Cresce o movimento empresarial no caminho do capitalismo consciente

Por JC

Em solo gaúcho, há uma mobilizada e consciente legião de empreendedores e profissionais
Carmen Carlet e Marta Schlichting*, especial para o JC
Sicredi, Mercur e Dobra são alguns exemplos de empresas gaúchas que têm como propósito uma nova forma de fazer negócios. Isso significa que, além do lucro, estão comprometidas com os aspectos socioambientais e com a governança voltada ao ecossistema que engloba todas as partes envolvidas no negócio, os chamados stakeholders. Essa nova economia também atende pelo nome de capitalismo consciente, movimento global que iniciou em 2010 e chegou ao Brasil três anos depois, representado pelo Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB), com sede em São Paulo e 11 filiais em todo o Brasil. O Rio Grande do Sul não está de fora. Em solo gaúcho, há uma mobilizada e consciente legião de empreendedores e profissionais que defendem as boas práticas como solução para um mundo melhor.
 

Capitalismo consciente propõe novas formas de fazer negócios

O capitalismo é um sistema que fez muito pela humanidade. Durante séculos, 90% da população vivia em extrema pobreza, sob regimes absolutistas, sem alfabetização e com expectativa de vida baixa. Por outro lado, não há como negar que o modelo tradicional de capitalismo não se preocupou com os recursos naturais, nem com as desigualdades.
Por conta disso, atualmente, nunca se falou tanto em crise ambiental, social, pobreza e falta de conexão com o coletivo, indicando que é urgente avançar na transição para um Capitalismo Consciente (CC). Se antes o lucro e os dividendos eram a única razão de ser de uma empresa, os tempos atuais exigem uma nova economia que abranja todas as partes envolvidas no negócio, os chamados stakeholders, ou seja, os sócios, acionistas, colaboradores, fornecedores, consumidores, clientes, a própria sociedade e até o planeta.
Foi com esta disposição de remodelar o papel das organizações e minimizar seus impactos - enquanto gera riqueza e bem-estar para todos - que surgiu nos Estados Unidos, em 2008, o Conscious Capitalism Inc., uma organização sem fins lucrativos amparada nas pesquisas do professor, escritor e consultor empresarial Raj Sisodia, especialmente a partir da publicação de seus livros Empresas Humanizadas e Capitalismo Consciente - como libertar o espírito heroico dos negócios. Este movimento global foi rapidamente incorporado por diferentes Países - no mundo todo há 13 filiais do CC - e chegou ao Brasil em 2013, com a fundação do Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB), na capital paulista.
Para o cofundador e chairman do ICCB, Hugo Bethlem, "um negócio só é bom quando cria valor para as pessoas e o planeta, é ético quando baseado em trocas verdadeiras e voluntárias entre seus stakeholders, é nobre quando tem a capacidade de inspirar e elevar a dignidade humana e, principalmente, é heroico quando tira as pessoas da pobreza, gerando prosperidade econômica". Bethlem destaca que essa relação ganha-ganha reverte para a própria marca (veja pesquisa Melhores para o Brasil) e esta escolha sempre estará nas mãos dos líderes. "Por isso, a atuação do ICCB é especialmente voltada para as lideranças, capacitando-as a trilhar esta jornada evolutiva através dos quatro pilares que alicerçam as empresas conscientes: Propósito Maior, Liderança Consciente, Cultura Consciente e Orientação para os Stakeholders", explica o chairman que também é conselheiro de ESG e possui mais de 40 anos de vivência como C-Level em empresas de varejo. 
 

Pesquisa Melhores para o Brasil

De acordo com o relatório "Melhores para o Brasil 2023", referente à pesquisa da Humanizadas - agência de ratings ESG e inteligência de dados - realizada em 2022 com 200 empresas e um total de 43.942 pessoas ouvidas, as organizações que estão comprometidas com a nova economia já estão colhendo resultados. Os dados do levantamento evidenciam uma correlação entre cinco princípios: o propósito maior, a estratégia de valor compartilhado, a cultura consciente, a capacidade de aprendizado e mudança e a liderança consciente.
Classificadas como 'Melhores para o Brasil', as empresas com ratings entre BBB e AAA na pesquisa, apresentam desempenho superior à média do mercado brasileiro, com os seguintes destaques:
  • Performance financeira 615% superior no longo prazo (12 anos)
  • Performance em práticas ESG 139% superior
  • Capacidade de inovação com as lideranças 218% superior
  • Satisfação dos clientes 98% superior
  • Reputação da marca com parceiros e fornecedores 83% superior
  • Bem-estar dos colaboradores 174% superior
  • Confiança nas relações com colaboradores 227% superior
  • Reputação perante a sociedade 75% superior
  • Perspectiva de futuro com a sociedade 67% superior
  • Segurança psicológica com os colaboradores 135% superior
  • Ambiente de inclusão e diversidade com os colaboradores 162% superior.
 

Boas práticas devem incluir bem-estar de stakeholders

Os mesmos pilares que sustentam o CC também pavimentam o caminho para a implementação de práticas ESG (Environmental, Social and Governance), que se traduzem em governança, responsabilidade social e com o meio ambiente.
O conceito nasceu em 2005, quando o então secretário da ONU, Kofi Annan, convidou as 50 maiores instituições bancárias e empresas globais para apresentar o relatório Who Cares Wins (Quem cuida vence), encorajando a incorporação destes critérios no mercado de capitais por meio dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
O avanço da Agenda 2030, proposta pela ONU, não depende, apenas, dos governos e organizações da sociedade civil, mas depende em muito das empresas. A boa notícia é que um estudo feito pela consultoria BCG revela que as organizações que adotam as práticas ESG impactam positivamente a sociedade, alcançam maior lucratividade e crescimento do seu valor de mercado no médio e longo prazo.
Além disso, uma pesquisa realizada pela consultoria Nielsen, em 60 países, revelou que 66% das pessoas estão dispostas a pagar mais por produtos e serviços de companhias comprometidas com as questões socioambientais.
De acordo com a advogada especializada em direito ambiental e conselheira da filial do ICCB no Rio Grande do Sul, Maria Eduarda Gasparotto - mestranda em Direito Ambiental e Sociedade pela Universidade de Caxias do Sul (RS) - no Brasil o desafio é desconstruir a ideia de que práticas ESG só podem ser adotadas por organizações de grande porte.
"Isso cria um entrave, já que no País as pequenas e médias empresas são maioria. Independente do tamanho, o desenvolvimento de uma visão sistêmica sobre a agenda ESG somente será possível por meio da educação, primeiramente junto às lideranças empresariais", ressalta Maria Eduarda, lembrando que ESG vai além de se autoproclamar uma marca carbono neutro.
"De nada adianta ter boas condutas ambientais se a empresa não se preocupa com o bem-estar de seus stakeholders". Para ela, em muitas situações as empresas de médio e pequeno porte já desenvolvem ações que podem ser consideradas práticas de ESG, como trabalhar com material reciclado ou sobras de tecido para confecção de roupas, por exemplo.
"A partir do momento em que a empresa decide se apropriar formalmente do ESG é possível criar novos projetos adequados à realidade, tamanho e recursos disponíveis naquela empresa. É um trabalho desenhado sob medida", resume. 
 

Movimento educativo em alta

A jornada em direção ao Capitalismo Consciente passa, necessariamente, por um processo educativo para despertar a consciência na prática empresarial. Para isso, o ICBB oferece aos associados, embaixadores, parceiros e apoiadores, um conjunto de formações. De acordo com Amanda Malucelli, Head de Educação do Instituto, a Academy que o Instituto mantém conta com quatro níveis de formação, diversos cursos complementares e o projeto Líder pro Mundo.
"O projeto é direcionado para jovens, em especial os que buscam seu primeiro emprego, ou que estão com dificuldades de inserção no mercado de trabalho. Aqueles que completam todos os módulos deste curso on-line entram para uma plataforma de estágio, de forma que várias empresas, inclusive as do nosso ecossistema, possam recrutá-los", explica, lembrando que as empresas podem adquirir o acesso para oferecer aos seus jovens colaboradores e ONGs se candidatarem às vagas sociais.
Para além da Academy, o ICCB disponibiliza uma série de conteúdos abertos, e outros exclusivos para associados, via blog, podcast, aplicativo, guia de boas práticas, entre outras ferramentas. Soma-se a isso as soluções corporativas, desenhadas para demandas específicas, através de palestras, workshops e eventos.
Ainda no que tange ao conhecimento, o Instituto decidiu comemorar seus 10 anos de forma descentralizada, em conjunto com as 11 filiais que atuam em diferentes estados brasileiros, e promover a terceira edição do Fórum Brasileiro do Capitalismo Consciente. Neste ano, a temática gira em torno das desigualdades impactantes no Brasil, alicerçada na ODS 10 da Agenda 2030 da ONU que trata sobre a Redução das Desigualdades. Mais do que acelerar o passo em direção à resolução do problema no País, o ICBB entende que é crucial conscientizar as lideranças sobre os mecanismos que reforçam essas desigualdades dentro e fora das organizações. Coube justamente à filial gaúcha dar início a esta série de encontros que ainda estão em andamento. Em Porto Alegre, o fórum regional reuniu, em março deste ano, associados e interessados em debater a desigualdade no acesso à educação de qualidade. Fruto dos debates do fórum, será lançado, em breve, um e-book com as reflexões e sugestões tiradas no encontro.
 

Articulação fortalece filial gaúcha

Conforme a colíder do ICCB RS, Eliane Davila, a articulação gaúcha iniciou a partir de conversas informais entre ela e o diretor executivo do Sicredi Pioneira, Solon Stahl, ambos com formação e certificação em Capitalismo Consciente. A partir daí, ampliaram o debate, convidando outras lideranças para integrar um grupo de discussão. A iniciativa tomou corpo e, em 2021, se estruturaram formalmente para constituir a filial.
"Somos um movimento educativo, fundamentalmente, com gestão cooperativada, em que eu e o Stahl somos as lideranças. Todos os gestores são voluntários e, além dos coordenadores dos eixos de atuação, contamos com um conselho formado por 18 pessoas que assessoram os colíderes em suas decisões, assim como se ocupam de divulgar o movimento em todo estado", introduz a administradora de empresas, doutora em Processos e Manifestações Culturais.
Nesta trajetória que, oficialmente, ainda não completou dois anos, o ICCB RS já arregimentou mais de 100 pessoas que participam dos grupos de discussão, conta com 12 associados - entre os quais o próprio Sicredi, Dobra, Sonata Brasil - apoiadores e parcerias importantes que viabilizam ações e eventos, como é o caso da ABRH/RS e Instituto Caldeira.
Na prática, a filial gaúcha atende a empresas interessadas em conhecer o Capitalismo Consciente, oferecendo palestras, workshops e eventos voltados às lideranças empresariais. Paralelamente, promovem abordagens pró ativas junto a organizações de interesse, assim como procuram acompanhar de perto eventos regionais, como foi o caso do South Summit e Gramado Summit. Palestras em universidades, voltadas para a formação de líderes do futuro, também são frequentes, assim como a aproximação com prefeituras do interior do estado.
Na avaliação de Davila, a resistência que ainda há no mundo corporativo, em relação às propostas desta nova economia, é compreensível. "Estamos falando de uma transição abrangente, de um movimento educativo para a tomada de consciência e decisões que requer tempo, de acordo com a maturidade de cada organização".

O cooperativismo, por essência, é consciente e sustentável

Fundada em 1902, em Nova Petrópolis (RS), pelo padre Theodor Amstad, a Sicredi Pioneira é a primeira cooperativa de crédito da América Latina e junto com outras 104 cooperativas, integra o Sistema Sicredi, presente em todo o País. A Pioneira, que atualmente conta com 230 mil associados, já nasceu com a essência e os princípios de uma empresa ESG.
Solon Stapassola Stahl, diretor-executivo da Pioneira e colíder da Filial Regional do Capitalismo Consciente no Rio Grande do Sul, explica que uma cooperativa existe para atender as necessidades de seus sócios, respeitando todas partes envolvidas.
O sistema cooperativo em si tem uma forte inclinação para apoio ao social e uma governança peculiar, que prima por dar voz ao associado, que em suma é o dono do negócio. Por esses motivos, o cooperativismo assume práticas de transparência e compliance.
Porém, mesmo que tenha esta vocação em seu DNA, a Pioneira adotou as boas práticas e estruturou, em 2020, o Comitê de Negócios Conscientes (CNC), responsável pela curadoria de práticas de ESG na cooperativa.
Stahl conta que a preocupação com o econômico, o social e o ambiental inspira o propósito da Pioneira que é 'juntos construímos comunidades melhores'. Todavia, é fato que tudo ganhou impulso com a filiação da cooperativa ao Instituto Capitalismo Consciente Brasil, argumenta Stahl, ao acrescentar que hoje a cooperativa está com muitas práticas conscientes em andamento, e outras ações sendo estudadas. Tudo, de acordo com o dirigente, é monitorado pelo CNC que é formado por um time multidisciplinar, do qual ele mesmo participa.
Entregar na íntegra o propósito de construir comunidades melhores é o grande desafio e objetivo da Sicredi Pioneira ao reforçar as boas práticas. "Temos a clareza de que cumprir a legislação é o mínimo e é uma visão pobre e limitada", garante Stahl.
A convicção da cooperativa é de que ela é corresponsável por levar prosperidade a mais pessoas, através de sua atuação consciente. "Acreditamos fortemente que é possível alinhar lucro e propósito, respeitando as pessoas, o planeta e agregando valor a todos nossos stakeholders", salienta o diretor-executivo.
Para tanto, a Sicredi Pioneira possui sete métricas, uma para cada stakeholder: comunidade e meio ambiente, fornecedores, colaboradores, associados, poder público, Sistema Sicredi e entidades/parceiros. A finalidade é gerar e medir o impacto positivo em todas as partes envolvidas.
"Mas é fato que as duas mais importantes, são o resultado líquido e a satisfação do associado que é medida pela pesquisa NPS - Net Promoter Score". Stahl comemora o resultado contando que hoje o NPS já ultrapassou a excelência, tendo alcançado 77,4% de satisfação - quando para fins de comparação a média bancária é entre 35% e 45%.
Celebrando bons resultados econômicos, o diretor-executivo destaca que em 30 meses a cooperativa dobrou de tamanho e, em 2022, alcançou seu maior resultado líquido em 120 anos de existência. "Com isto, hoje temos 30% do market share de crédito na nossa área de ação, o que corresponde a 21 municípios", afirma enfaticamente.
Já a pesquisa de clima - medida entre os colaboradores - é nota 90 no GPTW (abreviação para Great Place to Work, que traduzido para português pode ser entendido como "ótimo lugar para trabalhar". Portanto, é um certificado importante para atestar a qualidade da empresa na gestão de pessoas e na cultura organizacional, colocando a Sicredi Pioneira entre as 10% das maiores notas do mundo.
"Também estamos realizando 80% de nossas compras com fornecedores locais, todas nossas agências são paperless (abolimos o papel), e até final do ano seremos auto suficientes em energia elétrica através de fontes fotovoltaicas", adianta. Diversidade também é palavra comum dentro da cooperativa. Segundo o censo interno, 10% dos associados se declaram "diverso". A maturidade é outro fator respeitado dentro dos parâmetros da Pioneira através do programa de contratação de pessoas 50 . Além desses, a cooperativa também criou um programa de inclusão de pessoas com deficiência (PCDs) e outro direcionado a jovens em situação de vulnerabilidade social.
O ESG deve ser visto como fonte de inovação e acelerador de modelos de negócios mais conscientes, como são as cooperativas. "Somos ESG desde sempre levando impacto positivo para as comunidades em que atuamos. Reflexo disto é que hoje somos reconhecidos como uma entidade que está genuinamente preocupada em construir comunidades melhores", assinala Stahl.
 

Às vésperas de se tornar centenária, Mercur comemora resultados fundamentados na adoção de boas práticas

Prestes a completar um centenário - a ser comemorado em 2024 - a Mercur S.A. que iniciou suas atividades em Santa Cruz do Sul (RS) reparando pneus e produzindo artefatos de borrachas situa-se entre uma das maiores do Brasil no segmento de manufatura e comercialização de produtos destinados à saúde e educação. Conforme Jorge Hoelzel Neto, facilitador, o termo ESG ainda não existia e a empresa já adotava as chamadas boas práticas.
"A forma como atuamos tem a ver com o que chamamos de DNA Mercur, que busca materializar tudo o que entendemos ser correto fazer para evitar, ao máximo, os impactos negativos da nossa operação, e, se possível, construir ações que causem impactos regeneradores em âmbito humano, social e ambiental", avalia Hoezel.
Tudo começou há cerca de 15 anos, quando a Mercur virou a chave e iniciou uma mudança de posicionamento fundamentada nos pilares social, humano, ambiental e econômico. A empresa recriou seu jeito de ser no mundo corporativo e colocou foco nas pessoas: uma gestão mais horizontal, aberta ao diálogo e voltada para ações responsáveis no meio em que atua.
O processo, como conta o facilitador, se deu a partir de um diagnóstico que levou a empresa perceber a inexistência de indicadores suficientes que pudessem medir ou qualificar os impactos que suas operações causavam à sociedade e ao meio ambiente. "A partir de então, imprimimos um grande esforço educacional e de aprendizagem às 'pessoas mercurianas' (como nos autodenominamos), para que pudéssemos compreender os impactos negativos das nossas operações e cocriar soluções que os compensassem", explica.
Partindo do objetivo de fornecer um legado honesto para a sociedade e meio ambiente, a empresa estabeleceu como propósito para sua atuação "cocriar o mundo de um jeito bom para todo o mundo". Assim, sempre enfatizando a cocriação (iniciativa de uma empresa baseada na cooperação de diferentes perfis de público no processo de produção de algo para alcançar um objetivo de forma inovadora), a Mercur desenvolve produtos para educação, como borrachas de apagar, colas, corretivos, e para o mercado da saúde, como bengalas, muletas, bolsas térmicas, joelheiras, além de recursos de inclusão voltados para pessoas com deficiência.
Hoelzel afirma que a Mercur não adota boas práticas com objetivos econômico/financeiros. "Entendemos que os resultados precisam ser uma consequência do modelo de operação que decidimos entregar para a sociedade", racionaliza.
O facilitador destaca que o trabalho tem início e não tem fim, pois a cada dia que passa todos aprendem uma nova forma de minimizar os impactos negativos. "Além disso, percebemos que quanto mais compreendemos as nossas responsabilidades com relação à vida, mais precisamos aprender para minimizar nossos impactos", finaliza.
 

Quando uma empresa já nasce com consciência

O que germinou na cabeça de Eduardo Seeling como a ideia de um projeto para a faculdade de Administração, em 2013, se transformou em um empreendimento rentável e justo para a cadeia produtiva. Ele e os primos Augusto e Guilherme Massena tinham o sonho de empreender em algum tipo de negócio. Juntos, bebiam de fontes que, naquela época, já falavam sobre economia colaborativa, sistema B e novas formas de relação empresarial, entre outras pautas de vanguarda para o mundo corporativo.
Embebidos, então, neste caleidoscópio inovador, os primos resolveram criar uma atividade que fosse próspera, não sufocada por pontos financeiros, mas que também tivesse um olhar voltado para o social e o ambiental. Assim, em março de 2016, nasceu - na cidade de Montenegro (RS) - a Dobra, uma empresa que iniciou produzindo e comercializando carteiras em tyek (uma fibra sintética que parece papel, mas não é) e hoje tem um e-commerce forte vendendo outros produtos, além de ensinar, através de mentoria, quem quer dar os primeiros passos em um novo negócio. Mesmo jovem, a Dobra já é considerada uma das empresas mais humanizadas do Brasil.
O sócio Guilherme Massena conta que foi quase natural a empresa adotar rotinas, que depois vieram a se confirmar globalmente como "práticas ESG". O empresário explica que essas condutas vêm se desenvolvendo, aprimorando e sendo praticadas no cotidiano da Dobra, "é algo vivo dentro da nossa cultura", salienta.
Aliás, cultura é uma palavra muito propagada dentro da Dobra. Segundo Massena o objetivo dos sócios é que a empresa seja um vetor de mudança positiva na sociedade. "Nosso propósito é transformar o mundo em um lugar mais aberto, irreverente e do bem", fala com entusiasmo ao comentar que para propagar mais sobre esse jeito de pensar e se posicionar, a empresa disponibiliza um manual de cultura e boas maneiras, além de abrir publicamente a forma como trabalha. Através do braço de educação, os gestores compartilham conteúdos, aulas e cursos para quem está iniciando um empreendimento ou quer expandir sua marca. Os empreendedores são tão ousados e acreditam tanto na sua forma de condução empresarial que no site, inclusive, ensinam como copiar a Dobra, apontando o caminho para quem quer entrar no mercado. Sem se importar em contar para outros empreendedores como podem fazer para imitar o modus operandi - ensinando, inclusive, todo o passo a passo - Guilherme diz que o pulo do gato é saber que o produto é só um meio para entregar algo maior. "Assim, temos tranquilidade para testar caminhos diferentes para essa mesma entrega, ou seja, o leque de possibilidades aumenta", explica ao ressaltar que tudo isso - o processo - é a verdade da Dobra e que não pode ser copiado. "Comunicamos aquilo que a gente é. Se alguém copiar, não está sendo verdadeiro", diz.
Como todas as empresas nascidas em tempos urgentes, a Dobra não trabalha com metas a longo prazo, focando em objetivos trimestrais e que variam de acordo com as demandas internas do negócio. "Nossa lucratividade passa muito mais pela expansão das vendas do que pela redução de custos", conjectura o empreendedor ao listar as carteiras como carro-chefe com maior número de unidades comercializadas, mas tendo as capas para notebook no mesmo patamar. A empresa de Montenegro fatura cerca de R$ 3,2 milhões ao ano com os lucros advindos da comercialização de uma diversidade de produtos diferentes, mas também oriundos dos serviços de consultoria, mentoria e aceleração de e-commerces.
 * Carmen Carlet e Marta Schlichting

Jornalistas formadas pela Pucrs. Com históricos profissionais diferentes, atualmente trabalham com assessoria de comunicação.