Banco Central mantém Selic em 13,75% ao ano e interrompe ciclo de alta de juros

Foram 12 altas consecutivas neste processo de aperto monetário, com um aumento acumulado de 11,75 pontos porcentuais

Por Agência Estado

Ritmo de cortes da taxa Selic deve se manter em 0,50 ponto porcentual
Mesmo com as expectativas de inflação ainda num patamar alto, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manteve a taxa Selic em 13,75% ao ano, encerrando o mais longo ciclo de alta de juros de sua história.

A taxa, ainda assim, é a maior desde janeiro de 2017. Foram 12 altas consecutivas neste processo de aperto monetário, com um aumento acumulado de 11,75 pontos porcentuais, o maior choque de juros desde 1999. O ciclo foi iniciado em março de 2021, quando os juros básicos estavam na mínima histórica de 2% ao ano.

O aumento de juros é considerado uma medida impopular. A última vez que ocorreu um aumento da Selic durante a campanha ao Palácio do Planalto foi em 2002, ano da primeira vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O então candidato do governo, José Serra (PSDB), perdeu aquela eleição.

A decisão do Copom não foi unânime. Segundo o comunicado divulgado pelo Banco Central, sete dos nove membros do comitê votaram pela manutenção de 13,75% - os outros dois votaram por uma "elevação residual" de 0,25 ponto percentual, o que jogaria a Selic para 14%.

O colegiado ainda deixou a porta aberta para voltar a subir a taxa. "O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado", diz o comunicado.

Mesmo com a estabilidade da taxa Selic, o Brasil continua a ter a maior taxa de juro real (descontada a inflação) do mundo, em uma lista com 40 economias. Cálculos do site MoneYou e da Infinity Asset Management indicam que o juro real brasileiro está agora em 8,22% ao ano. Em segundo lugar na lista que considera economias mais relevantes, aparece o México (5,13%), seguido da Colômbia (3,86%). A média dos 40 países avaliados é de -1,69%.

O aumento do juro básico da economia reflete em taxas bancárias mais elevadas, embora haja uma defasagem de seis a nove meses entre a decisão do BC e o encarecimento do crédito. A elevação da taxa de juros também influencia negativamente o consumo da população e os investimentos produtivos. Por outro lado, aplicações em renda fixa, como no Tesouro Direto e em debêntures (títulos de empresas), passam a render mais.

Combate à inflação

O Banco Central se baseia no sistema de metas de inflação para calibrar os juros básicos. Quando a inflação está alta, o BC eleva a Selic. Quando as estimativas para a inflação estão em linha com as metas, o BC a reduz. A disparada dos preços esteve intimamente ligada à disparada da inflação em 2021 e 2022.

Para 2022, a meta central de inflação é de 3,5% e será oficialmente cumprida se o índice oscilar de 2% a 5%. Para 2023, a meta de inflação foi fixada 3,25%, e será considerada formalmente cumprida se oscilar entre 1,75% e 4,75%. As estimativas de inflação para este e o próximo ano continuam muito acima do teto da meta, mesmo com a desaceleração dos preços. O BC já indicou que só prevê voltar à meta em 2024.

A decisão desta quarta-feira, 21, era esperada pela maior parte do mercado financeiro. De 50 instituições financeiras consultadas pelo serviço Projeções Broadcast, 41 esperavam estabilidade, enquanto 9 previam avanço de 0,25 ponto porcentual, para 14%.

No encontro de agosto, o BC indicou que o plano de voo era manutenção dos juros em patamar significativamente contracionista após o aumento da Selic naquela reunião, mas que iria avaliar a necessidade de um ajuste residual, de 0,25 ponto porcentual este mês.

Críticas de Paulo Guedes

Na segunda-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o BC errou as projeções econômicas por não perceber uma "mudança no eixo". "O BC também errou projeções, mas com erro técnico, de pessoal mais sofisticado. O BC errou por não perceber que mudamos o eixo da economia. O BC errou ao falar o tempo todo em risco fiscal, desajuste fiscal, quando íamos para superávit. O BC estava preocupado com o fiscal e eu com o juro negativo", disse.

No cenário internacional, o Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, aumentou nesta quarta-feira as taxas de juros do país para uma faixa de 3% a 3,25% - uma alta de 0,75 ponto percentual. É a quinta elevação neste ano, levando a taxa básica de juros dos EUA ao seu maior patamar desde 2008, pouco antes de o país passar por sua maior crise desde a quebra das bolsas em 1929.

A repercussão entre setores

"O cenário mais favorável no médio prazo no âmbito doméstico, somado a um ambiente externo que sinaliza aumento generalizado nos juros e consequente redução da atividade econômica, o qual deve ajudar a descomprimir cadeias e preços de matérias-primas, forma o cenário base para o Copom anunciar o encerramento do ciclo de alta da Selic."

Presidente da Fiergs, Gilberto Petry.


"A Selic em 13,75% ao ano já era suficiente para manter a desaceleração da inflação nos próximos meses. Principalmente porque essa taxa está muito acima do nível de taxa de juros a partir do qual se inibe a atividade econômica, que foi alcançado ainda em dezembro de 2021."

Presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade.

"Entendemos que o Banco Central perdeu uma ótima oportunidade que poderia funcionar como um estímulo para a criação de empregos, a produção e o consumo. Tivemos desnecessárias altas e seguidas dos juros, que seguem em patamares estratosféricos. Vale ressaltar que juros altos seguem na contramão da produção, do crédito, do consumo e da geração de empregos", disse na rede social.

Miguel Torres, presidente da Força Sindical


A decisão pela manutenção ocorre num cenário em que a inflação vem cedendo e os indícios de uma recessão mundial ficam cada vez mais evidentes. Entretanto, os núcleos permanecem pressionados, com a atividade interna robusta, e as expectativas de inflação para 2023 e 2024 ainda desancoradas. Nessa conjuntura é esperado que a taxa de juros real permaneça no campo contracionista por um longo período, tornando a tomada de crédito e as dívidas indexadas a Selic mais caras, pressionando o orçamento de famílias e empresas."

Presidente da Fecomércio-RS, Luiz Carlos Bohn.