"No fim, tudo se resume a pessoas construindo algo para as pessoas", diz Irio Piva

À frente da CDL POA, Irio Piva liderou as ações da entidade em cenários de dificuldades extremas, como a pandemia por Covid-19 e a enchente histórica do ano passado. Foi preciso garantir a sobrevivência dos negócios sem abandonar pleitos importantes, como a criação de um bloco empresarial para luta contra o aumento de impostos ainda em 2023.


Paralelamente, iniciativas importantes miraram a sobrevida do segmento por outro prisma: o investimento no futuro, na área de capacitação, por meio da Faculdade do Comércio, uma instituição de ensino feita pelo varejo para o varejo. Além disso, a mazela do endividamento da população, situação que impacta diretamente a performance do varejo, ganhou um olhar generoso. A CDL POA criou o Programa de Educação Financeira, que abarca um curso desenvolvido pelo economista Oscar Frank e é oferecido de forma gratuita para a população em geral.


Para Irio Piva, ao melhorar o entendimento da população sobre suas finanças, a entidade colabora com uma sociedade mais economicamente saudável. Ele faz questão de acrescentar, ainda, outro ponto importante da trajetória da CDL POA nos últimos anos: “Valorizo muito a união das entidades empresariais que conquistamos, para fortalecer o setor e a nossa representatividade”. Na entrevista a seguir, ele faz uma balanço da sua gestão e da relevância da CDL POA ao longo de 65 anos.

Irio Piva - Eu recebi uma joia em que todos os desafios em nível de organização - de pessoas certas nos lugares certos - estavam resolvidos. Recebi uma casa completamente organizada e pronta para avançar ainda mais. Assim, acabei colhendo resultados que foram plantados por gestões anteriores, meentregando a CDL POA muito organizada, com um time de excelência e uma estrutura de ponta. Assim, nosso principal foco institucional esteve na ampliação das relações de forma local, estadual, nacional e até internacional. Ampliamos os horizontes da CDL POA, mudando o patamar de relações, com empresas e entidades de diferentes portes ao redor do mundo.




JC - Quais foram os maiores desafios enfrentados pela CDL POA sob sua liderança?

Piva - Comecei minha gestão no início da pandemia. Nessa época, a CDL POA se uniu a entidades setoriais para defender os interesses dos comerciantes e lutar pelo funcionamento do comércio e dar suporte às empresas que foram fortemente impactadas. Durante o período, criamos o Movimento Varejo Solidário, estruturado nos 4 pilares que passaram a nortear nossa atuação a partir daquele momento: defender, conscientizar, orientar e instrumentalizar empresas associadas e entidades parceiras. Para isso, desenvolvemos um site temporário destinado à distribuição de informações, atualização de legislações, cases de inspiração e materiais ricos (ebooks e infográficos) para auxiliar o lojista a atuar mesmo dentro de uma situação adversa com as lojas fechadas. Articulamos com os agentes públicos, fizemos doações, nos empenhamos ao máximo. Foi um desafio bastante importante.


JC - E depois ainda veio a histórica enchente, em 2024.

Piva - Sim, depois da pandemia, nosso outro grande desafio foi a enchente. Criamos uma rede de apoio “Unidos pela Reconstrução”. Atuamos em articulação com o poder público e entidades parceiras. Distribuímos informações relevantes e orientação para os empresários. Promovemos a defesa institucional e a representatividade do setor junto ao poder público.


JC - Que ações até agora podem ser exemplos da busca pelo fortalecimento do varejo gaúcho?

Piva - Uma das nossas principais ações é o fortalecimento e o crescimento da rede de entidades parceiras, o que nos permite levar soluções para todas as regiões do Rio Grande do Sul e potencializá-lo economicamente.


JC - Qualificação de mão de obra é um tema caro na atualidade. Como a CDL POA vem enfrentando e combatendo isso?

Piva - A qualificação de mão de obra é um dos principais desafios do varejo como um todo. Nesse ponto, a CDL POA oferece cursos de graduação e pós-graduação através da Faculdade do Comércio (FAC-RS).


JC - Que ações são exemplos da intenção de estimular tecnologia e inovação? Que avanços a entidade obteve?

Piva - A CDL POA atua com a realização de eventos que abrangem diferentes públicos do setor varejista. Em destaque estão o Pós-NRF, que acontece após a visita à NRF em Nova York, o Moda Pelo RS, que foi criado para auxiliar o setor de moda após as enchentes de 2024, as capacitações periódicas que trazem assuntos práticos para auxiliar empreendedores e o CDL POA Talks, que apresenta diferentes temas atuais de comunicação e negócios.


JC - Quais eram os problemas de concessão de crédito quando você assumiu o compromisso de estimular essa área? E como foram enfrentados?

Piva - O início de minha gestão coincidiu com a chegada da pandemia por Covid-19. Assim, o principal problema foi o fechamento dos negócios, a necessidade de obtenção de crédito e a restrição à concessão de crédito. Este período acabou nos levando para um cenário de digitalização. Esse processo levou a CDL POA para outro mercado: com a quantidade de dados da população recém digitalizada e a captura das informações, se tornou possível conceder crédito de forma mais personalizada, modificando o mercado que existia até então.


JC - Qual é a importância de parcerias e redes de cooperação? Como isso tem se materializado na prática?

Piva - Aproximação com as entidades é um dos pilares da CDL Porto Alegre: é essencial se relacionar com outras entidades para construir soluções para todos. Nos aliamos na pandemia, também durante as enchentes, no período eleitoral, no debate sobre aumento de impostos. Dessa forma conseguimos criar uma frente de entidades que operam conjuntamente, acreditamos muito na união e na força do coletivo. Participamos de vários movimentos, os mais recentes incluem o Plano Diretor de Porto Alegre e a redução de impostos, que impactam diretamente na vida da cidade e do Estado. Tudo com o propósito de contribuir para o desenvolvimento coletivo, para construir um ambiente melhor de negócios e também para viver.


JC - O varejo passa por transformações rápidas, com e-commerce, omnichannel e mudanças no comportamento do consumidor. Como a CDL POA está apoiando os dirigentes lojistas nessa adaptação?

Piva - A CDL POA cria materiais ricos para orientar e ensinar os empresários para aumentar vendas e melhorar estratégias dos seus negócios, promoção de eventos e ações de marketing.


JC - Muitos pequenos lojistas têm dificuldades em implementar soluções digitais. A CDL POA pretende ampliar capacitação e incentivos nesse sentido?

Piva - A CDL POA oferece eventos e capacitações para ensinar e atualizar o empresário gaúcho e agora estamos criando espaços físicos melhores para atender e capacitar ainda mais pessoas.


JC - Qual é o papel da CDL em pautas importantes para o varejo local como a segurança das áreas onde se localizam as lojas, o urbanismo e a revitalização?

Piva - A CDL POA tem participação ativa na reestruturação do Plano Diretor, realizou uma pesquisa sobre o Centro Histórico, adotou a Praça Osvaldo Cruz e realiza a manutenção periódica do espaço, realiza apoio na qualificação da segurança pública, está realizando a revitalização da sede da CDL POA para ajudar a transformar e estimular o melhor cuidado do Centro Histórico.


JC - Quais são as principais metas para o próximo ciclo de gestão da CDL POA?

Piva - Parte da gestão é fazer uma boa sucessão. Vemos que uma gestão foi profícua quando ela consegue fazer uma boa sucessão e esta é uma das grandes preocupações que temos. A CDL POA tem uma vantagem muito grande porque ela tem um Conselho Deliberativo muito atuante, muito qualificado, que interfere de maneira direta na sucessão. A sucessão não é uma definição exclusiva do presidente, mas sim de um conjunto de pessoas que entendem e buscam o que é melhor para a entidade. Com essa definição de sucessão, buscamos dar continuidade ao trabalho ampliando ainda mais as entregas institucionais impactando empresas e pessoas no Estado. Buscamos encontrar novas soluções que entreguem valor para o associado e para as entidades parceiras, pois um dos nossos compromissos é viabilizar e contribuir no desenvolvimento de todo o Rio Grande do Sul.


JC - Ao longo desses anos, o que tornou o ambiente de negócios mais favorável ao comércio em Porto Alegre?

Piva - Nos últimos anos, vejo alguns marcos. A simplificação na emissão de alvarás facilitou a abertura de empresas, isso mudou de maneira significativa nosso ambiente de negócios. Também tivemos uma maior abertura do poder público para dialogar com as entidades. Já a transformação tecnológica mudou o mindset das pessoas para o surgimento de um ambiente de negócios ainda mais favorável, o que refletiu na criação do Instituto Caldeira, do qual somos signatários, e na vinda do South Summit para Porto Alegre. Tudo isso contribuiu para o desenvolvimento e a retenção de talentos no Estado.


JC - Como fundador e CEO do Grupo Elevato, você já teria um universo de responsabilidades significativo. O que fez com que acabasse se aproximando da CDL no sentido de ir para cargos diretivos? O que o motivou?


Piva - Cada pessoa pode dar sua contribuição para a sociedade de alguma maneira. Eu entendi que o meu jeito de somar é através do setor para o qual dediquei toda a minha vida. Por meio de entidades empresariais que têm relação com o varejo, venho contribuindo voluntariamente há décadas junto à ACOMAC, à ANAMACO, à Casa VIP e, atualmente, para a CDL POA. Assim, eu já convivia com a atividade associativa. É a minha maneira de devolver para sociedade um pouco aquilo que recebi.


JC - Do seu primeiro contato com a entidade, antes dos cargos diretivos, para agora, o que considera o mais emblemático na transformação da CDL POA a fim de acompanhar as mudanças do comércio ao longo dessas décadas?

Piva - A CDL POA superou minhas expectativas. Quando cheguei, percebi uma entidade muito maior, muito profissionalizada. É uma entidade de ponta, sempre atualizada com o que é mais moderno, desde sua participação em eventos internacionais para, trazer conhecimento daquilo que é tendência, até a busca por conhecimento em nível de gestão para compartilharmos com nosso associado e nosso time. A CDL POA está sempre defendendo, instrumentalizando o empresário em prol do varejo. Por isso, estamos presentes nos principais eventos e polos de inovação e tecnologia, sempre buscando tendências mundiais para o varejo local.


JC - O que aprendeu na liderança de uma entidade de classe?

Piva - Em todos estes anos trabalhando com entidades, é preciso destacar o aprendizado na capacidade de mobilização das pessoas, o compromisso com a austeridade e a responsabilidade de gerir o que não é nosso. É essencial entender que tudo deve ser tratado com ainda mais responsabilidade e zelo. Mas é uma felicidade ter encontrado pessoas diferenciadas que me ajudaram a crescer, porque a gente cresce com a convivência extremamente saudável com pessoas que são totalmente diferenciadas e qualificadas, que acabam por me estimular a crescer todo dia.


JC - Na sua opinião, quais são as tendências que vão definir o futuro do varejo em Porto Alegre e no Brasil?

Piva - O empresário deve abraçar a digitalização de seu negócio sem medo, embarcar a Inteligência Artificial para resolver questões operacionais, facilitando seu dia a dia, e se adaptar à exigência do consumidor em hiper personalização para vender mais. Também é preciso se adaptar às questões atuais de crédito, para fazer negócios com mais segurança. Também é preciso se preocupar com a comunidade em que se vive, adaptando-se às questões de propósito e valor de marca, além de apenas vender produtos e serviços. É preciso observar a mudança no aspecto comportamental, pois, no fim, tudo se resume a pessoas construindo algo para as pessoas. Vejo um caminho em direção à influência dos dados aliada às políticas de ESG.


JC - Que mensagem gostaria de deixar para os lojistas que fazem parte da história da CDL POA nesses 65 anos?

Piva - Precisamos reconhecer o passado, valorizar o presente e construir o futuro. O passado é a matéria-prima que recebemos, que nos dá possibilidade de construir resultados excelentes e prepará-la para o futuro. É importante fazer um agradecimento às pessoas que construíram a entidade e a trouxeram até aqui e possibilitaram que desenvolvêssemos o trabalho. Foram eles que nos deram condições de projetar um futuro ainda melhor, garantindo que os próximos anos sejam tão bons quanto os que tivemos.