A revolução genética

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Em 1859, Darwin publica a obra A Origem das Espécies, que revoluciona este modo de pensar. A partir de então começa-se a falar em evolucionismo. À primeira vista, parecia a derrocada do criacionismo. O embate foi violento. Uma espécie de tsunami. De um lado parecia estar a Religião e, do outro lado, a ciência. A primeira defenderia que Deus criou, no início, todas as espécies de vida, mantidas inalteradas ao longo dos tempos – com algumas perdas no percurso – e a segunda garantiria que a vida se originou de modo rudimentar. Vai evoluindo e se diversificando com o passar dos milênios.
Na verdade não se trata de uma antinomia entre criacionismo e evolucionismo, mas de uma oposição entre fixismo e evolucionismo, ambos no restrito âmbito da biologia. Os adversários de Darwin eram fixistas, também biólogos, ou seja, defendiam a impossibilidade de passar de uma espécie para outra. Deus teria criado, no início, no dizer deles, tantas espécies quantas existem hoje, menos as que se extinguiram com o passar dos tempos. Nossos ecologistas, talvez inconscientemente, quando falam de animais e de plantas em extinção, estejam pensando e trabalhando em termos fixistas. Querem preservar as espécies tais quais existiram desde o início da vida.
O evolucionismo não se opõe, pois, ao criacionismo. Apenas lhe proporciona uma explicação, por assim dizer, mais científica. Procura desvendar o modo da criação. Em outras palavras, quem crê em Deus criador e quem professa sua fé na evolução apenas diverge do modo como Deus teria criado a vida. Quem crê na evolução professa que Deus continua criando ao longo dos tempos, aperfeiçoando cada vez mais a vida. Parece absurdo, ou seja, sem explicação cabal, admitir uma evolução ascendente, que seja cega, sem perspectivas. Há, na base, uma causa inteligente, que vai dispondo os elementos, os genes, de modo a embutir-lhes uma capacidade de se transcender. Falar de geração espontânea significa negar-se a dar explicação à origem da vida. Surgiu porque surgiu.
Com Darwin  não nos afastamos de Deus, nem de sua criação. Pelo contrário, entendemo-los mais profundamente. Deciframos finalmente o mistério da vida. Eliminamos a concepção antropológica de Deus, que o vê à semelhança do ser humano, para calcar sua transcendência. Mas também formamos uma ideia mais adequada da criação, ao inter-relacionar todos os seres e entender melhor como Deus cria. Não só conserva mas aperfeiçoa, com o correr dos tempos, sua criação.
É, certamente, mais sábio criar um ser com possibilidade de evoluir do que criar um ser pronto, sem dinamismo interno, como é mais sábio criar uma vida que se transmite na semelhança da natureza, do que criar uma vida que se feche sobre si mesma e acabe nela. Transcender é mais que simplesmente ser. Isto é evolução. Não estamos diante de um artefato pronto, mas diante da vida, com dinamismo interno.No século XIX, com o avanço da paleontologia, aventou-se a hipótese da evolução das espécies, tendo Darwin como protagonista. Que a vida se transmita por geração é óbvio, desde tempos imemoráveis. Mas dentro de cada espécie. Estas eram vistas como obra da criação, perfeitas desde o início. As pesquisas científicas, porém, levaram à descoberta de uma evolução da própria vida, incluindo as espécies.
O problema do primeiro não se coloca mais dentro de cada espécie, mas dentro da vida em geral. Seria geração espontânea seu início? Isto equivaleria a dizer que não se conhece a origem. Daí o criacionismo e o evolucionismo não se oporem, mas se complementarem: o primeiro no plano metafísico e o segundo no plano científico. Evolucionismo, em verdade, se opõe a fixismo, que as pesquisas paleontológicas declaram superado.