Pagamento de dívidas dos contribuintes pode salvar finanças dos municípios

Apenas Curitiba, Porto Alegre, Joinville e Londrina têm a receber mais de R$ 10 bilhões

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Aplicações de até R$ 1 mil representaram 59,9% dos investimentos
Mais de R$ 34,5 bilhões: esse é o valor que os municípios da região Sul do País têm a receber dos contribuintes em dívida ativa de acordo com dados divulgados recentemente pelo anuário Multi Cidades - Finanças dos Municípios do Brasil, da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP). Em 2017, as administrações conseguiram recuperar R$ 1,5 bilhão desse montante.
Os municípios que acumulam maiores valores devidos por contribuintes são Curitiba (PR), com montante de R$ 5,9 bilhões; Porto Alegre (RS), com um total de R$ 2,6 bilhões; Londrina (PR), com 1,9 bilhão; e Joinville (SC), que tem pouco mais de R$ 1 bilhão a receber.
Ainda de acordo com a publicação, o ano de 2017 foi de recuperação desses valores. O destaque da região foi Ponta Grossa (PR), que recuperou R$ 53 milhões em 2017, valor 254% maior do que os R$ 14,9 milhões ressarcidos em 2016. Também no Paraná, o município de Cascavel aumentou em 120% sua recuperação e recebeu um montante de R$ 25,5 milhões no ano passado.
Blumenau (SC), Maringá (PR) e Foz do Iguaçu (PR) também incrementaram suas recuperações e registraram aumento de 88,6%, 58,7% e 53,9%, respectivamente, no período analisado.
Na outra ponta da tabela, quatro municípios não tiveram desempenho positivo em 2017. Entre eles, a capital Florianópolis (SC), que recuperou R$ 27,1 milhões no ano passado, valor 39,3% menor do que o recebido em 2016, que foi R$ 44,7 milhões; e Curitiba (PR), capital que tem R$ 5,9 bilhões a receber dos contribuintes e recuperou apenas R$ 149 milhões em 2017, valor 17,4% menor do que o registrado em 2016.
As duas outras cidades que apresentaram desempenho negativo foram Santa Maria (RS) e Pelotas (RS), com desaceleração de 9,8% e 1,2%, respectivamente, em suas recuperações de dívida ativa em 2017.
Em sua 14ª edição, a publicação utiliza como base números da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apresentando uma análise do comportamento dos principais itens da receita e despesa municipal, tais como ISS, IPTU, ICMS, FPM, despesas com pessoal, investimento, dívida, saúde, educação e outros.

Diminuição de repasses de receita preocupa prefeituras e rompe sequência de quatro anos seguidos de aumentos

Em 2017, os municípios brasileiros ficaram com 20% da receita disponível do setor público, participação ligeiramente inferior à do ano anterior, que foi de 20,2%. Os estados e a União detiveram 25,1% e 54,9%, respectivamente, indicadores muito próximos aos de 2016, sendo que os estados também registraram pequeno recuo e a União, um ligeiro aumento.
Apesar da pequena intensidade do recuo, de apenas 0,2 ponto percentual, a queda da participação dos municípios em 2017 rompeu uma sequência de quatro anos seguidos de aumento. Entende-se por receita disponível o volume de recursos à disposição de cada ente governamental, depois de realizada toda a arrecadação direta das três esferas e de repassadas todas as transferências obrigatórias (constitucionais e legais) de um ente para outro.
Simplificadamente, trata-se do montante de recursos que cada esfera de governo efetivamente possui para dar conta de suas atribuições. O pequeno recuo na participação dos municípios e dos estados no total da receita disponível, em 2017, decorreu da queda do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo de Participação dos Estados (FPE) que, no ano anterior, haviam recebido os recursos extraordinários da Lei da Repatriação (Lei nº 13.254, de 13 de janeiro de 2016), que instituiu o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (Rerct). Como em 2017 a entrada desses recursos extraordinários foi mínima, o FPM e o FPE apresentaram recuo.
Observando-se um período mais longo, de 2000 a 2017, percebe-se que os municípios aumentaram sua representatividade tanto na arrecadação direta quanto na receita disponível. No entanto, durante esse período, o crescimento relativo da arrecadação direta municipal foi mais intenso do que o da sua parcela na receita disponível.
A economia brasileira apresentou uma ligeira melhora em 2017, quando o Produto Interno Bruto (PIB) do País cresceu 1%, após dois anos de uma severa recessão, com uma queda acumulada do PIB de 6,9%.
A saída da recessão possibilitou uma reação da receita dos três níveis de governo. Com base nos dados extraídos do portal Compara Brasil e da Receita Federal é possível observar que nos dois anos mais agudos da crise econômica a receita total da União recuou 5,7%, em 2015, e 4,7%, em 2016. Em 2017, ela cresceu em 2,5%, excluindo-se os recursos extraordinários provenientes da Lei da Repatriação, tanto em 2016 quanto em 2017.
O conjunto dos estados, por sua vez, que havia registrado quedas de 4,3% e 5,4% na receita corrente nos mesmos anos, apresentou aumento de 2,4%, em 2017, também descontando-se os recursos da Lei da Repatriação.

Débitos acumulados com a União são bilionários e agravam dificuldades

Com dificuldades financeiras, os municípios também não têm conseguido honrar os pagamentos de suas dívidas. Em 2017, a dívida bruta dos estados e municípios com a União chegou a R$ 908 bilhões, conforme o documento Exposição da União à Insolvência dos Entes Subnacionais.
Entre 2010 e 2016, as receitas primárias dos estados mantiveram-se praticamente estáveis. Por outro lado, no período, as despesas obrigatórias com pessoal ativo e inativo cresceram em 6,5 pontos percentuais. Somando isso ao custeio, o conjunto de despesa avançou 9,9 pontos percentuais sobre a receita disponível para os estados.
De acordo com o Tesouro, durante a década de 1990, a situação deficitária dos entes subnacionais levou a União a editar diversas leis para trazer alívio financeiro aos estados e municípios. Após anos de baixo crescimento econômico e elevada inflação, as sucessivas medidas alcançaram o seu objetivo, embora tenha sido necessário um refinanciamento dos entes subnacionais por parte da União da ordem de R$ 630 bilhões em 2017.
"Hoje, novamente, diversos entes federados estão desequilibrados financeiramente e estão em busca de alívio financeiro no curto prazo. Esse desequilíbrio é fruto do aumento dos gastos obrigatórios, especificamente dos gastos com pessoal", aponta o estudo. Entre 2005 e 2016, a média do crescimento real com gasto de pessoal, ativos e inativos, para os estados foi de 57%; em cinco estados, a variação real desse gasto total com pessoal per capita ultrapassou os 80%. A título de comparação, o PIB (Produto Interno Bruto) real cresceu 52,61% no mesmo período.
"Essa tendência de crescimento do comprometimento da receita dos estados com pessoal tende a prejudicar o funcionamento dos serviços básicos dos governos estaduais, uma vez que restam cada vez menos recursos para a execução de políticas públicas (que envolvem gastos com mão de obra de terceiros, investimentos, material de consumo, entre outros)", diz o texto do Tesouro Nacional.
De acordo com o órgão, até o momento, as medidas tomadas apenas oferecem alívio no curto prazo, e a expectativa de médio prazo é o aumento do desequilíbrio fiscal. Apesar da atuação do governo federal para reduzir o risco de insolvência, como as renegociações de dívidas e a reformulação do Sistema de Garantias da União, algumas fragilidades ainda persistem.
Entre os problemas listados pelo Tesouro estão a concorrência por garantia subnacional, a judicialização das relações entre a União e os demais entes federados, a ausência das reformas fiscais estruturais e as divergências contábeis existentes entre os tribunais de contas estaduais, que acabam por reduzir a efetividade da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Segundo o Tesouro, competem ao Senado o estabelecimento de limites e condições para regular o endividamento dos estados e a concessão de garantias da União, entretanto, as referências máximas estabelecidas não são efetivas para evitar a contratação de dívidas por entes que apresentam situações fiscais frágeis. A primeira proposta é a de rever esses limites.
Outro ponto que demanda atenção, segundo o Tesouro, é a prática dos entes subnacionais de ofertar o mesmo fluxo de receitas próprias e de transferências como garantia de pagamento a credores distintos, especialmente a União e as instituições financeiras. A segunda proposta, então, é a construção de mecanismos de controle das receitas de Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) ofertadas como garantia para evitar a contratação de operações cujos efeitos colaterais financeiros sejam compartilhados.
A última proposta do Tesouro é a contenção dos vazamentos do sistema de regulação dos mecanismos de financiamento dos estados. Mais especificamente, segundo o órgão, refere-se ao uso de boas práticas a serem adotadas pelas instituições financeiras para a concessão de operações de crédito aos estados e municípios, de forma a manter um sistema de incentivos a uma situação fiscal saudável.

Porto Alegre é referência entrecapitais em recuperação de recursos

Primeira colocada no ranking de arrecadação tributária entre as capitais e referência em recuperação de créditos, a capital gaúcha vem registrando índices superiores ao longo dos anos na recuperação da dívida, de acordo com a Secretaria da Fazenda municipal. A arrecadação própria em 2018 apresentou crescimento de 5,77% no acumulado de 2018, "devido à intensificação da cobrança da dívida ativa e demais ações de fiscalização da Receita Municipal", afirmou o secretário Leonardo Busatto.
De acordo com o titular da Fazenda, a receita própria corresponde a apenas um terço do total da receita do município, e os outros dois terços são de transferências da União e do Estado, que vem tendo quedas sistemáticas. "Somente no ICMS, por exemplo, há uma queda real de 3,86%. Para a cidade conseguir prestar os serviços de saúde, educação, segurança e de infraestrutura que a população precisa, é fundamental seguir o trabalho de fiscalização e de cobrança dos devedores, e buscar alternativas, como a aprovação do Projeto do IPTU, que tornará o município menos dependente de repasses", diz.
A prefeitura projetava arrecadar R$ 200 milhões com a recuperação da dívida ativa, em 2018, do estoque de R$ 1,9 bilhão. O total arrecadado ainda não foi fechado.
Se conseguir chegar ao valor proposto pela Secretaria Municipal da Fazenda, por meio da Receita Municipal, o município se consolidará como a Capital líder em recuperação no País. Em dezembro de 2017, foram recuperados 10,70% do estoque da dívida ativa, mais do que o dobro da segunda colocada - Belém (4,59%), e até oito vezes acima da média das demais capitais.

Cidades têm mais de R$ 420 bilhões a receber de devedores

Após fechar 2016 com forte recessão e somar apenas R$ 6,79 bilhões de resgate na dívida ativa por conta da crise econômica, os municípios brasileiros experimentaram uma recuperação em 2017, com arrecadação 21,5% maior do que no ano anterior, somando R$ 8,25 bilhões de receita.
Ainda assim, as cidades ainda têm mais de R$ 420 bilhões para receber de contribuintes que estão em dívida ativa. Desse total, um quarto pertence ao município de São Paulo (SP), que fechou 2017 com R$ 104,95 milhões no estoque da dívida ativa.
Em seguida vem o Rio de Janeiro (RJ), com R$ 44,78 bilhões; Salvador (BA), com R$ 21,58 bilhões; Recife (PE), com R$ 10,01 bilhões; Campinas (SP), com R$ 8,53 bilhões; e Guarujá (SP), com R$ 7,65 bilhões a serem recebidos.
"Mesmo que o Judiciário parasse de receber novas execuções fiscais, ainda seriam necessários 11 anos para liquidar o acervo de dívida ativa existente. Por isso, as prefeituras deveriam rever esses números, pois muitos não serão mais recuperados", pontuou o economista e editor do anuário, Alberto Borges.