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Indústria mantém otimismo, mas enfrenta falta de insumos e alta nos preços
Mesmo assim, segmento de máquinas e equipamentos projeta crescimento de 6% neste ano
Diversos segmentos industriais esperam crescer em 2022 após as medidas mais restritivas quanto ao combate ao coronavírus terem ficado para trás. No entanto, algumas dificuldades estão sendo enfrentadas em determinadas áreas, como a escassez de materiais e a elevação acentuada dos custos, um efeito mundial que também se reflete no Brasil e no Rio Grande do Sul.
Particularmente quanto à falta de insumos, a maior preocupação concentra-se no campo dos eletroeletrônicos. O diretor da regional da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) no Rio Grande do Sul, Régis Haubert, detalha que itens que apresentaram problemas de abastecimento em 2021, como polímeros e metais, não representam mais um obstáculo neste ano. No entanto, no que diz respeito a semicondutores, o dirigente informa que ainda se verifica falta de oferta no mercado. “Não está nada fácil e a previsão é que isso se estenda até o final de 2023”, adianta.
Conforme o diretor da Abinee, a carência desses componentes passa por um aquecimento do mercado da Internet das Coisas (IoT). Ele frisa que a transformação digital que está ocorrendo no mundo hoje está exigindo muitos insumos e as fábricas não estão conseguindo atender às demandas apresentadas. Além disso, outra questão citada por Haubert é a guerra entre Rússia e Ucrânia, países que são grandes produtores de paládio e gás neônio, elementos utilizados na produção de chips. A falta de contêineres, operação padrão da Receita Federal e os elevados valores dos fretes também são fatores que atrapalham o transporte de matérias-primas.
O dirigente adverte que todos os segmentos que utilizam microchips são impactados por essa situação. “Na Abinee, estamos prevendo que haverá uma redução de 10% na oferta de celulares (no mercado brasileiro) neste ano devido ao desabastecimento”, informa Haubert. Ele reforça que a procura continua alta, mas a indústria não tem os componentes para produzir. Essa situação de falta de insumos, assim como aos fabricantes de celulares, pode afetar a produção de automóveis, automação industrial, computadores, entre outras áreas. O dirigente reitera a relevância dos chips para diversas áreas industriais. Ele recorda que, na década de 1980, um automóvel continha de 10 a 15 semicondutores e hoje possui cerca de 300 desses componentes. E esse número deve aumentar exponencialmente com o avanço dos veículos elétricos.
A escassez de semicondutores, segundo o diretor da Abinee, começou no início da pandemia de coronavírus, em 2020, e foi se agravando quando algumas companhias tiveram que parar a produção. Haubert ressalta que a menor oferta de insumos reflete nos custos. “Virou um leilão. As empresas estão buscando os componentes em qualquer parte do mundo e os reajustes em dólar variam de 5% a 250%, conforme o item”, comenta o dirigente. Apesar desses desafios, o diretor da Abinee diz que o setor está otimista e esperando crescimento para este ano. Dependendo do segmento, a perspectiva é de uma evolução de 5% a 15%, em âmbito nacional, com o Rio Grande do Sul devendo ter um desempenho semelhante.
O vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos da regional Rio Grande do Sul (Abimaq-RS), Hernane Cauduro, comenta que o problema de fornecimento de insumos do setor diminuiu em relação ao ano passado, apesar de continuar principalmente na área eletroeletrônica. O dirigente relata que esse segmento tem apresentado reprogramações e prazos de entregas muito longos em razão das dificuldades de abastecimento, sobretudo de semicondutores, que são materiais básicos de qualquer componente eletrônico.
O integrante da Abimaq-RS também aponta reflexos nos custos dos produtos. “Na medida que acontece uma oferta muito menor do que a demanda, a tendência natural é o aumento de preços”, argumenta. Cauduro admite que é difícil mensurar precisamente essa elevação, porque é uma vasta quantidade de chips e semicondutores que são usados pela indústria. Mesmo com esse empecilho, o dirigente revela que a previsão de crescimento em faturamento para o setor de máquinas e equipamentos no Brasil para 2022 é de cerca de 6%, sendo boa parte desse desempenho suportado pelas exportações. No entanto, Cauduro salienta que o resultado tem surpreendido positivamente até agora e não descarta que a projeção para o ano seja revisada para cima, o mesmo ocorrendo com o Rio Grande do Sul, que deve ter uma performance até melhor do que a nacional.
“Uma boa parte desse incremento, no Estado particularmente, será puxada por máquinas agrícolas”, prevê o vice-presidente da Abimaq-RS. Ele lembra que em torno de 60% do que é produzido nessa área no País é proveniente do Estado. Uma prova que esse setor está aquecido, salientada por Cauduro, foi a feira Agrishow, realizada em Ribeirão Preto (SP) no mês passado e que gerou um recorde em negócios de R$ 11,2 bilhões.
Quanto à Covid-19, o representante da Abimaq-RS diz que o assunto ainda gera apreensão. “Claro que já aprendemos a conviver melhor com isso, não tem as radicalizações de fechar, bloquear ou parar, mas preocupa sim”, afirma. Ele frisa que, apesar dos índices de mortalidade da doença terem despencado, se percebe um novo aumento dos contágios.
Elevação das resinas reflete no mercado de produtos plásticos
Um setor que não enfrenta a escassez de matérias-primas, mas passa por fortes aumentos dos preços delas, é o do plástico, que tem como principal insumo as resinas termoplásticas. “O que acontece com os combustíveis, ocorre com o nosso material, é algo bem similar. Então, a gente está realmente sofrendo bastante”, afirma o presidente do Sindicato das Indústrias de Material Plástico no Estado do Rio Grande do Sul (Sinplast-RS), Gerson Haas.
Ele acrescenta que é complicado repassar os aumentos para o consumidor final que, muitas vezes, para de comprar o produto. O dirigente reforça que artigos básicos, como os combustíveis e a energia elétrica, têm subido acima da renda do trabalhador. Haas defende que caberia, para atenuar o cenário, uma melhor configuração da tributação que incide sobre o setor industrial, até para não prejudicar a geração de postos de trabalho que essa área proporciona.
Haas diz que o aumento dos custos das resinas termoplásticas neste ano foi na ordem de 23%. Ele recorda que essas elevações vêm sendo frequentes. “Durante a pandemia tivemos mais que o dobro de incremento, em torno de 130%”, afirma o presidente do Sinplast-RS. Ele ressalta que a guerra da Rússia e Ucrânia também tem impactado, mais recentemente, o mercado de derivados de petróleo.
Quanto ao coronavírus, Haas pondera que a situação está voltando a preocupar. Ele lembra que, se a propagação da Covid-19 retornar a patamares mais altos, muitas indústrias terão dificuldade quanto à mão de obra. Particularmente quanto ao Rio Grande do Sul, o dirigente teme que as baixas temperaturas do inverno possam agravar o cenário. No Rio Grande do Sul, operam atualmente cerca de 1,25 mil empresas transformadoras de plástico que geram aproximadamente 25 mil empregos diretos. Já no Brasil, o total é de em torno de 25 mil companhias dessa natureza, que significam quase 350 mil postos de trabalho diretos.
Exportações têm sido opção para alcançar melhores performances
Com um fator cambial atrativo para as empresas mirarem no mercado externo, as exportações têm se mostrado uma estratégia interessante para vários segmentos industrias, entre os quais o de calçados e seus componentes. O presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira, enfatiza que a primeira metade do ano tem sido positiva para o setor e as vendas externas têm contribuído para uma perspectiva otimista para 2022.
Ele assinala que a expectativa é fechar o ano com um incremento de 2,3% na produção nacional de calçados, alcançando cerca de 825 milhões de pares fabricados. O dirigente estima que o desempenho da indústria calçadista gaúcha deve acompanhar o nacional. Ferreira antecipa que o crescimento deverá ser puxado pelas exportações, que devem apresentar uma evolução de 9,3% em volumes e 10,5% em valores.
Após uma queda expressiva de mais de 18% em 2020, efeito direto da pandemia, em 2021 o setor já havia registrado um incremento de 31,9% nas exportações, totalizando 123,7 milhões de pares, superando os níveis da pré-pandemia, em 2019, em 7,3%. A dinâmica da recuperação internacional tem sido mais rápida do que no mercado interno. No ano passado, as exportações cresceram cerca de cinco vezes mais do que o consumo doméstico.
Já em março de 2022, foram embarcados 13,17 milhões de pares ao exterior, que geraram US$ 111,6 milhões, resultados superiores tanto em volume (57,5%) quanto em receita (7%) em relação ao mês correspondente do ano passado. Com isso, no trimestre, as exportações de calçados já somaram 40,74 milhões de pares, gerando US$ 320,65 milhões, incrementos de 27,3% e de 65,8%, respectivamente, ante o mesmo período de 2021.
Conforme Ferreira, entre os principais destinos para as vendas externas dos calçados nacionais estão Estados Unidos, Argentina e França. “Os Estados Unidos, particularmente, parecem que redescobriram o Brasil como fornecedor internacional”, frisa o presidente da Abicalçados. Ele detalha que essa situação se deve, em parte, ao fato da Ásia ter sofrido muitas dificuldades em manter seu comércio exterior devido à pandemia. A logística mais fácil entre os empreendedores brasileiros e norte-americanos é um diferencial quanto às exportações.
A superintendente da Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal), Silvana Dilly, também enfatiza que para as empresas de componentes as exportações se apresentam como uma excelente oportunidade. Ela lembra que o Rio Grande do Sul representa cerca de 50% dos componentes que são exportados pelo País. “E acho que existe uma avaliação das pessoas sobre as condições de fabricação dos produtos que elas compram e hoje o Brasil é referência na parte de sustentabilidade”, afirma Silvana.
As exportações de componentes, após crescerem 22% no ano passado, no comparativo com 2020 (para mais de US$ 410 milhões), tiveram os embarques aumentando 16% no primeiro trimestre (para US$ 105,6 milhões) de 2022. No trimestre, o principal destino das exportações brasileiras de componentes foi a China, com US$ 23,3 milhões gerados, 18% mais do que no mesmo período de 2021.
O segundo mercado mais procurado foi a Argentina, para onde foram exportados o equivalente a US$ 22,55 milhões, 58% mais do que no mesmo período do ano passado. Com incrementos de 23%, as exportações para Portugal somaram US$ 12,5 milhões no trimestre. Completando o ranking dos destinos dos componentes brasileiros no exterior, a Colômbia importou o equivalente a US$ 2,15 milhões nos três primeiros meses do ano (40% a mais).
Ainda no primeiro trimestre, os cabedais foram os principais produtos embarcados, somando US$ 25,74 milhões em exportações, 52% mais do que no mesmo período de 2021. Na segunda posição aparecem os químicos para calçados (adesivos), que geraram US$ 10,34 milhões, 43% mais do que no mesmo período do ano passado. Em terceiro lugar estão os laminados sintéticos (US$ 9,35 milhões, incremento de 45% ante 2021) e na quarta os solados (US$ 6 milhões, alta de 171% comparado ao ano passado).
Respondendo por quase 50% do valor gerado com as exportações de componentes no primeiro trimestre, o Rio Grande do Sul foi o maior exportador do setor no período. No total, saíram das fábricas gaúchas rumo ao exterior o equivalente a US$ 52 milhões, 5% mais do que no mesmo período de 2021.
Abastecimento no setor calçadista está regularizado
Sobre a oferta de insumos para a área de calçados, o presidente executivo da Abicalçados, Haroldo Ferreira, recorda que houve uma dificuldade nesse sentido no ano passado, que foi resolvida em 2022. “Agora o que tem é a inflação dos materiais, como a inflação de tudo no nosso País”, aponta o dirigente.
Ele admite que esses custos, que vêm aumentando na casa de dois dígitos (acima de 10%), estão ficando “pesados” para a indústria. Segundo o dirigente, o Índice de Preços ao Produtor (IPP) do setor calçadista no ano passado foi na ordem de 24%. Entre os materiais que estão ficando mais onerosos para o segmento, o presidente da Abicalçados cita os derivados de petróleo, cabedais, solados e adesivos.
A superintendente da Assintecal, Silvana Dilly, confirma que a situação do abastecimento de insumos está regularizada. O cenário começou a se estabilizar já a partir do início de 2022. Contudo, a dirigente admite que ainda se verifica, em algumas ocasiões, a prorrogação de prazos de entrega de materiais. “Mas, não existe falta”, reitera Silvana.
Ela considera que a situação foi normalizada, especialmente, por uma produção mais constante do setor calçadista. A representante da Assintecal recorda que, além da pandemia de coronavírus, no ano passado ocorreu o encalhamento do navio Ever Given, no Canal de Suez, que atrapalhou o fluxo de matérias-primas oriundas da Ásia para o Brasil.
Silvana argumenta ainda que os custos da cadeia são impactados por fatores como a variação cambial, preços dos fretes marítimos, entre outros. A dirigente ressalta que o setor é composto por segmentos distintos, entretanto se fala em impactos de custos na ordem 15% a 25%, neste ano. “É o que a gente está vendo no varejo, o que a gente vê na etiqueta do produto final, na parte de vestuário e calçados, foi isso que aumentou”, diz a superintendente da Assintecal.
Para Silvana, a sustentabilidade é uma das chaves para a indústria nacional continuar competitiva nesse ambiente. O programa Origem Sustentável tem empresas de componentes e calçados certificadas e é a única certificação da cadeia do calçado em todo o mundo. No setor de componentes estão certificadas: Boxprint, Caimi & Liaison, Bertex, Tintas Killing, Perfil Injetados e Fibertex. Pesquisa realizada pelo The Business Research Company apontou que a indústria da moda é responsável por cerca de 10% das emissões de gases do efeito estufa, consome quase 80 bilhões de metros cúbicos de água por ano e recicla menos de 1% do que produz.