Macron diz ter 'muita vontade de irritar' quem não se vacinou

País registrou a maior quantidade de casos desde o início da pandemia

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Para o presidente, oposição à vacina é uma "falta moral"
O presidente Emmanuel Macron causou polêmica na França - e furor entre seus opositores - ao defender, de forma bastante enfática e pouco usual entre líderes de Estado, a imposição de restrições a pessoas não vacinadas contra a Covid-19.
"Eu não quero irritar os franceses. Reclamo o dia todo quando o governo os atrapalha. Mas os não vacinados, esses eu tenho muita vontade de irritar", disse o líder francês em entrevista ao jornal Le Parisien publicada na terça-feira. Macron usou o verbo "emmerder" em francês, um registro coloquial da língua que também pode ser considerado, a depender do contexto, um palavrão.
Na entrevista, o presidente respondia a perguntas enviadas por leitores do jornal, e a resposta controversa foi dada a uma enfermeira que o questionou sobre pessoas imunizadas contra o coronavírus que estavam tendo cirurgias adiadas porque os hospitais estariam ocupados com o atendimento a pacientes com Covid que escolheram não se vacinar.
Para Macron, aquelas pessoas que se opõem à vacina cometem uma "imensa falta moral". "Eles estão minando o que é a solidez de uma nação. Quando a minha liberdade ameaça a dos outros, eu me torno um irresponsável. Um irresponsável não é mais um cidadão", disse o presidente.
A França registrou 271.746 novos casos de Covid-19 na terça-feira, a maior marca desde o início da pandemia. O número alto para os padrões franceses pode ser resultado de um represamento decorrente dos feriados de fim de ano.
Mas a média móvel - recurso que considera os números dos últimos sete dias e, portanto, apresenta um cenário estatístico mais próximo da realidade - também vem batendo recordes consecutivos desde o dia 26 de dezembro. Atualmente, o índice supera 180,5 mil casos por dia, segundo dados do portal Our World in Data.
Pouco mais de 73% dos franceses estão com o esquema vacinal completo. O número é relativamente alto para o país que, historicamente, abriga um forte movimento de resistência às vacinas. Isso significa que a parcela da população que Macron disse ter "muita vontade de irritar" é composta por aproximadamente um quarto do país.
Mas a fala do atual mandatário francês teve repercussões políticas imediatas. O debate a respeito do projeto de lei que prevê a exigência do comprovante de vacinação para o acesso a vários locais públicos estava agendado para esta quarta-feira, mas foi cancelado pelo Parlamento.
"Um presidente não pode dizer essas coisas", disse o líder da oposição, Christian Jacob, do partido Republicanos, de direita. "Sou a favor do passaporte de vacina, mas não posso apoiar um texto cujo objetivo é 'irritar' os franceses."
No campo da esquerda, Macron também foi alvo de críticas. Anne Hidalgo, prefeita de Paris e candidata à Presidência pelo Partido Socialista, republicou uma notícia sobre a fala do mandatário, questionando com ironia seu declarado intuito de "unir os franceses".
O projeto defendido por Macron propõe que um novo passaporte de vacinação substitua o documento atual, eliminando a opção de apresentar um teste com resultado negativo para Covid como certificado de saúde. Se aprovada, a nova lei deve entrar em vigor ainda neste mês.
O plano é exigir que todos os maiores de 12 anos apresentem provas de que foram vacinados caso queiram frequentar restaurantes, museus, academias, cinemas e o transporte público.