{{channel}}
Carreira docente tem baixo interesse no Rio Grande do Sul
Nos últimos dez anos, licenciatura da Ufrgs teve menos candidatos que média geral dos cursos
A carreira de professor está cada vez menos atraente para o estudante que faz vestibular. Com base no número de interessados em cada curso na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), nos últimos anos, é possível verificar que todos os de licenciatura são menos procurados do que o restante das graduações da instituição. Enquanto a densidade de candidatos por vaga, nos últimos dez anos, variou entre 7,6 em Ciências Biológicas e 1,7 em Artes Visuais, a média dos outros cursos foi de 8,1 interessados para cada vaga.
Do vestibular de 2009 até o de 2018, o número geral de interessados na Ufrgs teve a menor média em 2010 (6,6 por vaga) e um pico em 2010 (10). A média geral foi superior à média de cada curso de licenciatura em todos os anos.
Um exemplo do baixo interesse nas licenciaturas é o curso de Educação Física - que, até 2011, possuía divisão entre licenciatura e bacharelado e, em 2012, passou a ter duas turmas abertas por turno, sem distinção entre as formações. O resultado foi que, entre 2011 e 2012, o número de interessados dobrou na turma que, antes, era de licenciatura, passando de 3,7 para 7,4 candidatos por vaga. Já a quantidade de interessados em bacharelado se manteve estável, de 4,9 para 5,5 candidatos por vaga.
No final de julho, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) divulgou estudo sobre a carreira docente. O resultado é que, no Brasil, apenas 5% dos jovens de 15 anos pretendem ser professores da Educação Básica, enquanto 21% pensam em cursar Engenharia. No Peru, o índice dos que pretendem optar pela docência é de menos de 3%, contra 32% que querem se tornar engenheiros. A principal razão apontada é o baixo salário. Por outro lado, em nações onde a profissão é mais valorizada, o interesse tende a ser maior. Na Coreia do Sul, por exemplo, 25% dos jovens têm a intenção de lecionar, e, na Espanha, são quase 20%.
Em meio à tendência de queda, contudo, uma surpresa - entre 2015 e 2016, foi registrado um aumento no número de candidatos na carreira de professor. A explicação, segundo o coordenador das Licenciaturas da Ufrgs, Sérgio Franco, é que o período foi marcado pelo fechamento de licenciaturas em instituições privadas, justamente em função da falta de procura, e a consequente busca maior por aquelas graduações na instituição federal.
A tendência de fechamento não acontece, por outro lado, no Ensino a Distância (EaD). Levantamento da Secretaria Estadual de Educação (Seduc) calcula que, nos últimos dez anos, o número de cursos de graduação nessa modalidade aumentou de 181 para 693. Sem necessidade de espaço físico, essas graduações se tornam mais baratas do que as presenciais. A crítica de instituições como a Ufrgs e universidades privadas, bem como de entidades de classe, é que os cursos a distância teriam viés mais lucrativo do que pedagógico.
Para Franco, o decréscimo de candidatos tem a ver com a desvalorização social da profissão do professor. "O principal emprego para o licenciado é a escola pública, e nem preciso falar da realidade dela hoje. A carreira de professor - talvez a mais importante da sociedade - é mal valorizada socialmente, o que faz com que quem a procure tenha interesses mais ligados a ideais do que a questões concretas", observa. O coordenador salienta que boa parte dos alunos das licenciaturas vem de estratos sociais mais baixos, nos quais os salários e a profissão representam um status maior do que nas classes médias e altas.
Além do baixo interesse, a taxa de evasão também é maior nos cursos de licenciatura. No segundo semestre de 2017, por exemplo, o percentual de evadidos em relação ao de vinculados no total dos cursos da Ufrgs foi de 5,5% (1.761 estudantes). Quando o filtro busca apenas pelas licenciaturas, no entanto, o índice aumenta para 8% de evasão (782 estudantes).
Conforme o coordenador, a separação entre licenciatura e bacharelado no ingresso reduz o número de evadidos. Por isso, a universidade tem feito essa separação. Em 2018, por exemplo, foi lançada graduação em Biologia/Licenciatura. "Na Matemática, a separação tornou a taxa de evasão uma das menores do Brasil", ressalta.
Franco chama a atenção para o resultado do baixo interesse na carreira de professor - a falta de docentes em disciplinas como Física, Matemática e Geografia. "É um grande nó que estamos criando, e a estratégia não pode ser fechar escolas que têm menos alunos, e sim melhorar condições para incentivar que as pessoas se tornem professores", pontua. Para o coordenador, a falta de docentes aumenta a desigualdade social, já que quem fica sem professor é quem não tem condições de pagar um.
Falta de professores no Rio Grande do Sul é maior nas disciplinas de Geografia e Língua Inglesa
A Secretaria Estadual de Educação (Seduc) também sente a redução. Conforme o diretor de Recursos Humanos, José Adilson Santos Antunes, nunca foi feito um levantamento, mas percebe-se que a falta de professor varia conforme a região. Na área que engloba Bagé, por exemplo, há defasagem na formação em História, Geografia, Artes Visuais e Língua Inglesa.
A falta de professores de Geografia é generalizada no Estado. Recentemente, docentes de Língua Inglesa também se tornaram mais escassos. O motivo é a sanção da Lei nº 11.161/2005, que tornou a oferta de aulas de Espanhol obrigatória a partir de 2010. "As universidades começaram a formar professores de Português-Espanhol, e não mais de Português-Inglês", explica Antunes. Com a nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB), porém, será obrigatório o ensino de Inglês, em 2020, a partir do 6º ano do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. A preocupação da Seduc é que não haja educadores para preencher o quadro necessário.
Uma estratégia adotada para amenizar o problema é a contratação emergencial de estudantes, a partir do quarto semestre, em licenciatura que tenha alguma semelhança com a disciplina para a qual há faltas - um graduando de Biologia, por exemplo, pode dar aulas de Química e Física. "Tentamos evitar isso para qualificar o ensino, mas é uma alternativa até que se faça um concurso para repor."
Nos últimos dez anos, entre 2008 e 2017, houve diminuição na procura pelo magistério. Em 2008, havia 15.932 alunos matriculados no Estado. Até 2017, o número caiu para 11.689, com redução de vagas, especialmente, na rede privada. Antunes crê que a principal razão seja financeira. "O próprio piso salarial não é satisfatório, porque qualquer área com Ensino Superior vai pagar mais para 20 ou 40 horas", observa. Para lecionar por 20 horas semanais, o profissional com magistério recebe um salário de cerca de R$ 700,00, mais completivo, até chegar ao valor do piso - hoje, em R$ 1.227,68. Quem possui Ensino Superior completo recebe 85% a mais do que o básico. No fim da carreira, o professor com licenciatura pode receber até R$ 4,2 mil para 40 horas semanais.