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Ciclovia da Ipiranga está longe de ser finalizada
Exatos seis anos após início das obras, ainda faltam 2,3 quilômetros para terminar os 9,4 prometidos pela prefeitura
No dia 18 de setembro, a reportagem do Jornal do Comércio registrou o atropelamento de um ciclista na avenida Ipiranga, em Porto Alegre, na esquina com a rua La Plata. Segundo uma testemunha, que pediu para não ser identificada, a bicicleta vinha junto ao meio-fio da avenida, pouco antes das 16h, quando uma lotação da linha 783-Ipiranga-PUC atingiu o ciclista. Uma unidade do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) prestou atendimento à vítima, que tinha lesões no tórax e suspeitas de fratura, mas permanecia consciente.
O acidente aconteceu no trecho incompleto da ciclovia da Ipiranga, obra que seria uma das estrelas da malha cicloviária da Capital e que, nesta sexta-feira, exatos seis anos após o início, segue sem perspectiva de conclusão. Com extensão total de 9,4 quilômetros, ainda restam 2,3 para fechar o trajeto previsto, localizados no trecho entre as avenidas Silva Só e Salvador França. As duas partes de pista já concluídas também apresentam problemas, que vão desde rachaduras no piso a falhas na pintura, passando por algumas situações mais graves.
Nas proximidades do Planetário, por exemplo, partes significativas do guarda-corpo estão danificadas. Nesses locais, um ciclista que perca o equilíbrio pode acabar caindo dentro do Arroio Dilúvio. Também não há uma padronização nas estruturas de proteção: em alguns trechos, em especial depois da Salvador França e em direção à avenida Antônio de Carvalho, não há qualquer barreira que proteja os ciclistas. Entre a Múcio Teixeira e a Getúlio Vargas, há um quadro ainda mais preocupante: parte do solo embaixo da pista ruiu, gerando um buraco que pode levar o concreto da ciclovia a desabar. As faixas de proteção, colocadas há meses pela prefeitura, já estão rompidas, sem que nenhum esforço visível tenha sido feito para melhorar a situação.
"O que vocês viram (no atropelamento) é o que a gente vivencia todos os dias naquele trecho", diz André Gomide, membro da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta (Mobicidade). Na leitura dele, a situação reflete as falhas de planejamento e de execução de todo o projeto. "A obra está parada há quase dois anos. Isso demonstra claramente como o modal (bicicleta) é tratado pelo poder público em Porto Alegre. Tentam induzir a cidade a pensar que a obra está pronta, o que não é verdade. Se o principal projeto do Plano Diretor Cicloviário não é concluído, o que sobra para o restante?", questiona.
Sem papas na língua, Gomide diz que "falta vergonha na cara" às diferentes administrações municipais envolvidas no projeto. "Vocês (jornalistas) já fizeram dezenas de matérias comigo, e a situação segue exatamente igual. Há universidades (no entorno da ciclovia), e um potencial reprimido para locomoção e também para lazer de fim de semana, que é mais tranquilo para quem está começando a andar de bicicleta. Mas muitas pessoas não ficam à vontade (em usar a ciclovia), sentem medo, e é fácil entender o motivo."
Grupo Zaffari diz ter cumprido todas as suas obrigações
A demora na conclusão da ciclovia da Ipiranga se deve a um impasse entre a prefeitura da Capital e o Grupo Zaffari, que teria assinado, em 2011, contrato de contrapartida referente ao trecho hoje incompleto. O modelo, porém, previa apenas que o pedaço de pista fosse entregue até o fim da construção do empreendimento que motiva a contrapartida, sem estabelecer um prazo específico para a ciclovia em si. Segundo a gestão municipal anterior, de José Fortunati, cabia à rede realizar as obras pendentes. Nos últimos meses, a administração atual, de Nelson Marchezan Júnior, tem negociado um novo termo de compromisso com o Zaffari, mas ainda não há qualquer prazo para a retomada dos trabalhos.
Em nota, o Grupo Zaffari afirma que contratou e disponibilizou, a pedido da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), o projeto executivo de toda a ciclovia, o que viabilizou a execução de diversos trechos, pela própria companhia e por outras empresas. Entre eles, está a parte da pista entre a Érico Veríssimo e a Silva Só - que, segundo o grupo "atendeu e ultrapassou com sobras os compromissos firmados até então".
A companhia frisa que "não há, por ora, compromissos a serem atendidos" pelo Zaffari em relação à ciclovia da Ipiranga. "Talvez a desinformação se deva ao fato de que o projeto executivo de toda a avenida foi patrocinado pelo Grupo Zaffari, dando a entender que também teria o compromisso de toda a execução. Se surgirem novos compromissos decorrentes de novos empreendimentos do grupo, e se for entendimento da EPTC destinar a contrapartida para a avenida Ipiranga, retomaremos oportunamente as obras", conclui a nota.
Em resposta escrita à reportagem, a EPTC garante que há uma mesa de negociações "permanente" com o Grupo Zaffari, e que a companhia "tem cumprido rigorosamente suas contrapartidas", inclusive adiantando intervenções relativas a empreendimentos ainda não realizados. Enquanto a situação segue em suspenso, a prefeitura não descarta bancar, com recursos próprios, a conclusão da ciclovia.
"A EPTC está fazendo orçamentos e refazendo previsão de custos para ver se é possível fazer (as obras no trecho restante) com investimento próprio ou qual alternativa é a mais adequada", diz o texto. Uma opção ventilada em junho deste ano, envolvendo as obras do futuro Hub da Saúde no bairro Teresópolis, em Porto Alegre, ainda está na mesa, segundo a EPTC, mas não evoluiu desde então.