Mina Guaíba gera debate sobre impacto ambiental

Entidades denunciam risco de desastres, enquanto empresa garante segurança

Por Isabella Sander

Carboquímica é uma das formas para produção dos compostos
Apesar de antigo, o projeto de instalação do Mina Guaíba, para mineração de carvão, areia e cascalho em área entre Eldorado do Sul e Charqueadas, tem gerado discussões nos últimos meses. O motivo é a solicitação, pela Copelmi Mineração Ltda., de licença prévia da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) para operar no local. Enquanto a empresa garante que todos os estudos feitos comprovam a segurança do empreendimento, entidades alertam para risco de impacto ambiental decorrente da mineração e de potencial contaminação do rio Jacuí e, consequentemente, do Guaíba, do qual o Jacuí é afluente.
Duas audiências públicas já foram realizadas a respeito, uma em Eldorado do Sul e outra em Charqueadas, e ambientalistas pedem que também seja promovida uma terceira, em Porto Alegre – cerca de 80 entidades criaram, inclusive, o Comitê de Combate à Megamineração no Rio Grande do Sul para atentar para o assunto. Para o grupo, a audiência na Capital é importante devido à proximidade do empreendimento, que fica a 20 quilômetros de distância do Centro de Porto Alegre, e ao fato de a cidade ser abastecida pelo Guaíba, que, conforme os críticos ao projeto, pode ser contaminado em caso de eventual rompimento do dique de contenção dos rejeitos.
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https://www.contaminando.minhaportoalegre.org.br/) para reunir de forma simples informações sobre a Mina Guaíba e conscientizar as pessoas sobre o projeto. “Se for construída, esta será a maior mina a céu aberto do Brasil, e ficará a menos de 20 quilômetros do Centro da cidade. É absurdo supor que não vai afetar (o meio ambiente)”, alerta. Cerca de 12 mil e-mails solicitando a audiência foram enviados através do site para a Fepam. Caso o pedido não seja atendido, a rede pretende buscar outros meios de combate, através de processos judiciais ou do Poder Legislativo.
Heverton Lacerda, um dos coordenadores do comitê e integrante da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), afirma que, apesar de ser um projeto grande, a Mina Guaíba é apenas a ponta da locomotiva, o que o preocupa. “Junto dela, há vários outros projetos do polo carboquímico aprovados no Estado em 2017. A ideia é ter várias outras minas funcionando, em cidades como Camaquã e São José do Norte”, cita. A Copelmi já opera, atualmente, duas minas em Butiá, outras duas em Arroio dos Ratos, uma em Charqueadas e outra em Cachoeira do Sul. Em 5 de junho, Dia Internacional do Meio Ambiente, deputados da Comissão de Saúde e Meio Ambiente visitaram uma das minas de Butiá.

Famílias serão desalojadas para instalação do empreendimento

Agricultor há 12 anos no assentamento Apolônio de Carvalho, onde 72 famílias vivem da produção principalmente de arroz orgânico, Marcelo Paiakan diz que boa parte da sua comunidade é contra o empreendimento, não só por ser desalojada, mas principalmente porque pode contaminar a água que abastece 4 milhões de gaúchos. “Sem água, ninguém vive. Essa discussão tem que se espalhar pelo Estado, porque o carvão gera uma energia suja. Em outras partes do mundo, se fecha mineração, e aqui se quer abrir”, reclama. Na opinião de Paiakan, é importante preservar a função social da terra do assentamento, que hoje produz “alimento limpo”, sem agrotóxicos.
O agricultor ressalta, ainda, que as pessoas que hoje são favoráveis ao empreendimento em sua comunidade estão iludidas por promessas de indenizações milionárias. “A terra do assentamento é pública, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), não está escriturada. Não temos a propriedade daquele espaço, só temos o que produzimos”, pontua. Para Paiakan, a indenização será muito inferior à esperada por essas pessoas.
Outro agricultor do Apolônio de Carvalho, que não quis ser identificado, é favorável ao projeto e diz que 43 das 72 famílias a serem reassentadas querem a instalação da Mina Guaíba. “Não tem como sobreviver aqui. Trabalhamos o dia todo na produção de arroz e o dinheiro não dá, ainda temos que trabalhar fora”, lamenta. A escassez de dinheiro se deve, conforme o morador, ao fato de que a terra é arrendada para outras pessoas plantarem e o dinheiro da venda não fica integralmente com a comunidade.
Para o agricultor favorável ao projeto, a Mina Guaíba será boa para a região porque vai gerar empregos e riqueza para os municípios e permitirá que as famílias saiam das condições de escassez, rumando para outros lugares do Estado, onde ganharão terras para cultivar o que bem desejarem. “Queremos que os órgãos ambientais acelerem o processo e permitam logo a instalação da mina, porque aqui ninguém vai para frente sem esse projeto”, avalia.

Mineradora nega impacto nas águas do Jacuí e do Guaíba

A estimativa da Copelmi é criar 331 empregos diretos e 83 indiretos na fase de implantação da Mina Guaíba e 1.154 empregos diretos e 3.361 indiretos durante sua vida útil, de um mínimo de 23 anos e um tempo médio de existência de 30 anos. A extração de carvão mineral servirá para gerar energia e para produção de gás de síntese e fertilizantes.
O gerente de Sustentabilidade da mineradora, Cristiano Weber, ressalta que, se a Fepam assim determinar, a empresa está à disposição para fazer uma audiência pública em Porto Alegre e que já realizou 48 apresentações do projeto. Compreende as críticas como parte do processo democrático. “Hoje em dia, quando se fala em mineração, devido a essas calamidades que aconteceram, é difícil que não haja ninguém contrário”, admite. Weber destaca que a empresa possui um estudo de 6 mil páginas que comprova a segurança doo projeto, “criado de forma responsável e consciente”.
Dentre o que o gerente considera como “fake news”, está o possível impacto em Porto Alegre. “Fizemos modelamento da atmosfera e dos efluentes tratados e lançados no Jacuí, uma série de estudos de solo que comprovam que não há impacto, mas tem gente afirmando que vai, como tem gente que disse que o projeto inclui uma barragem de 30 metros que poderia cair, e não inclui”, salienta. Ao contrário de Mariana e Brumadinho, os rejeitos da Mina Guaíba não serão retidos por uma barragem, e sim enterrados em um nível de 30 a 100 metros subterrâneos. “Não tem como eles saírem dali e pararem dentro do rio. O que há são os efluentes, que bombearemos até a estação de tratamento, que irá tratar e lançar.”
De acordo com Weber, as famílias poderão cultivar, durante o período de transição, em duas áreas diferentes (na antiga e na nova) e dobrar seus ganhos nesse tempo. Promete, também, que elas irão para áreas melhores do que as atuais, e que participarão de todo o processo de escolha das terras, das casas e do cultivo que farão. “Mas é natural que haja pessoas contrárias, porque há valores imateriais na nossa moradia, que não se mensuram economicamente”, observa.
Em nota, a Fepam informou que o processo de licenciamento da Mina Guaíba tramita há quatro anos e passou por diferentes fases de análise técnica, mas que, até este momento, não tem um posicionamento conclusivo ou prazo pré-definido para emissão de parecer final. Declarou, por fim, que a realização de audiência pública em Porto Alegre está sendo avaliada.