Nova versão pode desidratar a Previdência

Até Bolsonaro passou a atuar para dar novo tratamento a categorias da segurança pública

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Relator Samuel Moreira (d) enfrenta pressões para mexer no texto
Às vésperas da apresentação da nova versão da reforma da Previdência, estão sendo negociadas mais mudanças que desidratam a proposta. Até mesmo o presidente Jair Bolsonaro (PSL) passou a atuar para que novas regras de aposentadoria de policiais e demais categorias da segurança pública sejam debatidas num segundo momento - junto com o projeto de lei que trata da reforma para militares.
Diante da pressão de parlamentares e interlocutores de instituições financeiras, a nova proposta poderá poupar fintechs e corretoras, por exemplo, do aumento de tributação - a CSLL (contribuição social sobre o lucro líquido). Assim, o texto deixaria claro que a elevação da alíquota valeria para bancos grandes e médios.
Segundo pessoas que participam das negociações, o relator da reforma, deputados Samuel Moreira (PSDB-SP), deverá ceder - nesta ou na próxima semana - ao pedido de parlamentares por mudanças nas regras de aposentadoria especial de congressistas.
Nesta terça-feira, Moreira divulgou um relatório no qual não cedia a pressões da bancada da bala - ligada a corporações da segurança pública - nem ao lobby do setor financeiro e dos próprios parlamentares.
Mas o texto não agradou a líderes que representam a maioria da Câmara e novas desidratações da reforma começaram a ser negociadas logo no início desta quarta. A articulação por regras mais suaves para policiais envolve o PSL, partido de Bolsonaro, e o próprio presidente.
Por causa da reforma da Previdência, policiais federais protestaram ontem e gritaram palavras de ordem contra o capitão reformado. Um grupo marchou em direção ao Congresso enquanto gritava: "Acabou o amor, Bolsonaro traidor".
As mudanças nas regras de aposentadoria das Forças Armadas, policiais militares e bombeiros dos estados estão em um projeto de lei ainda travado na Câmara.
A proposta tem uma regra de transição mais suave que para servidores públicos e da iniciativa privada, que estão numa Proposta de Emenda à Constituição (PEC), cujo relator é Moreira.
Deputados que participam da articulação dizem que o presidente pediu que o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, conversasse com Moreira e com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para tirar os policiais federais da PEC.
A ideia defendida pelo presidente e deputados do PSL é que, após a aprovação da PEC, haja uma discussão única - no projeto de lei - sobre a reforma para o setor de segurança pública.
Mas a respeito do alívio na tributação para algumas instituições financeiras, as discussões estão mais avançadas e devem ser apresentadas no novo relatório. Representantes de bancos de menor porte e fintechs - empresas de tecnologia e inovação ligadas ao setor financeiro - acompanham com atenção a elaboração do parecer e apresentaram demandas ao relato.
Essas instituições pediram para ser poupadas da alta de alíquota da CSLL dos bancos. O reajuste foi incluído no texto por Moreira para cobrir parte do rombo da Previdência.
A proposta incomodou a equipe econômica que não queria misturar uma questão tributária no projeto de reestruturação do sistema de aposentadorias. Maia também chegou a defender mudanças na alta de alíquota do tributo para o setor financeiro.
Sobre a aposentadoria dos parlamentares, está em estudo abrir a possibilidade de que políticos possam sair do regime especial, ir para as regras dos trabalhadores da iniciativa privada, mas recebendo - com correção pela inflação - boa parte dos recursos que foram pagos como alíquota previdenciária durante o período no sistema dos congressistas.

Projeto quer vetar aposentadoria especial de parlamentar condenado por corrupção

O Podemos quer modificar as regras do plano de previdência parlamentar para impedir a aposentadoria de deputados e senadores cassados e condenados em instância superior pelo Poder Judiciário, por envolvimento em casos de corrupção. Pelo projeto, esses parlamentares seriam excluídos do Plano de Seguridade Social dos Congressistas (PSSC).
Na segunda-feira, o Senado concedeu aposentadoria especial ao ex-senador Delcídio Amaral (ex-PT/MS). Ele foi cassado em 2016 por quebra de decoro - por tentar obstruir a investigação da Lava Jato no episódio do suposto favorecimento ao ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró.
Delcídio vai receber benefício mensal bruto de R$ 11,5 mil, equivalentes a um terço da remuneração dos senadores em atividade (R$ 33,7 mil). Ele foi líder do governo Dilma no Senado. Preso em novembro de 2015, conseguiu a liberdade em fevereiro do ano seguinte quando fechou acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República.
Em sua delação, Delcídio disse que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria participado do esquema para comprar o silêncio de Cerveró. Lula acabou absolvido.
"Neste momento em que se discute a reforma da Previdência e todos estão conscientes de que há que se fazer sacrifícios para garantirmos um sistema de aposentadoria saudável às futuras gerações, é preciso rever também esses casos de aposentadorias de parlamentares envolvidos em esquemas de corrupção", afirma a deputada Renata Abreu.
Um dos autores do projeto, o deputado federal José Nelto (GO), líder do Podemos na Câmara, anota que o partido estuda apresentar requerimento para que a matéria tramite em caráter de urgência, o que dispensaria algumas formalidades regimentais e daria celeridade à votação da proposta.
"Não é justo nem socialmente aceitável que um parlamentar que tenha um mandato interrompido por cassação e que tenha sofrido condenação criminal por corrupção logre ver o fim de sua carreira política premiado por uma aposentadoria especial."