Inventário íntimo composto de luz, sons e palavras

Claudia Abreu mergulha no universo de Virginia Woolf e estreia como autora em monólogo dirigido por Amir Haddad

Por Adriana Lampert

Claudia Abreu mergulha nos últimos momentos de ícone da literatura no espetáculo teatral Virginia, que marcará presença nos palcos do Estado no começo do mês de outubro
Os últimos instantes de vida de uma das principais escritoras modernistas do século XX são o pano de fundo de Virginia, espetáculo que marca o retorno de Claudia Abreu aos palcos. Dirigida por Amir Haddad,  a peça também sinaliza a estreia da atriz na dramaturgia, em um mergulho no universo de Virgina Woolf (1882-1941). A turnê pelo Rio Grande do Sul inicia na terça-feira, 4 de outubro, em Santa Cruz do Sul, com sessão às 20h30min no Teatro Mauá. No dia 6, a montagem passa por Santa Maria, às 20h, no Theatro Treze de Maio. Encerrando o giro pelo Estado, Claudia sobe ao palco do Theatro São Pedro (Pça. Marechal Deodoro, s/n) às 21h de sábado (8 de outubro) e domingo (9).

Os ingressos para assistir ao espetáculo em Santa Cruz (com valores entre R$ 30,00 e R$ 100,00) ou Santa Maria (de R$ 60,00 a R$ 120,00) estão à venda pela plataforma Sympla. Em Porto Alegre, as entradas devem ser adquiridas pelo site do Theatro São Pedro, e custam entre

R$ 20,00 e R$ 100,00.

Resultado dos vários atravessamentos que a escritora, ensaísta e editora britânica provocou em Claudia Abreu ao longo de sua trajetória, a montagem é, ainda, o primeiro monólogo da trajetória de mais de 30 anos de carreira da atriz carioca. Além do olhar de Haddad, ela contou também com a co-direção da atriz e diretora Malu Valle. "Ambos em deram muita liberdade para eu desenvolver minha escrita cênica: me conduziram de maneira a me ajudaram a eu me encontrar em cena e fazer da forma como eu queria", valoriza Claudia. Ela conta que a dramaturgia do espetáculo é fruto de um processo criativo, que envolveu leituras (de diários, ensaios, memórias e biografias da escritora), escritas e outras ferramentas de experimentação, realizados em um período de mais de cinco anos.
"Nos últimos dois anos, fiz uma pós-graduação online em Artes Cênicas na PUC do Rio de Janeiro, e nesse período (de isolamento social, por conta da pandemia de Covid-19) realizei uma grande pesquisa sobre escrever para teatro, o que me alimentou e veio como um incentivo para seguir com o projeto", conta a autora e atriz. "Escrevi Virginia de várias formas: com áudios em qualquer lugar que eu estivesse; da maneira clássica, sentada no escritório; ou com pequenas filmagens que eu fazia para mim mesma."
A intuição e a oralidade também ajudaram Claudia a "colocar para fora" todo o conteúdo que ela queria levar para a peça. O trabalho final, segundo a autora, é um inventário íntimo sobre a escritora britânica e seus últimos instantes de vida. "Quando entro em cena, ela já colocou pedras nos bolsos, e está na naquele último átimo de consciência, repassando a própria vida, momentos antes da morte", revela a atriz. "Foi incrível começar nesta aventura de fazer algo diferente de ser só atriz e poder criar o que vou interpretar", emenda. 
No espetáculo, a personagem interpretada por Claudia rememora acontecimentos marcantes em sua vida, a paixão pelo conhecimento, os momentos felizes com os amigos do grupo intelectual de Bloomsbury, além de revelar afetos, dores e seu processo criativo. A atriz carioca conta que sua admiração por Virginia vai além da importância da escritora, que revolucionou a literatura ao inserir o fluxo de consciência em suas obras (capaz de materializar vozes reais ou fictícias, sempre presentes em sua mente): "além de ter muito interesse por esta estrutura literária, sou apaixonada e identificada pelos textos dela".
A relação de Claudia com Virginia Woolf começa em Orlando, montagem assinada por Bia Lessa, em 1989. Aos 18 anos, ela travou contato inicial com a escritora de clássicos como Mrs Dalloway, Ao Farol e As Ondas. No entanto, foi somente em 2016, com a indicação de uma professora de literatura, que a atriz reencontrou e mergulhou de cabeça no universo da autora. "Antes de ler profundamente Virginia Woolf, eu só sabia o clichê: que ela era depressiva e havia se suicidado em um rio. Mas eu quis entender melhor quem era essa pessoa que escrevia e me tocava tanto."
Claudia admite que esse foi justamente seu maior desafio: "fazer um recorte de uma pessoa tão complexa, uma escritora especial, e colocar tudo isso em cena de uma maneira consistente, de forma que fosse possível fazer o público refletir sobre si mesmo, a humanidade, a existência, a condição da mulher na sociedade, a dor da criação, e sobre a linha tênue que separa a loucura e a lucidez". 
Formada em Filosofia, a atriz carioca avalia que a vida da autora britânica foi tão trágica e rica em acontecimentos quanto sua obra "Ela sofreu abusos sexuais, perdeu a mãe cedo, teve várias mortes da família nuclear, tinha questões emocionais e psicológicas, e viveu em um período de grande repressão contra as mulheres. Mesmo assim, superou as adversidades, foi autodidata e brilhante."