Com 'Poerotisa', Ana Dos Santos concorre ao Prêmio Ages de Livro do Ano

Poetisa porto-alegrense também apresenta novo título com poemas negros e eróticos

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Poetisa porto-alegrense também apresenta novo título com poemas negros e eróticos
Uma autora que tem chamado muita atenção na cena literária em Porto Alegre nos últimos anos é a poetisa Ana Dos Santos. Escritora que costuma versar sobre as questões de ser uma mulher negra, ela foi presença requisitadíssima nas lives literárias dos últimos dias em função da Feira do Livro e em alusão ao 20 de novembro - Dia da Consciência Negra. Na última delas, por uma educação antirracista, inclusive, ela convidou para o sarau Sopapo Poético - evento que lhe deu visibilidade e foi deixando sua marca mais conhecida - em homenagem a Giba Giba, nesta quinta-feira (19), às 19h30min, com transmissão online ao vivo pela página Afroativos no Facebook.
"Eu já fui mais ativa no grupo do Sopapo Poético, mas agora só apoio mesmo Eu trabalho com vários coletivos poéticos. Participo também do Verso Livre do Slam. O slam também moldou minha escrita, mas não sou slammer, não participo das competições. Até competi uma vez, no Slam do Gozo e ganhei um prêmio", narra a professora de Literatura.
Nesta sexta-feira (20), a partir das 15h, a poetisa é uma das atrações culturais da Marcha Virtual Zumbi/ Dandara - A Roda da Vida Pelo Bem Viver, parte programação da XI Semana da Consciência Negra da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul - acompanhe pela TV AL ou YouTube. Marietti Fialho e Rafuagi são artistas que trazem trilha musical para a roda.
Ana também é um dos nomes selecionados pelo projeto Desarquivando: Escritoras negras em destaque (edição digital), exposição virtual do site do Arquivo Histórico de Porto Alegre. Ela ainda é finalista do Prêmio Ages Livro do Ano na categoria Poesia, com Poerotisa (62 págs., R$ 59,99), lançado em junho de 2019 pela Editora Figura de Linguagem, que publica autores negros e é identificada com a questão feminista, com uma política interna voltada ao antirracismo e ao combate às desigualdades de gênero e à LGBTfobia. Os vencedores da premiação serão conhecidos em 28 de novembro.
Além de tudo isso, no mês passado, a autora porto-alegrense lançou Pequenos grandes lábios negros (80 págs., R$ 30,00), obra que integra a coleção Mulherio das Letras, publicada pela Venas Abiertas Editora Popular, de Minas Gerais. Dividida em três partes, intituladas Poeróticos, Língua e Poenegros, a obra mais recente aprofunda alguns dos temas abordados em Poerotisa, publicação que celebra a voz feminina e feminista da poética negra. O livro anterior também trazia poemas divididos em três partes: Raiz (falando sobre a origem indígena e africana), Fruto (relação com maternidade e ser mulher negra) e Flor (em que compartilha sentimentos e visões de mundo). Em um deles, ela escreve os versos: "A escrita é a minha salvação, é justiça feita pelas próprias mãos".
Sua primeira obra publicada, Flor (Corpos Editora, 2009, Porto/Portugal) foi lançada por um concurso chamado Ministério da Poesia, de um grupo virtual de poesia chamado World Art Friends. "O prêmio foi a publicação, mas agora está esgotado. As 'flores' estão sempre presentes na minha escrita. Em muitas cosmovisões matriarcais, a flor representa a 'Deusa', a Terra, que também pode se denominar Gaia, Pachamama ou Oxum. A flor da capa de Poerotisa é uma vagina mesmo, é a matriz geradora da vida. A última parte do livro se chama Flor por ser Eros o seu percurso em encontro com Afrodite", conta Ana.
Ela costuma ser classificada como "poeta erótica" e comenta o fato: "Esse tema do erotismo na Literatura ainda é cheio de melindres". A porto-alegrense diz que a chamam assim porque parece que os poemas que mais impressionam os leitores são os poemas eróticos que escreve. "O que aconteceu no Poerotisa sintetiza bem o que o mercado editorial faz com classificações em caixinhas da Literatura. Os editores estavam mais interessados nos meus poemas negros para 'vender' a editora antirracista. E deliberadamente excluíram quase todos os poemas eróticos, justo aqueles que os leitores mais gostavam. Eu escrevo há 20 anos e já fiz várias performances com esses poemas eróticos. Os leitores me questionaram 'e aí, cadê os poemas eróticos?'. O que digo para todos: sofri uma 'circuncisão do meu clitóris poético'. Mas, como as Deusas não dormem, a editora Karine Bassi da Editora Venas Abiertas de Minas Gerais (finalista do Jabuti 2020) me convidou para publicar esses e outros poemas na Coleção II do Mulherio das Letras. O meu terceiro livro Pequenos grandes lábios negros é esse clitóris que os leitores queriam, um clitóris negro, diga-se de passagem, com 'poenegros' também e muita língua 'pretuguesa'."
Muitos poemas da escritora parecem ser produzidos em regime de urgência, com versos e imagens viscerais, mas, ao mesmo tempo, na sua fala, demonstra intenção em abordar determinados temas: "Meu processo de escrita às vezes é visceral mesmo, preciso correr e escrever logo os versos, as imagens, as palavras. Depois deixo 'descansar' como uma massa de pão. Volto e leio diversas vezes. Reescrevo ou dou uma lapidada. Pode estar pronto, ou 'abatumar'". Ela relata que, em função do slam, começou a ler seus poemas em voz alta, e daí começou a encontrar a métrica que encaixa as palavras: "O slam é uma escola de poesia. Mas, também tenho projetos, como a negritude, o feminismo, o erótico. Gosto de pesquisar, ler, assistir filmes e escutar muita música, que é minha maior inspiração".

Poetisa trovadora e amadora que rima sofrimento com contentamento

"Às vezes a vida/ me arranca palavras/ e eu as faço macias/ transformo em poesia/ Alivio a dor com amor/ rimo sofrimento com contentamento/ e assim sou poetisa amadora" são alguns versos de um poema sem título da obra Poerotisa (Figura de Linguagem, 2019), de Ana Dos Santos, que concorre ao Prêmio Ages de Livro do Ano em 28 de novembro, junto com Anna Mariano (Apenas por nós choramos) e Ricardo Silvestrin (Sobre o que).
Professora e contadora de histórias, a poetisa é formada em Letras, pela Ufrgs, e ministra aulas de Literatura Brasileira no Ensino Médio do Colégio Estadual Júlio de Castilhos. Ana cursa atualmente mestrado em Estudos Literários Aplicados do Programa de Pós-Graduação em Letras da Ufrgs. Ela faz parte do catálogo Intelectuais Negras Visíveis (UFRJ) e é Acadêmica de Letras do Brasil/Rio Grande do Sul na cadeira 100, com a patrona Lélia Gonzales.
Ela ficou conhecida pelas participações no sarau negro Sopapo Poético, onde também é contadora de histórias no Sopapinho. Iniciou na poesia vendendo poemas na noite boêmia da Lapa e Santa Tereza (RJ), onde também fazia performances poéticas com o Circo Beat (2000). Colou poemas nas ruas de várias cidades brasileiras. Participou com outros poetas e fotógrafos brasileiros da obra Brazil by night (SP, 2008). Tem publicações no Livro da Tribo (2011), Cadernos do Instituto de Letras (Ufrgs, 2003), duas antologias poéticas (Águia – Prosa e Verso, 2009, e Sopapo Poético, 2015).
JC - Adotaste a expressão "Flor do Lácio" (imagino que aludindo à língua portuguesa) para teu e-mail e teu perfil de