Peça com Vera Holtz propõe reflexão científica e filosófica em torno da humanidade

Vera Holtz faz temporada do espetáculo 'Ficções' no Theatro São Pedro

Por Adriana Lampert

Vera Holtz está em temporada do espetáculo Ficções no Theatro São Pedro
Conhecida por suas complexas estruturas sociais e sistemas de comunicação, a espécie Homo sapiens - nome científico do homem moderno - possui um cérebro bem desenvolvido, tendo como principal característica a capacidade de pensar e raciocinar. E é justamente isso que a peça Ficções propõe ao público: uma reflexão do "homem sábio" sobre a própria existência. O monólogo interpretado por Vera Holtz, sob a direção de Rodrigo Portella, estreia em Porto Alegre, nesta sexta-feira (10), no Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/n). As apresentações se estendem no decorrer do final de semana e também nos dias 16, 17, 18 e 19 de novembro, sempre às 20h, exceto aos domingos, quando as sessões iniciam às 18h. Os ingressos custam de R$ 40,00 a R$ 150,00 e podem ser adquiridos no site do espaço cultural. 
Somando 31 indicações e os prêmios Shell e APTR de Melhor Atriz e de Melhor Música, desde a estreia nacional, em setembro do ano passado, a montagem é uma adaptação da obra Sapiens: Uma Breve História da Humanidade, escrita pelo israelense Yuval Noah Harari. Assinada por Portella (a partir também de interlocuções de Bianca Ramoneda, Milla Fernandez e Miwa Yanagizawa) a dramaturgia do espetáculo faz um recorte do livro original, focando na capacidade do homem de criar e crer coletivamente
A obra reflete sobre a evolução da espécie humana, ao longo de 300 mil anos, e sobre a capacidade de criar ficções, imaginar coisas que envolvem tudo ao nosso redor como o conceito de nação e os sistemas políticos, observa o idealizador e produtor da montagem, Felipe Heráclito. "No decorrer do roteiro, surgem diversas histórias independentes - porém interligadas na mesma temática - que conduzo, entrando e saindo das personagens de uma forma mais performática, em uma estrutura de revista", emenda Vera.
A atriz afirma que já havia sido fisgada pela história contada por Noah Harari há cerca de dez anos, quando leu Sapiens...pela primeira vez. "Foi uma delícia receber o convite de levar a obra para o teatro: entrou pelo canal da paixão e também da surpresa, pois no início eu não tinha ideia de como aquele texto seria adaptado para os palcos", revela. Além de Vera, o espetáculo conta, ainda, com a participação de Federico Puppi em cena. Responsável pela trilha sonora original de Ficções, ele dialoga com as personagens da atriz por meio de uma performance musical, feita ao som de violoncelo elétrico e acústico e piano.
Além de interagir com Puppi e se desdobrar em personagens da obra literária e em outras criadas especialmente para a peça, aos 70 anos de idade (e 44 de carreira) Vera canta, improvisa, "conversa" com Harari, brinca e instiga a plateia, além de encarnar a narradora e, às vezes, falar por si própria. "Já fazia muito tempo que eu não fazia teatro, está sendo maravilhoso", garante a atriz paulista, que estreou nos palcos em 1979, com o espetáculo Rasga coração (escrito por Oduvaldo Vianna Filho). Muito conhecida por seu trabalho na televisão - onde iniciou em 1989, integrando o elenco da novela Que rei sou eu? (Globo) -, a artista reconhece que ambas as linguagens são muito distintas. "É outra dinâmica", destaca. A atriz está, neste momento, também nos cinemas de Porto Alegre, como uma das protagonistas de Tia Virgínia, de Fabio Meira. 
Com Ficções, Vera já cumpriu temporadas no Rio de Janeiro e Niterói (RJ), São Paulo (SP), Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), e iniciou recentemente sua turnê pela Região Sul. "Passamos primeiro por Curitiba (PR), e depois de Porto Alegre iremos para Florianópolis (SC)", comenta. Segundo ela, o espetáculo finaliza o ano com novas apresentações em Niterói e segue, no verão de 2024, para Portugal, onde cumpre temporada de quatro semanas no Teatro Tivoli, em Lisboa. "Na volta, faremos nova temporada em São Paulo, e depois seguimos para o Nordeste", pontua.
Abordando subtemas, como deuses, dinheiro, nações e consciência, o espetáculo que chega ao Theatro São Pedro neste final de semana busca questionar, ainda, o que é real ou inventado e porquê a humanidade segue insegura e sem saber para onde ir. "Nossa espécie apresenta capacidade de viver em sociedade, uma fala desenvolvida e uma capacidade de pensamento que permitiu o surgimento da cultura e das civilizações, características que a diferencia das outras 21 espécies de hominídeos que surgiram ao longo do tempo", ressalta Vera. "No entanto, apesar de sermos mais poderosos que nossos ancestrais, não somos mais felizes que esses. Partindo dessa premissa, a reflexão que fica é se estamos usando nossa característica mais singular para construir ficções que nos proporcionem, coletivamente, uma vida melhor", avalia a atriz veterana.
"Eu gosto muito desse recorte que o Rodrigo Portella fez, de poder criar e descriar, de trabalhar com o imaginário da plateia", continua Vera. "A gente tem a necessidade de que a humanidade avance. Nesse momento, faz muito sentido falar sobre isso, e questionar sobre as nossas narrativas, que se repetem. Se somos capazes de criar e descriar qualquer coisa, porque não estabelecer novas crenças, novas ficções e novos acordos que possam criar também um novo mundo?", finaliza.