Termina prazo para recorrer de inventário do Petrópolis

Lista engloba cerca de 400 imóveis, considerados patrimônio cultural

Por Suzy Scarton

CASAS INVENTARIADAS PELO PATRIMÔNIO HISTÓRICO NO BAIRRO PETRÓPOLIS, NA RUA FELIPE DE OLIVEIRA. FOTOS DA RUA NO TRECHO DAS CASAS NROS. 1164, 1193, 1231, 1309, 1316
Termina nesta sexta-feira o prazo concedido pela prefeitura de Porto Alegre para que os moradores do bairro Petrópolis apresentem recurso contrário à medida que define cerca de 400 imóveis como parte do Inventário do Patrimônio Cultural da cidade. Caso não o façam, esses proprietários estarão proibidos de realizar alterações que excedam a lei de estruturação e compatibilização nas residências.
Além de complexo, o caso é antigo. Em janeiro de 2014, a prefeitura, sob administração de José Fortunati, divulgou uma lista que incluiu centenas de imóveis do bairro no inventário, elaborado pela Equipe do Patrimônio Histórico e Cultural (Epahc). Na época, cerca de 200 foram considerados como imóveis de estruturação, que devem ser preservados, e outros 160 como de compatibilização, que têm relevância pela composição do entorno.
Mais tarde, essa primeira lista foi revogada e refeita por duas vezes. Em dezembro do ano passado, coincidentemente o último mês da gestão de Fortunati no governo, os moradores passaram a receber notificações a respeito da inclusão em uma nova lista. "Não nos causou surpresa, foi mais um episódio de uma prática que já vinha ocorrendo", conta o presidente da Associação dos Moradores do Petrópolis, Fernando Pires.
O problema da decisão da prefeitura é que, no entendimento dos moradores, a inclusão em inventário causa prejuízo, uma vez que "ninguém vai comprar uma casa em que não pode mexer", conforme afirma Pires. Além disso, a inclusão dos imóveis na listagem provocou uma desvalorização de 70% e, segundo definido por lei, a manutenção do imóvel fica sob responsabilidade do proprietário, sendo que a ele não cabe indenização, como ocorre no processo de tombamento.
Mesmo com o término do prazo de impugnação, Pires garante que os moradores continuarão a lutar por aquilo que consideram como direito deles. A estratégia, agora, é atacar a lei que define o processo de inventário.
Advogado de moradores, Daniel Nichele impetrou mandado de segurança pedindo a anulação do ato de inventário de alguns dos imóveis tendo como causa a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 601/2008 (Lei dos Inventários). Isso porque, durante o período em que corre o processo, duas leis - 743/2014, do vereador Idenir Cecchim (PMDB), e 20/2014, do vereador Mauro Pinheiro (Rede) - foram criadas com finalidade de alterá-la.
No entanto, ambas foram consideradas inconstitucionais por vício de origem, uma vez que esse tipo de alteração só pode ser requerido pelo Executivo. Nichele argumenta que a própria Lei nº 601/2008 foi elaborada por duas vereadoras, Sofia Cavedon (PT) e Margarete Moraes (na época, PT; hoje, afastada da política), fato que, por analogia, a tornaria inconstitucional. "Já obtivemos parecer favorável por parte do Ministério Público. Agora, aguardamos a sessão de julgamento do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul", explica o advogado.
 

Para presidente da associação de moradores, 'bairro está morrendo'

“Do belo que querem preservar, não resta muito.” É assim que Fernando Pires, presidente da Associação dos Moradores do Petrópolis, descreve a situação. Uma vez que o processo segue em andamento desde 2014, o bairro está congelado. Como relata o presidente, há muito o bairro deixou de viver seu fluxo natural de vida. “Vários imóveis estão à venda, outros, alugados. Muitos eram usados como escritórios e, com a crise, foram deixados para trás. Os novos locatários precisam alterar o espaço, como adequações à Lei Kiss, e não podem. Precisam de uma licença da prefeitura, que leva de dois a quatro anos para sair”, descreve. Para ele, o bairro está morrendo.
Para garantir a sobrevivência da região, Pires aposta na medida de Daniel Nichele, advogado de alguns dos moradores, que impetrou mandado de segurança pedindo a inconstitucionalidade da lei de inventários. “Temos a perspectiva de derrubar a lei e, aí, a prefeitura pode ficar livre para fazer novo inventário”, explica.
Além de tudo, o presidente também relata uma dificuldade técnica. “Para fazer a impugnação, o morador precisa saber o motivo pelo qual faz esse pedido. Precisa argumentar que o imóvel não é histórico, que a lei é irregular, entre outros. Mas, até agora, a prefeitura não apresentou os motivos completos, e os critérios que determinam o que foi inventariado são muitos. Se não se encaixa em um, pode se encaixar no outro”, observa.
Para Nichele, o pedido de impugnação é relevante e deve ser feito por todos os moradores que se sintam prejudicados. Com o término do prazo, os pedidos serão analisados para que o resultado seja homologado pelo prefeito. “A partir daí, não há mais recurso administrativo, os proprietários terão de aceitar as normas impostas pela lei”, argumenta. No entanto, o advogado explica que muitos dos clientes já entraram com ações indenizatórias contra a prefeitura. O formulário para o pedido de impugnação está disponível no site da Secretaria Municipal de Cultura (http://www2.portoalegre.rs.gov.br/smc/default.php).