Marchioro tem o trabalho especializado na melhoria de trigo

Volmir Marchioro/Arquivo pessoal/JC
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Cássio Fonseca
Cássio Fonseca
O pé no barro e o contato com a agropecuária desde a infância são determinantes para trilhar o caminho rural. Seja pela produção ou pesquisa, o trajeto está atrelado às raízes que costumam vir de família. Foi assim com o professor de Agronomia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Volmir Marchioro, filho de pequeno produtor, que ingressou na graduação aos 24 anos e que atua com o melhoramento de plantas.
O pé no barro e o contato com a agropecuária desde a infância são determinantes para trilhar o caminho rural. Seja pela produção ou pesquisa, o trajeto está atrelado às raízes que costumam vir de família. Foi assim com o professor de Agronomia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Volmir Marchioro, filho de pequeno produtor, que ingressou na graduação aos 24 anos e que atua com o melhoramento de plantas.
Ele brinca que seriam necessárias aulas na universidade para dissecar os meandros de sua função. Porém, em suma, explica que trabalha com plantas que se autofecundam — com ênfase no trigo — e precisam de um tratamento especial. “O objetivo é selecionar um indivíduo superior. O melhorista programa um cruzamento entre cultivares diferentes para combinar características desses dois genótipos em um único, gerando uma planta mais tolerante a um estresse, uma doença ou uma adaptação a um ambiente específico”.
O processo de seleção tem como objetivo chegar à homozigose, ou seja, o indivíduo puro. Na sequência, as sementes são fecundadas sob os cuidados perante as leis a serem seguidas para poder proteger e registrar uma cultivar e, por fim, colocar no zoneamento agrícola e indicar ao produtor, detalha Marchioro.
Trata-se de um longo processo. “Para desenvolver uma cultivar de trigo por um processo normal de melhoramento, sem usar técnicas modernas, leva-se de 10 a 12 anos”, completa. Também cabe ao melhorista ser o responsável técnico pela proteção da planta junto ao Serviço Nacional de Proteção de Cultivares do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
Ainda que na juventude não houvesse uma área dos sonhos, e sim o objetivo de concluir a formação e se inserir no mercado, Marchioro fala sobre a função de melhorista com apreço pela trajetória construída. Nichado, apesar do contato com plantas distintas, seu trabalho se distingue pelo trigo e começou no setor privado. Atuou por 13 anos na Coodetec, uma cooperativa central em Cascavel, no Paraná, que já fechou as portas. Foram 25 cultivares de trigo como um dos melhoristas responsáveis, antes do trajeto no Campus Frederico Westphalen da UFSM, onde atua como docente Titular desde dezembro de 2016.
No total, publicou 136 artigos, quatro livros, três capítulos de livro e registrou 42 cultivares, sendo 27 destas protegidas. Em 2025, está sendo agraciado na categoria Cadeias de Produção e Alternativas Agrícolas do prêmio O Futuro da Terra, uma parceria entre a Fapergs e o Jornal do Comércio.
A entrada tardia na universidade está atrelada, justamente, ao trabalho agrícola. O professor explica que, em sua juventude, atuou em uma fazenda que cultivava diversas culturas como trigo, soja e milho, e gostou da área. Durante o percurso, conheceu algumas pessoas que faziam agronomia e resolveu concluir o segundo grau para depois fazer o vestibular e entrar na Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
A vida acadêmica transitou entre graduação, mestrado e doutorado. Pouco antes de concluir a última especialização, recebeu o convite da Coodetec e, a partir deste ponto, deslanchou no mercado. Seu orientador, que trabalhava com aveia branca e abriu o leque para o trigo e triticale, por exemplo, foi o principal responsável pela trilha, relata Marchioro.
“Entrei nessa mesma linha. Como conduzimos vários experimentos durante a iniciação científica, minha tese foi com a aveia branca. E o diretor da empresa de Cascavel estava fazendo doutorado na área de sementes na UFPel, enquanto procurava alguém para trabalhar no melhoramento de trigo. Ele pediu indicação para o Fernando, meu orientador, e eu fui indicado”, lembra. À época, o trabalho de cultivares da empresa representava mais de 20% do mercado brasileiro de sementes, destaca o professor, que também relata uma participação maciça no Paraguai.
Na UFSM, ele entende que o "impacto em termos de produtos não é tão forte, ao menos por enquanto". Por outro lado, a maior influência está na formação de pessoas e novos profissionais, justamente o principal objetivo da universidade, conta.
Próximo de tantos outros caminhos, o professor não relata qualquer arrependimento pela área escolhida. Isso que oportunidades não faltaram: “No melhoramento de plantas, tive a oportunidade de trabalhar com milho, já que fiz meu estágio final na Agronomia e fui convidado duas vezes por essa mesma empresa. Também tive a chance de trabalhar com tabaco, mas nunca quis”. Ele infere que, quando se assume um segmento específico, é difícil atuar em outros campos.
No setor público, no entanto, as dificuldades relacionadas à estrutura são o principal desafio para a comunidade. Investimentos escassos e a dificuldade encontrada pelas empresas para fechar negócios com órgãos públicos complicam os avanços de pesquisa. “É assim que funcionam as prefeituras e o governo. É bastante complexo”, lamenta. No caso do campus Frederico Westphalen, o aporte na construção foi substancioso, mas Marchioro entende que sua área carece de uma atualização.
Ele informa que a UFSM está fechando uma parceria com uma empresa privada. “A ideia é iniciar o desenvolvimento de novas cultivares dentro do campus e depois a empresa fará os processos finais.” E classifica estes vínculos como benéficos e importantes para as universidades.
Por outro lado, relata que “a pesquisa de cultivares está muito na mão das multinacionais, que atuam em massa no Brasil”. “Eu acho ruim, porque não temos nada na mão das empresas públicas, como a Embrapa, por exemplo, que faz muitos trabalhos básicos nessa área e a participação no mercado é muito pequena”, conclui. Questionado, não vê uma perspectiva de mudança do cenário.
Marchioro ainda ressalta uma medida importante. Professores de universidades federais e pesquisadores de instituições públicas podem ser pesquisadores bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), um órgão que fomenta o setor. Ele é bolsista há mais de 10 anos e relata que os valores auxiliam na compra de insumos, apesar da verba não ser significativa.

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