Ibovespa cai 1,75% e atinge piso negativo do ano

Em meio a preocupações com cenário político, mercado manteve desconforto da véspera e recuou para 90.024 pontos

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Em mais um dia de queda gerada por fatores domésticos, o Índice Bovespa atingiu seu menor nível em 2019 nesta quinta-feira. Mesmo sem notícias de relevo no campo político, o mercado manteve o desconforto da véspera e teve um pregão com momentos de estresse, principalmente no meio da tarde, quando o movimento vendedor ganhou maior força. Ao final dos negócios, o índice marcou 90.024 pontos, com queda de 1,75%. Os negócios somaram R$ 16,7 bilhões, o maior em mais de um mês.
A percepção corrente no mercado é que o governo enfrenta um processo de desgaste, mas não reage adequadamente diante do quadro adverso. Segundo avaliam analistas, nas dificuldades na coordenação política, nas manifestações populares e no caso das investigações sobre seu filho Flávio, Bolsonaro vem dando sinalizações que não o ajudam ou acabam por gerar mais ruído. A expressão "idiotas úteis", utilizada na quarta-feira pelo presidente para definir os manifestantes contra o contingenciamento de verbas da educação, ainda ecoou no mercado como uma comunicação inadequada. Até mesmo a viagem do presidente a Dallas, onde foi homenageado, foi citada como sinalização negativa.
Um fator específico foi um agravante significativo para o Ibovespa no período da tarde. As ações da Vale passaram a registrar perdas fortes após a notícia de que a mineradora informou ao Ministério Público de Minas Gerais sobre uma deformação na estrutura na Mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais, "passível de provocar a sua ruptura". No documento, a empresa estimou que se as condições se mantiverem, a ruptura da estrutura poderá ocorrer no período de 19 a 25 de maio. Ao final do pregão, Vale ON teve queda de 3,23%. Influenciado pela ação da mineradora, o Ibovespa chegou a bater mínima de 89.778 pontos (-2,01%).
O analista da Eleven Financial, Raphael Figueredo, afirma que o mercado já vinha de uma inércia desde o início do dia, repercutindo os fatos da véspera e o desânimo do investidor diante dos sucessivos indicadores econômicos apontando para a estagnação da economia. No meio da tarde, o evento da Vale fez despencar as ações da mineradora e contaminou outras ações, afirma.
"O dia não teve grandes novidades e essa ausência acabou por contribuir para o desempenho negativo. A queda das ações da Vale contagiou o Ibovespa não apenas pelo seu peso na carteira do índice, mas também do ponto de vista do humor do investidor em relação aos outros papéis", disse Figueredo.

Dólar fecha acima de R$ 4,00 pela primeira vez desde o início de outubro do ano passado

O dólar fechou a quinta-feira em R$ 4,0357, maior patamar desde 1 de outubro, antes do primeiro turno das eleições presidenciais. A moeda americana teve valorização de 1%, impulsionada pelo viés negativo do mercado brasileiro.
Nos últimos dias, o governo Bolsonaro tem sofrido derrotas que colocam em xeque a aprovação da reforma da Previdência e a melhora da economia. Com a preocupação de investidores, a moeda americana chegou a R$ 4,0430 durante o pregão.
Na terça-feira, oposição e centrão aprovaram a convocação do ministro da Educação, Abraham Weintraub, para o plenário da Câmara prestar esclarecimentos do bloqueio de R$ 7,3 bilhões na pasta aos 513 parlamentares.
Inicialmente, Weintraub falaria na comissão de educação e foi surpreendido pela convocação. A intenção do PSL, partido do presidente, era derrubar a deliberação e impedir que o ministro fosse obrigado a vir, mas foi derrotado por 307 votos a 82. O episódio deixou investidores cautelosos com a aprovação da reforma da Previdência, que depende da boa articulação do governo com o centrão.
Outra questão que impacta o andamento da reforma é citação ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em delação premiada de Henrique Constantino, sócio da companhia aérea Gol. Segundo Constantino, Maia teria recebido propina da empresa.
"Se temos alguma aprovação da reforma é responsabilidade do Maia. A articulação é dele. Se este inquérito for mais a fundo afeta muito o panorama", diz Fabrizio Velloni, chefe da mesa de operações da Frente Corretora.
Para o economista, a investigação que envolve Maia preocupa mais que a de Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente. "O risco ao governo neste caso é mais indireto. A princípio, pode apenas respingar no presidente", afirma Velloni.
Flávio teve quebra de sigilo bancário e fiscal decretada pela Justiça. O processo dá início a investigação judicial após um relatório do governo federal, há quase 500 dias, ter apontado movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta bancária do assessor Fabrício Queiroz. Os dados financeiros atingem ao menos cinco ex-assessores de Bolsonaro.
Dados fracos da economia também derrubaram o mercado brasileiro. Na quarta-feira, o Banco Central divulgou que a atividade econômica brasileira registrou retração de 0,68% no primeiro trimestre. O IBC-Br (Índice de Atividade Econômica do Banco Central) recuou na comparação de março com fevereiro, apresentando queda de 0,28%.
"O governo não apresenta medidas efetivas que possam melhorar a economia. O problema não é a reforma da Previdência, o problema é o déficit fiscal. Se gasta mais do que arrecada. Você pode acertar isso com a reforma e corte de gastos, alguma coisa tem que ser feita", afirma Pedro Coelho Afonso, economista-chefe da PCA Capital.