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Documentário analisa causa de quedas de Boeing 737 Max
Filme disponível na Netflix investiga razões para acidentes envolvendo modelo produzido pela maior fabricante de aviões do mundo
Uma das razões para a Boeing ter se tornado a maior fabricante de aviões do mundo foi a preocupação obsessiva com a segurança. Deixar essa atitude para trás levou a empresa à maior crise de sua história, mostra o documentário "Queda Livre: A Tragédia do Caso Boeing".
Disponível na Netflix, a produção investiga as razões para os dois acidentes com o modelo 737 Max, que mataram todos os viajantes a bordo. A primeira queda foi em outubro de 2018, na Indonésia, e deixou 189 mortos. A segunda, em março de 2019, na Etiópia, matou 157.
As tragédias geraram surpresa por envolverem aviões novos, em operação há poucos meses, e por terem ocorrido de modo parecido: as aeronaves despencaram pouco depois da decolagem, após os pilotos não conseguirem mantê-las estáveis. Após o segundo acidente, quase todos os países do mundo vetaram o uso do 737 Max, em um movimento nunca ocorrido antes.
O filme entrelaça detalhes técnicos dos acidentes, com projeções bastante realistas, a luta dos parentes das vítimas por respostas e as mudanças da cultura empresarial da Boeing.
A empresa americana revolucionou o setor aéreo a partir dos anos 1950, ao lançar aeronaves capazes de levar centenas de passageiros por longas distâncias e de modo seguro, o que tornou as viagens internacionais muito mais acessíveis.
Modelos lançados nos anos 1960, como o 737 (para viagens de média distância) e 747 (para cruzar oceanos) fizeram tanto sucesso que são usados no mundo inteiro até hoje, com atualizações tecnológicas. Uma destas adaptações, no entanto, é apontada como a causa dos acidentes com o Max.
Nos anos 2000, a Boeing perdeu o posto de maior fabricante de aviões comerciais para a Airbus. A fabricante europeia ganhou ainda mais espaço ao lançar, em 2010, o A320 Neo, modelo que se destacava por economizar combustível, questão sensível para as empresas aéreas.
Pressionada, a Boeing decidiu fazer uma adaptação no 737: colocar motores mais econômicos e relançá-lo como 737 Max.
A produção do modelo também foi marcada pela aceleração dos processos de produção: funcionários foram cobrados para evitar atrasos, e verificações de qualidade e segurança foram sendo abandonadas. Quem apontasse alguma falha era criticado, ou até punido pela chefia, o que criou um clima que estimulava o acobertamento de erros.
Assim, a prioridade deixou de ser a segurança, uma marca da empresa, para se tornar a obtenção de lucro e a remuneração de acionistas, dizem ex-funcionários.
Modelo foi um sucesso comercial da empresa, que alcançou a venda de mais de 5 mil unidades
Comercialmente, o 737 Max deu muito certo: a companhia conseguiu vender mais de 5.000 unidades dele nos anos seguintes. Para atrair as empresas aéreas, usou o argumento de que os pilotos não precisariam de treinamento novo, por se tratar do 737 de sempre. Como treinamentos custam caro, as empresas aéreas gostaram da ideia.
No entanto, o Max não era tão parecido assim com o 737 anterior. Havia um novo sistema, chamado MCAS, que servia para estabilizar automaticamente o avião caso detectasse que ele estivesse em um grau de inclinação errado.
O MCAS agia de modo automático, sem que os pilotos precisassem fazer nada --mecanismo que os pilotos afirmam não terem sido informados de que existia. Documentos mostram que a Boeing buscou esconder isso, para agilizar o processo de aprovação do 737 Max e evitar que as autoridades exigissem treinamento para operar a nova aeronave.
O sistema foi concebido para compensar a instabilidade gerada pelos novos motores, mais pesados que os anteriores, sem que fosse preciso fazer mudanças profundas de design.
Em outra tentativa de cortar custos, o sistema dependia apenas dos dados de um sensor externo, e não de dois, como é padrão. Assim, as investigações indicam que uma falha neste sensor fez com que o MCAS recebesse dados errados e, automaticamente, forçasse o avião a abaixar seu nariz na hora errada.
Sem entenderem o que estava acontecendo, os pilotos tentaram alinhar o avião, mas tiveram de brigar com as decisões automáticas de um sistema que desconheciam.
Estudos posteriores mostraram que os pilotos teriam apenas dez segundos para corrigir o rumo depois que o MCAS entrasse em ação fora de hora. Depois disso, a perda de estabilidade seria tão grande que tornaria impossível retomar o voo de forma normal.
Após o primeiro acidente, a Boeing buscou minimizar as falhas técnicas. Depois da segunda queda, disse que uma atualização dos sistemas seria suficiente. Os 737 Max receberam autorização para voltar a voar em outubro de 2020. Para escapar da má fama, passaram a ser chamados apenas de 737-8.
Após ser investigada pelo Congresso dos EUA, a Boeing fez um acordo e pagou US$ 2,5 bilhões (R$ 12 bilhões) em multas em troca de não ser processada criminalmente. A empresa não deu entrevista para o documentário, mas respondeu por escrito que refuta as críticas e que suas aeronaves são seguras.