Terrários são aposta para criar novas áreas verdes na cidade

Projeto em Porto Alegre é novidade no País e tem legislação própria

Por Bruna Suptitz

Primeiro terrário urbano de Porto Alegre será na esquina das avenidas Lucas de Oliveira e Neusa Brizola
Enquanto aguarda a entrega do primeiro terrário urbano, prevista para dezembro, a prefeitura de Porto Alegre já garantiu parceiro para transformar mais um pedaço pequeno de terreno público em uma área verde, e assim aproximar a natureza dos prédios e do asfalto da cidade. É que o "quintal de casa", papel que nos grandes centros urbanos é muitas vezes feito pelas praças e pelos parques, nem sempre está próximos das pessoas. Perceber que o contato com a natureza faz falta no dia a dia despertou a atenção da arquiteta e urbanista Natércia Domingos. Ela estudou temas relacionados à complexidade urbana no doutorado em planejamento urbano da Ufrgs e se pôs a pensar numa forma de resolver essa necessidade de um jeito que as áreas verdes se integrem à cidade já construída.
Como referência, Natércia encontrou o caso dos "mini-parques" de Nova York, que existem por lá desde a década de 1960. Por incentivo da lei de zoneamento, pequenos espaços nos pavimentos térreos de prédios particulares são destinados ao uso público; a contrapartida é um bônus de índice construtivo. Mas no Brasil, o modelo ainda é novidade. Na adaptação para a realidade de Porto Alegre, a arquiteta focou não em áreas a serem construídas, e sim no que está disponível, e encontrou em terrenos públicos pequenos para receber novas construções o lugar ideal para criar esses parques.
"A ideia é que pequenos espaços são relevantes quando a intenção é contribuir com a vitalidade urbana. Terrários urbanos são disseminados amplamente, são mais flexíveis e acolhem maior quantidade de usos. Isso amplia a resiliência do território", avalia Natércia. Como coordenadora de projetos de sustentabilidade na Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade da Capital, a arquiteta apresentou a proposta de levar o modelo para as ruas da cidade.
"A proposta foi muito bem aceita, porque no final das contas dá uso para terrenos que são subutilizados e cuja manutenção ficava a cargo da prefeitura", explica Rovana Reale Bortolini, diretora de Projetos e Políticas de Sustentabilidade da prefeitura. Resultado de parcelamento do solo ou projetos de alargamento viário, esses lugares ficam sem característica definida e acabam se tornando focos de lixo ou pontos para estacionamento irregular. "O terrário vem para fechar a lacuna que se tem nesse porte de terreno difícil de ser utilizado", completa Rovana.
A equipe já mapeou 10 áreas com potencial para participar do projeto e tem outras no radar. A concessão de uso para este projeto é regida por um decreto específico e dialoga com o objetivo da cidade de mitigar o impacto das emissões de gases de efeito estufa e fazer de Porto Alegre uma cidade ambientalmente sustentável. Como defende Natércia, "os terrários urbanos são um respiro não só para as pessoas, mas para a natureza".
 

Falando em TERRÁRIOS

O nome "terrários urbanos" é uma referência aos jardins cultivados em recipientes de vidro - os terrários - nos quais se busca criar para as plantas condições semelhantes às que elas encontrariam na natureza. Em Porto Alegre, o projeto é regrado pelo Decreto 20.652/2020.

Parcerias podem ser com a iniciativa privada ou comunitárias

Modalidade 1
Neste modelo, a implementação e a manutenção do terrário urbano são feitas por um parceiro da iniciativa privada como contrapartidas para a exploração comercial do espaço. As atividades instaladas devem ser ativas e abertas ao público em geral, não somente aos consumidores. A seleção do permissionário é feita através de licitação, na modalidade pregão eletrônico de maior preço, desde que atendidas premissas como uso de práticas sustentáveis na manutenção e vegetação nativa. Devido ao investimento inicial que esses terrenos demandam, a prefeitura optou por trabalhar com outorga (pagamento pelo uso) única, diferente de outros espaços concedidos pelo poder público em que o pagamento é mensal. O recurso obtido na modalidade 1 pode ser direcionado para a implementação de terrários urbanos com parcerias comunitárias.
Modalidade 2
Caso em que a implementação do terrário urbano está vinculada a projetos sociais, ambientais e culturais, e deve envolver a comunidade e o terceiro setor na construção e na gestão compartilhada do espaço com o poder público. O modelo de parceria é a permissão de uso não-onerosa (sem pagamento nem cobrança), que pode ser atribuída apenas a instituições sem fins lucrativos, inclusive associações de moradores. Neste caso, a comunidade ou o terceiro setor identificam uma área potencial e lançam sua proposta através do formulário de inscrição. Será avaliada a viabilidade de implementação e feitas sugestões ao projeto. Após a aprovação, a entidade promotora deverá indicar o responsável pela gestão do espaço.

Primeiro espaço inaugura este ano

O primeiro terrário urbano com um parceiro da iniciativa privada, na esquina das avenidas Lucas de Oliveira e Neusa Brizola, terá até o fim do ano uma loja da marca Maçaix (foto ao lado). "Não nos adaptamos à proposta da prefeitura, nós somos ela", resume Marco Martins, um dos donos da marca. Para atender algumas das exigências do poder público, o piso será drenante e a fonte principal de energia é solar.
Segundo Martins, as práticas de sustentabilidade já são incorporadas no processo, seja na construção do espaço, seja na atenção à colheita do fruto e rastreabilidade do transporte. A preocupação por estrear um espaço novo para a cidade é "o que podemos entregar além da própria praça", destacando que o objetivo é "integrar (terrário urbano) na comunidade".

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