Quem diria, Companhia de Ópera do Rio Grande do Sul completou um ano!

Por Antonio Hohlfeldt

Começou meio que sem muita explicação, mas a Companhia de Ópera do Rio Grande do Sul acaba de completar seu primeiro ano de vida, que comemorou com dois diferentes espetáculos, nos dias 29 e 30 de agosto último, no Teatro Oficina Olga Reverbel, do Multipalco. A data foi marcada, ainda, pelo lançamento de uma espécie de catálogo de todos os trabalhos realizados pela companhia neste primeiro ano, e espanta. Alcançou 5362 espectadores, atingiu seis diferentes cidades com suas montagens, alcançou 93% de lotação dos teatros (em Porto Alegre foi sempre 100%), com um ingresso médio de R$ 50,00.
Organizada em dois grandes projetos, a Companhia de Ópera do Rio Grande do Sul realizou, através do projeto Ópera Para Todos, as montagens de Cavalleria Rusticana, em maio de 2022, seguida de A flauta mágica, em novembro do mesmo ano, encerrando o ano com A viúva alegre. Em 2023, encenou Suor Angelica, em março, e, em junho, montou Os palhaços. Quatro óperas diversas, com desafios diversos e oriundas de tempos diversos, para as quais a equipe, em especial o diretor Flávio Leite, foi buscar linguagens diversas, renovando o gênero, buscando novos públicos e não apenas reencontrando aquela plateia mais tradicional. Este desafio foi ampliado na medida em que as montagens, por serem minimalistas, ao mesmo tempo em que significavam enormes desafios para a criatividade do grupo, permitiam viagens ao Interior, chegando a Canoas, São Leopoldo, Lajeado, Santa Maria, Farroupilha, Passo Fundo, Pelotas, Bagé, Novo Hamburgo, Carlos Barbosa, Jaguarão e outros centros.
Ainda mais: promoveu espetáculos líricos nos dias 26 de abril do ano passado, quando se lançou publica e oficialmente, no dia 7 de julho, em Lajeado, e no dia 23 de junho do corrente ano, em Porto Alegre.
O outro projeto, Ópera Estúdio, conta com o financiamento da Secretaria de Estado da Cultura, no valor de R$ 500 mil, divididos em partes iguais para os anos de 2022 e 2023. Com parcerias da Fundação Orquestra Sinfônica de Porto Alegre e Fundação Theatro São Pedro, contratou 40 professores, formando 18 alunos em 2022 e mantendo 40 alunos em formação no corrente ano, realizando seis recitais para comunidades variadas. A ideia deste projeto apresenta mão dupla: formação de jovens artistas e formação de plateias. Isso significa apostar duplamente no futuro do gênero operístico na cidade e no estado, de maneira a evidenciar a renovação e a modernização possível de suas linguagens.
Já comentei, a modo de brincadeira, que o que mais me agrada neste grupo é não encontrar primas donas ou varões de largos peitos e enormes abdômens: é evidente que a conformação dos corpos depende de cada um, mas o grupo quebrou aquela crença de que, para guardar fôlego e ter respiração, havia que ser enorme, o que fazia com que mocinhas de 15 anos fossem interpretadas por cantoras de 50, do mesmo modo que jovens guerreiros encontravam-se nos corpos de barítonos ou tenores balofos. O que temos aqui é gente comum a todos nós, o que significa dizer: em tese, qualquer um de nós pode se tornar um cantor de ópera.
As versões minimalistas também facilitam a compreensão dos enredos. O uso de legendas permite a interpretação a partir da versão original (em italiano, francês ou alemão), garantindo sua compreensibilidade por parte de todo o público.
A coordenação entre a Companhia de Ópera e a Ospa, além do Theatro São Pedro, garante outro princípio importante: num país que carece de investimentos em tudo, mas especialmente na cultura, juntar esforços de entidades já existentes significa um enorme respeito ao dinheiro público. Some-se a isso o apoio decidido da Sedac e temos um projeto vencedor. Flávio Leite, Angela Diel, Sérgio Sisto e Eiko Senda - esta, oriunda do Japão e originalmente radicada em São Paulo, mas que arriscou tudo para integrar-se a este projeto - coordenam um trabalho entusiasmado e entusiasmador, sempre trazendo projetos inovadores e que provocam ótimas surpresas, evidenciando que, ao contrário do que se poderia pensar, a ópera continua um gênero vivo e pulsante. O grande desafio, nos próximos meses, será também abrir o caderno de repertório para realizações contemporâneas, ampliando ainda mais o público que se revela de enorme potencial.