Laboratório virtual propõe soluções ao saneamento

Projeto em Porto Alegre levanta ideias para o abastecimento de água

Por

Brasil tem mais de 100 milhões de pessoas sem acesso a esgoto tratado
A carência no abastecimento de água, especialmente em regiões periféricas de grandes cidades, ficou evidente com a crise sanitária provocada pela pandemia de Covid-19, mas o problema é anterior. Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis) de 2018 apontam que no Brasil 35 milhões de pessoas não têm acesso à água tratada, número que sobe para mais de 100 milhões sem acesso à rede de esgoto.
A solução, contudo, não depende de uma fórmula que se aplique de maneira uniforme a todas as comunidades, que enfrentam o problema sob diferentes aspectos. Em alguns casos, por exemplo, a área é urbanizada e conta com rede de abastecimento de água, mas o serviço é intermitente, falta água com frequência e a qualidade é ruim. Em vilas mais precárias, não há sequer a rede de abastecimento ou coleta de esgoto por não serem regularizadas - condição estabelecida pelo poder público para a prestação dos serviços.
Será a partir de cenários como estes, que representam situações reais de Porto Alegre e contemplam características comuns a muitas cidades brasileiras, que o laboratório virtual ConectaLAB vai pensar e propor soluções emergenciais ao abastecimento de água.
"Vamos pedir que as pessoas pensem num protótipo, que vai resolver um problema emergencial, mas que não tira responsabilidade do poder público", explica Paula Motta, primeira vice-presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil - departamento Rio Grande do Sul (IAB-RS), que organiza o laboratório.
"Com a licença poética dos laboratórios científicos, esse traz para um problema urbano a lógica da prototipagem e testagem", completa o arquiteto e urbanista Leonardo Brawl Márquez, do TransLAB.URB de Porto Alegre - o coletivo é parceiro na iniciativa, que conta com recursos do Ponto de Cultura, selecionado em edital do Governo do Estado em 2019.
Os participantes terão encontros online entre 31 de julho e 7 de agosto para pensar na resolução de problemas, como falta de canalização ou desabastecimento.
Dessa imersão podem surgir propostas para a construção de um reservatório coletivo, um sistema para captação e tratamento de água da chuva ou um lavatório de rua, dentre tantas outras possibilidades. O laboratório não terá direcionamento de projetos e a criação caberá a cada um dos quatro grupos a partir dos cenários apresentados. Como regra, pede apenas que a solução encontrada seja viável e coletiva.
Podem se candidatar pessoas de diferentes áreas de atuação - as inscrições estão abertas até o dia 20 em bit.ly/ConectaLAB_IABRS. O laboratório terá como resultado um caderno de soluções que possam ser facilmente adaptadas e replicáveis, desde que mantida a característica de conhecimento aberto e com referência ao ConectaLAB.
Numa segunda etapa, ainda sem data prevista, as ideias resultantes do laboratório serão executadas, contemplando o envolvimento de comunidades. Paula reforça que isso não elimina o papel de Estado e municípios. "No momento propomos o laboratório, ampliamos o debate para que o poder público olhe para o assunto e diga que está prestando atenção", afirma.

Projeto auxiliará comunidades para o acesso à internet

Além de pensar em propostas para o abastecimento de água em diferentes cenários, outro desafio do ConectaLAB é contemplar diferentes realidades nas equipes que participarão do laboratório. Com a restrição aos encontros presenciais justamente para evitar o contágio de Covid-19, todas as atividades serão virtuais. Por isso, representantes comunitários que estão sendo convidados a participar para compartilhar suas experiências com falta de água poderão receber auxílio para acesso à internet durante o período do laboratório.

Proposta é parte do conceito de urbanismo colaborativo

Essa metodologia de laboratório é uma ferramenta muito usada pelo urbanismo colaborativo. Paula Motta explica que esse é um conceito de participação cidadã e não é novo, mas está sendo revisitado. Leonardo Brawl Márquez reconhece que o termo "urbanismo" é popularmente entendido como o ato do planejamento urbano ou o desenho técnico, mas defende que ele já acontece no processo de elaboração, antes mesmo de se chegar no produto final.
Trazendo para uma referência mais conhecida, compara o urbanismo colaborativo ao Orçamento Participativo, que também tem como base a "escada da participação", em que, idealmente, todas as pessoas participam de todas as etapas da tomada de decisão. Ou seja, vai além de apenas consultar a população na etapa final de algum processo. "Convida a pessoa a identificar o problema para construir as perguntas que serão respondidas, e aí então chegar na solução", resume Brawl.