Ufrgs vai ceder terreno à Vila Boa Esperança

Reitor fez promessa em audiência na AL; reintegração foi suspensa

Por Igor Natusch

Cerca de 300 pessoas residem no terreno, ocupado desde os anos 1960
As mais de 300 pessoas que residem na Vila Boa Esperança, erguida em terreno pertencente à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), tiveram uma boa notícia. Presente em uma audiência pública na Assembleia Legislativa (AL) do Estado sobre o tema, o reitor da Ufrgs, Rui Vicente Oppermann, garantiu aos moradores que não há interesse da universidade na área e que a instituição está disposta a ceder legalmente a posse aos moradores, que, em alguns casos, residem no local há mais de 50 anos.
No começo do mês, a juíza Daniela Cristina Pertile, da 6ª Vara Federal de Porto Alegre, suspendeu temporariamente o pedido de reintegração de posse da área, localizada no Morro da Companhia, à beira da avenida Bento Gonçalves. A medida reabriu espaço para uma solução negociada para o impasse - o que, garante Oppermann, era a intenção da atual gestão da Ufrgs desde o início.
"Sempre procuramos construir uma solução que não fosse prejudicial a ninguém", assegura o reitor, ressaltando, inclusive, ter orientado os servidores a não receber o oficial de justiça, em caso de expedição de mandado. Segundo ele, a falta de manifestação anterior da universidade deveu-se à judicialização do caso, que obrigaria institucionalmente a Ufrgs a não tomar posição pública até a cassação da reintegração.
Durante o encontro, o reitor afirmou que a Ufrgs está disposta a negociar o encaminhamento da cessão da área. Mas acentuou que não cabe à instituição assumir as necessidades de infraestrutura dos moradores, que precisam, segundo Oppermann, ser assumidas pelo poder público. Entre elas está a consolidação de um talude, que elimine o risco de deslizamentos de terra. "Acho que todas as partes estão prontas para o diálogo. O que é muito importante para nós é que haja garantias de que haverá um processo de urbanização. O projeto do talude foi feito há anos pela universidade, e a prefeitura (de Porto Alegre) ainda não o construiu", afirma.
Presidente da Associação de Moradores da Vila Boa Esperança, Erondina Sarturi garantiu que a própria comunidade pode assumir os custos do talude, desde que isso acelere o processo de regularização dos atuais moradores. "Somos uma comunidade extremamente pacífica, não tem ladrão, não tem tráfico de drogas. As pessoas entram e saem a qualquer hora e não acontece nada com elas. Já que a prefeitura diz que não tem dinheiro, nós colocamos (o talude)", reforçou ela, que mora há 25 anos na Boa Esperança.
Boa parte dos moradores já conta com serviços de água e esgoto, e há um esforço em andamento para a regularização do fornecimento de energia elétrica. "Ninguém quer botar placa para vender sua casa", reforça Cléuton da Silva Lima, vice-presidente da associação. "Buscamos apenas que seja cumprido o fim de moradia, que possamos morar onde moramos a vida inteira."

Lei permite titulação individual para famílias

A indefinição em torno da área se arrasta desde 2009. Na época, o Ministério Público Federal (MPF) encaminhou um pedido de informações sobre ocupações irregulares em áreas da universidade. A partir do mapeamento fornecido pela Ufrgs, o MPF ingressou com o pedido de reintegração, em nome da universidade. Em nenhum momento, porém, houve indicativo de uma possível outra utilização do espaço, principalmente devido aos riscos de desmoronamento e à possibilidade do terreno ser parte de uma Área de Proteção Permanente.
Durante a sessão, o coordenador de cooperativismo do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) da prefeitura de Porto Alegre, Ademir Maria, acenou com a possibilidade de cooperativar as 96 famílias que residem na vila, como forma de garantir a posse gradual da área e a realização de projetos de infraestrutura. A hipótese, contudo, foi questionada pela defensora regional de Direitos Humanos da Defensoria Pública da União (DPU), Ana Luisa Zago de Moraes. De acordo com ela, a Medida Provisória nº 759, de 2016, abre margem para a titulação individual de posse em situações como a da Vila Boa Esperança, cabendo, então, ao Demhab promover o credenciamento dos moradores para a legalização de suas residências.
"Seremos sempre a favor da conciliação", garantiu a defensora. "Mas, na medida em que seja confirmada a doação da Ufrgs, que não haja soma de valor ao terreno, que é o que pode ocorrer em caso da constituição de uma cooperativa." Uma possibilidade é que a universidade ceda o terreno à União, permitindo a regularização das famílias em um segundo momento.