Prazo apertado para reformas na Usina do Gasômetro

Obra precisa ser entregue até agosto de 2020, sob risco de perder recursos da CAF

Por Igor Natusch

Intervenções, que ainda não começaram, devem levar cerca de um ano
Agosto de 2020. Quando o assunto é a Usina do Gasômetro, esse é o prazo que surge em todos os contatos com diferentes órgãos da prefeitura de Porto Alegre. Em resumo, o município dispõe de um ano e três meses para concluir a revitalização do prédio histórico, localizado à beira do Guaíba, sob pena de perder os recursos destinados pela Corporação Andina de Fomento (CAF) para esse fim. Seria um desfalque significativo, já que o convênio deve bancar cerca de R$ 12 milhões (ou US$ 3 milhões) dos R$ 15 milhões previstos para as intervenções.
A previsão de Luiz Armando Capra Filho, diretor da Usina do Gasômetro, é que as obras que devolverão a Usina aos porto-alegrenses durem cerca de um ano. Quando da apresentação do projeto, em agosto de 2016, o prazo previsto era mais amplo, de até 18 meses. Até o presente momento, foram feitos trabalhos de prospecção e mapeamento estrutural, mas as intervenções propriamente ditas ainda não tiveram início. "Estamos com um cronograma justo", admite.
Assim, a revitalização passa a ser questão de resolver uma urgência de cada vez. No momento, os esforços são para colocar o edital das obras na rua. O projeto, preparado pela empresa 3C Arquitetura e Urbanismo, foi aprovado por órgãos municipais e estaduais ligados ao patrimônio histórico, e atualmente passa por avaliação da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Mobilidade. Após o aval da pasta, que não tem data marcada para ocorrer, a papelada vai para a Central de Licitações da prefeitura, que conduzirá a concorrência. A expectativa é que esse processo ocorra em até 30 dias, de forma que as obras possam começar, no cenário ideal, até o final de julho.
A maior parte das alterações no prédio, diz Capra, são no sentido de adequá-lo às exigências do Plano de Prevenção Contra Incêndio (PPCI). Para isso, será necessária a instalação de escadas em pontos específicos, que permitam um deslocamento rápido a partir das salas dos andares superiores. "Essa será uma das intervenções mais importantes", considera. O Corpo de Bombeiros participa de todas as etapas, tentando ao máximo evitar embargos que atrasariam ainda mais o apertadíssimo cronograma.
Pelo plano da reforma, as atividades da Sala PF Gastal migrarão do terceiro andar, onde ocorriam anteriormente, para o primeiro andar. A decisão, afirma Capra, busca dar conta das necessidades de esvaziamento do cinema em caso de emergência, uma vez que a antiga localização era desfavorável a uma rápida evacuação. O espaço também passará por uma requalificação de equipamentos, adotando plataformas digitais para a exibição de filmes.
Antiga expectativa da comunidade artística gaúcha, o Teatro Elis Regina é um das áreas que devem receber destaque na reabertura da Usina. O espaço, com capacidade prevista de até 400 pessoas, ficará no segundo andar do prédio, onde estava localizado o mezanino, e em cima da chamada Galeria dos Arcos, que recebia exposições fotográficas. As salas dos andares superiores também passarão por readequações, e há a perspectiva de um empreendimento gastronômico no quarto andar, na parte que fica de frente para o Guaíba.
Melhorias elétricas e hidráulicas, tentando neutralizar as infiltrações no prédio, completam a lista de tarefas a cumprir. Tudo consideravelmente mais simples, em comparação com o ambicioso (e caro) projeto original, baseado na Tate Modern Gallery de Londres e que não cabia no orçamento obtido junto à CAF. Foi preciso elaborar um novo trabalho, o que exigiu o pagamento de um aditivo por parte da prefeitura.
Outro aspecto delicado da futura reforma refere-se ao terraço, localizado no quarto andar da Usina. Com a passagem do tempo, a laje sofreu deformações que fizeram o acesso inseguro - além de interferir diretamente na estrutura do Teatro Elis Regina, uma vez que o piso do terraço corresponde ao teto da sala de espetáculos. A consolidação da laje, aponta Capra, é fundamental para garantir vida longa ao edifício.
A Usina do Gasômetro foi inaugurada em 1928. Apesar do nome, fazia uso de carvão mineral para iluminar as ruas e residências da cidade. Encerrou as atividades de forma definitiva em 1974, e chegou a ser cogitada a demolição do prédio para a ampliação da avenida Perimetral. Em 1982, a Eletrobras, que detinha a posse do prédio, fez a cessão definitiva ao município, que procedeu o tombamento e, em 1991, transformou a Usina em centro cultural.

Fora do prédio há dois anos, Usina das Artes não sabe se voltará ao local

A garantia da gestão da Usina do Gasômetro é de que o caráter de equipamento cultural será plenamente mantido, com a retomada de todas as atividades lá realizadas antes do fechamento, em 2017. Essa garantia se estende ao programa Usina das Artes, que existe desde 1993 e promove, a partir de lei específica, a oferta de estrutura física e suporte financeiro para grupos de dança, teatro, circo e música.
O projeto funcionava em algumas das salas da Usina do Gasômetro, mas, há dois anos, mudou-se para a antiga escola municipal Santa Terezinha, no bairro Farroupilha. O último edital do Usina das Artes ocorreu em 2016, e as cerca de 50 pessoas ainda ligadas ao programa têm dúvidas se voltarão, de fato, ao Gasômetro algum dia.
"Eu não vejo nenhuma perspectiva", dispara Alexandre Dill, integrante do grupo de experimentação teatral Grupojogo e figura atuante no Usina das Artes. Ele tem dúvidas, inclusive, se o caráter cultural será preservado, já que um decreto de 2018 retira o Centro Cultural Usina do Gasômetro da estrutura da Secretaria Municipal de Cultura, o que seria indicativo de alterações mais profundas no caráter do espaço. 
Dill explica que, quando foi colocada a necessidade de sair da Usina para as reformas, espaços como o Centro Cenotécnico foram oferecidos ao projeto. Desde que foi definida a nova sede, a participação da prefeitura tornou-se quase nula, critica. Atualmente, o grupo promove oficinas e organiza uma agenda de atividades, já levando em conta a permanência em definitivo no atual espaço.
"Antes, ainda havia esperança no poder público, mas a gente percebeu que não vai ser possível. Acho que o secretário (municipal da Cultura, Luciano Alabarse) nunca esteve aqui. Eles (prefeitura) não devem nem ter mais a chave, já que, quando alguém quebra o cadeado do portão, a gente é que tem que repor", ironiza Dill.
No momento, a prefeitura informa que estuda um modelo terceirizado para a administração da Usina. As premissas, desenvolvidas em parceria com o Instituto Odeon, colocariam a prefeitura como ente fiscalizador. As conclusões da consultoria, porém, não foram publicizadas até o momento.