Dilma é reeleita com 54 milhões de votos

Por

Na eleição presidencial mais disputada da história da redemocratização do País, a presidente Dilma Rousseff (PT) venceu o senador Aécio Neves (PSDB) por uma margem de apenas 3 pontos percentuais dos votos válidos.
Primeira mulher a assumir a presidência da República, a petista obteve a reeleição com mais de 54 milhões de votos, contra 51 milhões do tucano. Com isso, o PT completará 16 anos no Palácio Planalto. Nenhuma outra força política do País alcançou essa marca desde a volta da democracia. Esta foi a sexta eleição presidencial em que petistas e tucanos se enfrentaram pela liderança, e a quarta em que o PT venceu.
Depois de ser sido a escolhida do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2010, para ser a sucessora, Dilma disputou sua segunda eleição, agora com quatro anos no comando do País. E dessa vez a vitória foi mais apertada do que em 2010, quando bateu José Serra (PSDB) com mais de 56% dos votos.
Dilma rejeitou a ideia de que o País saiu dividido desta eleição por causa da agressividade da campanha e da pequena diferença de votos entre os candidatos. “Esta presidenta está disposta ao diálogo e este é o meu primeiro compromisso”, afirmou em seu discurso após a confirmação de sua vitória.
A reeleição de Dilma representa um triunfo de ordem pessoal e de natureza política. Criticada por ministros do seu governo e dirigentes do próprio partido, o PT, a presidente venceu apesar do desempenho ruim na economia e ao final de uma campanha marcada pelo desejo de mudança da maioria do eleitorado.
O maior desafio da presidente reeleita será recuperar a credibilidade de sua política econômica e reconquistar a confiança dos investidores. Outro será recuperar o apoio de partidos que a apoiavam no Congresso Nacional e se afastaram do governo durante a campanha.
A disputa presidencial mais acirrada desde o segundo turno das eleições de 1989 foi também a terceira vez seguida que os brasileiros reelegeram seu presidente – antes de Dilma, Lula e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) haviam sido reeleitos.
Em Minas Gerais, terra de Aécio e da petista, ela obteve vantagem de 550 mil votos, tendo 52,4% dos sufrágios. Em compensação, no Rio Grande do Sul, estado onde Dilma fez sua vida política, o tucano abriu 450 mil votos sobre a petista, atingindo 53,5%.
O segundo turno também foi marcado pelas pesquisas eleitorais, que apontavam Dilma atrás de Aécio até a segunda-feira passada. No primeiro turno, a presidente teve ampla vantagem — quase 43,268 milhões de votos (41,6% dos válidos) contra 34,897 milhões de Aécio (33,5%).
A taxa de aprovação de Dilma ao final de seu primeiro mandato é inferior aos 52% que Lula tinha em 2006, mas superior ao índice de Fernando Henrique em 1998, quando o tucano foi reeleito à presidência da República.
Dilma também fica no meio dos dois ex-presidentes entre aqueles que demonstraram maior desaprovação aos respectivos governos. Lula terminou seu primeiro mandato com rejeição de só 14%, contra 25% que diziam ser o governo FHC ruim ou péssimo.
Lula terminou seu segundo mandato, em 2010, com a melhor avaliação da história e conseguiu fazer sua sucessora. Em 2010, 83% dos eleitores consideravam sua gestão ótima ou boa.
Após a gestão Lula, 84% dos brasileiros achavam que o País estava melhor do que antes. Naquele ano, a rejeição ao governo do petista atingia só 4% dos eleitores, e 13% o avaliavam como regular.
Com Fernando Henrique ocorreu o oposto. Ele encerrou seus oito anos na presidência, em 2002, com aprovação de só 26%, índice inferior ao do primeiro mandato, embora 35% dissessem, em 2002, que o Brasil estava melhor do que oito anos antes.
A rejeição ao tucano, na ocasião, alcançava 36% dos brasileiros, e ele não conseguiu fazer seu sucessor. Mesmo assim, FHC saiu do governo em melhor situação do que José Sarney (1985-1990) e Fernando Collor de Mello (1990-1992), que deixou o Planalto após o impeachment com apenas 9% de aprovação.
Itamar Franco, com 41%, também finalizou seu período na presidência (1992-1994) melhor que FHC, que foi seu ministro da Fazenda na implantação do Plano Real e eleito na sequência. O mineiro, no entanto, não havia sido eleito presidente, já que assumiu após Collor deixar o cargo.

Dilma Rousseff pede união em favor do País

No primeiro pronunciamento após a vitória que garantiu a sua reeleição, a presidente Dilma Rousseff (PT) fez um apelo à união e ao entendimento, afirmando não acreditar que o País esteja dividido em função da vantagem de apenas 3 pontos percentuais que obteve no segundo turno. Dilma assumiu como primeiro compromisso o diálogo com a oposição.
“Conclamo brasileiros e brasileiras a nos unirmos em favor do futuro da pátria, do País e do nosso povo. Não acredito que essas eleições tenham dividido o País ao meio. Entendo, sim, que mobilizaram ideias e emoções às vezes contraditórias, mas movidas pela busca de um sentimento comum: um futuro melhor para o País. Em lugar de ampliar divergências e criar um fosso, tenho forte esperança de que a energia mobilizadora tenha preparado um bom terreno para construção de pontes.”
Além dos ataques ostensivos entre Dilma e Aécio Neves (PSDB), a disputa também foi marcada pela guerra subterrânea e apócrifa nas redes sociais. A petista, agora, quer juntar os cacos. “O calor da disputa deve ser transformado agora em energia construtiva de um novo momento para o País. Com a força deste sentimento mobilizador, é possível encontrar pontos em comum e construir uma boa base de entendimento para fazer o País avançar. Algumas vezes, na história, resultados apertados produziram resultados mais fortes e mais rápidos do que vitórias muito amplas. É essa a nossa esperança.”
Confirmado o resultado, Dilma iniciou o discurso da vitória citando o ex-presidente Lula (PT), que estava a seu lado e participou ativamente da campanha petista no segundo turno. Porém, ao contrário de 2010, quando Lula a escolheu para disputar a sucessão e praticamente assumiu o comando da campanha, Dilma desta vez chamou para si o enfrentamento dos adversários. Ela quer provar que o “poste”, como era chamada há quatro anos, tem agora luz própria.
Dilma venceu em 15 estados, principalmente no Norte e Nordeste, enquanto Aécio bateu a petista em 12, concentrados no Sul e Centro-Oeste. O Sudeste rachou. São Paulo e Espírito Santo deram vitória ao tucano, enquanto Minas e Rio de Janeiro optaram pela petista. A maior diferença entre os dois foi registrada no Maranhão: 78,75% para Dilma e 21,25% para Aécio.
Para governar, Dilma terá de negociar com um Congresso Nacional que terá no senador Aécio Neves a principal referência da oposição. Na Câmara dos Deputados, tomarão assento 28 partidos, a maior parcela constituída de siglas médias e pequenas. PT e PMDB continuam com as maiores bancadas no Congresso, mas perderam algumas cadeiras. Em pauta, projetos importantes como a reforma política, apontada pela candidata vitoriosa como prioridade.
Nos estados, Dilma contará, em seu segundo mandato, com o apoio da maioria dos governadores eleitos: ao menos 14 dos 27 chefes de Executivo estaduais defenderam a reeleição da petista.

‘Campanha teve momentos lamentáveis’

Patrícia Comunello
Nas últimas horas de uma campanha histórica, a ainda candidata à reeleição, Dilma Rousseff (PT), mostrou pressa, antes de participar do café da manhã e votar em Porto Alegre. “Chegou o dia, então vai ser rapidinho”, avisou Dilma aos repórteres que se aglomeravam em um brete à frente do salão do Hotel Plaza São Rafael, onde ocorreria logo depois o café da manhã com apoiadores.
E foi. Por exatos 3min58seg, a presidente, que buscava o segundo mandato, apresentava voz rouca e fisionomia cansada, mas revelou tranquilidade e precisão para colocar as frases de forma pausada ao se pronunciar.
Na única pergunta que respondeu, Dilma afirmou que a campanha de 2014 teve momentos lamentáveis e apontou que foram “usadas formas de tratamento indevidas”, sem se referir a episódio específico. Mesmo assim, ela esperava rejeição dos eleitores às investidas.
“Acho que a população não endossou”, apostou a presidente, que no ato seguinte se reuniria com apoiadores, no Hotel Plaza São Rafael, preferindo beliscar algumas frutas. Depois e 10 minutos, ela seguiu à Escola Estadual Santos Dumont, na zona Sul, onde votou, acompanhada pelo governador e candidato à reeleição, Tarso Genro (PT).
Apesar de admitir que a campanha teve situações em que o “nível não foi tão alto”, a presidente frisou que o período criou oportunidades para confrontar opiniões e “fazer um debate sadio que a democracia exige”.
A petista lembrou que a mudança marcou o pleito, desde a morte do candidato Eduardo Campos (PSB), que gerou reviravoltas. A presidente enalteceu que o voto era símbolo de fortalecimento da democracia. “É nesse exercício que as pessoas podem externar suas opiniões, ter uma clara opção em relação ao caminho que querem que o Brasil siga”, preveniu a candidata, que tinha ao lado o governador Tarso Genro e sua vice na disputa, Abgail Pereira (PCdoB).
“Eu disse nessa campanha que dois projetos hoje chegariam para que as pessoas pudessem escolher. Um que acredito que vai fazer com que o Brasil continue mudando para as pessoas crescerem”, contrastou, ressaltando a diferença.
Dilma afirmou que não permitirá que “nada nesse mundo, nem crise, nem pessimismo, tire de você que está aqui nos assistindo o que você conquistou”. A presidente renovou sua aposta no impacto das ações de seu governo que, segundo ela, melhoraram a educação, saúde e segurança, e reforçou que o País “será e continuará sendo uma das maiores nações democráticas desse planeta”.
Na saída da presidente, pequeno tumulto se formou no caminho entre o salão interno, o hall do hotel e a porta de saúde, quando o apresentador do programa CQC, da TV Bandeirantes, Oscar Filho, tentou se aproximar de Dilma. Oscar queria que a presidente colocasse os óculos pretos, marca do programa. “Deixa ele, deixa ele”, reagiu Dilma, em meio ao bloqueio de seguranças para que o apresentador não alcançasse a chefe do governo, que não atendeu ao pedido. Dilma passou sorrindo em meio ao cordão de assessores e seguranças. Eram mais de 20 homens de preto circundando Dilma. Oscar Filho acabou topando com a porta de frio da saída e foi ao chão.

Voto foi marcado por chimarrão na seção eleitoral

JOÃO MATTOS/JC
Na chegada à seção eleitoral, ela tomou chimarrão de um dos mesários e comentou que estava bom
A presidente e candidata à reeleição pelo PT, Dilma Rousseff, votou por volta das 8h45min na Escola Estadual Santos Dumont, na Vila Assunção, zona Sul de Porto Alegre. Ela foi recebida com muitos aplausos e gritos de apoio de militantes. Dilma estava acompanhada do candidato à reeleição ao governo estadual, Tarso Genro (PT), que vota no mesmo local.
Na chegada à seção eleitoral, ela tomou chimarrão de um dos mesários e comentou que estava bom. Depois de sair da cabine de votação, ela fez o sinal de positivo, mostrou o comprovante de votação aos fotógrafos e voltou a tomar mais um pouco de chimarrão. Dilma ganhou o mate de Rogério Leal, fiscal do PMDB.
A presidente, que passou a noite de sábado na capital gaúcha, ficou 7 minutos na seção eleitoral e não falou com a imprensa, pois já havia dado, antes da votação, rápida entrevista coletiva no Plaza São Rafael.
Na saída de Dilma da Escola Santos Dumont, houve um princípio de confusão quando o repórter Eros Prado, do programa Pânico na Band, da TV Bandeirantes, tentou mostrar para a presidente a capa da revista Veja, sobre o escândalo de corrupção na Petrobras.
Prado, que representa o personagem O Inconveniente, foi hostilizado por apoiadores petistas, que o chamaram de “fedorento”, em referência à crise hídrica do estado de São Paulo, onde é produzido o programa.

Pioneira no Planalto, Dilma conquista reeleição

Natural de Belo Horizonte (MG), Dilma Vana Rousseff, 66 anos, iniciou sua vida política na juventude. Aos 16 anos, começou a atuar em movimentos de esquerda, inclusive os de resistência à ditadura militar – como Polop, Colina e VAR-Palmares. Em 1970, foi presa e torturada no Dops, em São Paulo. Como não participou de qualquer ação armada, a Justiça Militar a condenou apenas por subversão, com pena de dois anos e um mês de prisão.
Depois de ser libertada, passou uma temporada em Minas Gerais, junto da família. Em 1973, mudou-se para Porto Alegre, onde o marido, o advogado gaúcho Carlos Araújo, cumpria pena de quatro anos pela atuação na resistência armada – quando eles se conheceram. Araújo foi libertado e retomou a advocacia; Dilma recomeçou os estudos, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Em 1975, fez estágio na Fundação de Economia e Estatística (FEE), órgão do governo gaúcho. No ano seguinte, tornou-se mãe de Paula Rousseff Araújo, que lhe deu o primeiro neto em 2010.
Engajada na campanha pela Anistia, junto com o marido, ajudou a fundar o PDT do Rio Grande do Sul. Entre 1980 e 1985, trabalhou na assessoria da bancada  do PDT na Assembleia. Participou do movimento pelas Diretas Já e da campanha de Carlos Araújo a deputado estadual. O advogado foi eleito em 1982, iniciando o primeiro de seus três mandatos consecutivos. A passagem de Dilma – da atuação nos bastidores da Assembleia Legislativa para o Executivo – aconteceu em 1986, quando Alceu Collares (PDT) assumiu a prefeitura de Porto Alegre, escolhendo Dilma para a Secretaria da Fazenda.
Na primeira eleição direta para a presidência da República, em 1989, Dilma fez campanha para Leonel Brizola (PDT), no primeiro turno, e para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no segundo. No início dos anos 1990, quando Collares se elegeu governador do Estado, tornou-se presidente da FEE. Depois, ainda na gestão do pedetista, assumiu a Secretaria Estadual de Minas, Energia e Comunicação.
Em 1994, após 25 anos de relacionamento, separa-se de Carlos Araújo, com quem tem forte relação de amizade até hoje. Em 1998, iniciou o curso de doutorado em Ciências Sociais na Unicamp, mas não chegou a defender a tese. Em 1999, no governo Olívio Dutra (PT), Dilma volta a ser a titular da Secretaria de Minas, Energia e Comunicação. No ano seguinte, o PDT rompeu com o governo e ela deixou o partido, filiando-se ao PT.
Em 2002, Dilma passou a integrar o grupo de transição de Lula, recém-eleito presidente da República. Em 2003, ela assumiu o Ministério de Minas e Energia, no qual comandou uma profunda reformulação do setor energético. Também presidiu o Conselho de Administração da Petrobras.
Em 2005, assumiu a chefia da Casa Civil e coordenou programas estratégicos como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Minha Casa Minha Vida. Em abril de 2009, Dilma passou por um tratamento de saúde para combater um câncer linfático, que foi curado após cinco meses de tratamento – sem que ela se ausentasse dos trabalhos no governo.
Com o aval de Lula, Dilma se desincompatibilizou do governo, em 2010, para disputar a presidência da República. Depois de disputar o segundo turno com o ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB), tornou-se a primeira mulher eleita presidente da República. A principal meta estabelecida pela sua campanha foi a erradicação da pobreza extrema do Brasil, o que foi reconhecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2014.
No mesmo ano, apesar dos escândalos de corrupção, como o da Petrobras, candidatou-se à reeleição, derrotando o adversário, senador Aécio Neves (PSDB), no segundo turno.