Guarda compartilhada contribui para participação igualitária de ambos os pais

Ao completar cinco anos, lei que torna medida obrigatória é considerada eficiente por advogados e especialistas

Por Yasmim Girardi

Guarda compartilhada impede que apenas um dos genitores esteja presente na vida e nas decisões dos filhos
Entre as preocupações de um casal na hora do divórcio, está, principalmente, a separação dos bens materiais. Casa, carro, dinheiro e outros tipos de patrimônio devem ser divididos de acordo com o regime de casamento. Para os casais de pais, porém, há uma aflição ainda maior: o que fazer com os filhos? A lei que estipula a aplicação da guarda compartilhada sofreu alterações em 22 de dezembro de 2014, tornando-a prioritária - salvo os casos em que o genitor que não detém a guarda não quer. Antes, o regime de guarda dos filhos preferencial era a guarda unilateral, na qual apenas um dos genitores detém do poder de escolha das decisões da vida da prole, e a guarda compartilhada era estipulada apenas para casais que não estivessem em litígio. A mudança, que completou cinco anos no domingo, prevê que a guarda compartilhada é a melhor solução mesmo para pais que não têm uma relação amigável. Ainda que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de registros de guarda compartilhada tenha aumentado 13,4 pontos percentuais entre o ano da alteração e 2017, a desinformação acerca desse tema ainda é grande.
Para a advogada especialista em Direito de Família e Sucessões Natália Abrunhosa, o aumento no número de pais que optaram pela guarda compartilhada não se deve somente à lei, mas também à vontade dos pais. "Tem um maior interesse do genitor não guardião - na grande maioria, os pais - de participar efetivamente da rotina dos filhos. Acho que os pais perceberam que não poderiam continuar exercendo um papel secundário na criação dos filhos, porque assim acabariam perdendo o vínculo. A lei veio em boa hora e ajudou sim, mas acho que não foi isso que fez com que os pais se conscientizassem e passassem a participar mais da vida dos filhos", explica.
O significado de guarda compartilhada ainda é desconhecido por um grande número de pessoas. No imaginário popular, é comumente confundido com guarda alternada, um regime muito popular em países como os Estados Unidos. Na compartilhada, ambos os genitores são responsáveis por tomar decisões sobre a vida dos filhos e, em conjunto, definir a escola em que a criança vai estudar e quais atividades extracurriculares ela vai fazer, por exemplo. Nesse regime, é aconselhável que a criança tenha períodos de convivência similares com ambos os genitores, mas não é obrigatório. Já na guarda alternada, os filhos passam a dividir a rotina em duas partes e, assim, conviver com os pais de forma igualitária. É normal que, nesse regime, as crianças passem 15 dias com cada um ou, ainda, dividam a semana entre os dois. Nesse caso, o genitor que estiver com a posse do filho no período tem exclusiva responsabilidade referente a tomada de decisões da vida da criança.
O presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam), Conrado Paulino da Rosa, acredita que a confusão entre os dois regimes é um dos vários motivos que contribuem para que a nova lei da guarda compartilhada ainda não tenha atingido seus objetivos. "Há 11 anos, tínhamos inserido no Código Civil a questão da guarda compartilhada e a nova lei veio para ser aplicada em ambientes de litígio, mas isso ainda é uma utopia. Temos uma grande confusão terminológica que contribui para isso. E também os próprios julgadores acabam tendo resistência de aplicar em casos de litígio. Mas, com certeza, um dos principais sentidos que essa alteração se propôs a trazer é uma mudança cultural, pelo fato de que temos uma divisão sexual de tarefas na sociedade, na qual as mulheres têm ainda o cuidado. Então, a questão da guarda compartilhada visa a uma coparticipação parental, para que ambos os pais se sintam responsáveis pelos filhos", defende.
De 2011, quando a primeira lei da guarda compartilhada entrou em vigência, para 2014, esse regime era sugerido apenas para pais que não estivessem em litígio. Atualmente, com a guarda compartilhada sendo considerada prioritária, os ex-casais que não mantém relacionamento também são aconselhados a adotar o regime. Para a advogada especialista em Direito da Família e Sucessões Karime Costalunga, é até mais recomendável para casais em litígio. "Assim não corre o risco de o genitor que detém a guarda do filho afastar o outro por não ter se conformado com o fim do casamento. Tem uma chance menor de os pais descontarem as frustrações nos filhos", justifica.
Já a juíza titular da 1ª Vara da Família do Foro Central de Porto Alegre, Maria Inês Linck, pensa que a guarda compartilhada é uma excelente forma de temperar as coisas. "Às vezes, é a melhor opção. Porque é uma maneira de restringir um pouco aquele que está muito empoderado e não deixa o outro genitor conviver, como também uma maneira de puxar um pouco aquele que é muito omisso."
 

Medida evita que conflitos que já existiam entre os genitores afetem a vida dos filhos

Outra preocupação bastante pertinente para os casais na hora de decidir o regime de guarda dos filhos é o bem-estar das crianças. A juíza defende que a guarda compartilhada é a melhor opção, não só por ser legal, mas também por evitar diversos conflitos, como a alienação parental, por exemplo. "Com os dois pais participando da vida dos filhos, existem menos chances de ter alienação. A guarda compartilhada é uma maneira de tentar minimizar e, através desse regime, é possível disciplinar esses conflitos", fundamenta.
Para a psicóloga e professora de Psicologia Jurídica do curso de Direito da Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP) Renata Dotta, a guarda compartilhada evita que as brigas já existentes entre os pais aumentem e afetem os filhos. "A guarda compartilhada é muito benéfica. Ela vai evitar que a criança seja usada como arma e que seja colocada no lugar de quem ganha ou perde a causa", complementa. Ela afirma que essa é uma grande conquista em prol da criança e do adolescente, que garante a boa convivência familiar e o bem-estar da família.
É comum que alguns pais evitem o divórcio para não afetar negativamente os filhos. Renata defende que é esperado que crianças e adolescentes tenham comportamentos para reagir aos acontecimentos e buscar atenção. "Do primeiro ao quarto ano do divórcio, as famílias ainda estão elaborando o luto dessa perda. Então é comum que as crianças apresentem sintomas. E os pais também precisam saber interpretar esses sentimentos."
A psicóloga atenta, também, que a convivência com ambos os pais é favorável para a criança. "Alguns estudos de grandes amostras feitos na Suécia já comparam esses aspectos. Já foi estudado, por exemplo, que crianças que vivem em guarda compartilhada adquirem maiores habilidades sociais do que aquelas que vivem em guarda unilateral. A convivência com os dois pais aumenta a autoestima e proporciona estabilidade emocional. Esse tipo de guarda pode minimizar os sentimentos ligados às perdas do divórcio", esclarece.