Delação da Odebrecht vai ser publicada em fevereiro

Divulgação dos relatos de 77 delatores causa apreensão em políticos

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Ministro estava em avião que caiu na baía de Paraty há dois anos
Investigadores da Operação Lava Jato trabalham com a previsão de que todo o conteúdo das delações da Odebrecht seja tornado público na primeira quinzena de fevereiro. A divulgação dos relatos de 77 delatores ligados à empresa causa apreensão no mundo político, que deve ser diretamente atingido pelas investigações.
A expectativa de investigadores é de que o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, retire o sigilo dos cerca de 900 depoimentos tão logo as delações sejam homologadas. Isso deve ocorrer após o fim do recesso do Judiciário, nos primeiros dias de fevereiro.
Como relator da Lava Jato na Corte, cabe a Zavascki validar as delações. Para isso, uma equipe do ministro analisa todo o material durante o recesso. O material resultou de uma longa negociação, que se estendeu ao longo de 2016.
Nos depoimentos, que serão divulgados em formato de áudio e vídeo, sem transcrições, os delatores relatam propina a políticos e operadores no Brasil e fora do País em troca da conquista de obras públicas, bem como o uso de contas e empresas no exterior para viabilizar pagamentos ilícitos.
De acordo com fontes, aliados próximos ao presidente Michel Temer (PMDB) serão diretamente atingidos pela delação da empresa, o que deve trazer turbulência política para o governo.
Após a homologação dos acordos e divulgação do conteúdo, a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a força-tarefa da Lava Jato podem realizar operações e solicitar diligências, como quebra de sigilo bancário e telefônico de investigados. A previsão é de que o processo de investigação ligado à Odebrecht seja longo, com a distribuição das investigações em vários estados brasileiros.
Isso porque o pagamento de propina ocorreu para conquista de obras de todas as esferas - federal, estadual e municipal. Por isso, a investigação não ficará concentrada em Brasília ou Curitiba.
Um dos depoimentos tidos como cruciais é o do herdeiro do grupo e ex-presidente da empresa Marcelo Odebrecht. Considerado o "príncipe" das empreiteiras, Marcelo resistiu a aderir ao acordo de delação. Ele é o único executivo do grupo que continua preso em Curitiba (PR) mesmo após a assinatura do acordo, em dezembro. Com a delação firmada, Marcelo Odebrecht cumprirá 10 anos de pena sendo que, até o final de 2017, permanecerá atrás das grades.
Já o patriarca do grupo e pai de Marcelo, Emílio Odebrecht, revelou em sua delação informações de contexto e histórico da empresa. Emílio poderá passar um ano reestruturando a empresa, que se comprometeu com novas regras de compliance, antes de iniciar o cumprimento de pena em regime domiciliar.

Para Temer, chance de ser atingido por depoimentos é zero

O presidente Michel Temer (PMDB) afirmou, em entrevista à agência de notícias Reuters, que há "chance zero" de que ele seja atingido pelas investigações realizadas pela Operação Lava Jato. "Nós não estamos preocupados. Não há a menor chance disso", disse.
Temer afirmou ainda considerar que os depoimentos de executivos e ex-executivos da Odebrecht - nos quais há a expectativa de que até 200 políticos sejam citados - não ajudam a "estabilidade" (do País), mas que não causariam a paralisação da agenda legislativa ou divisões na coalizão governista.
O nome do presidente já foi citado em ao menos dois dos acordos de delação. Segundo o ex-executivo Cláudio Melo Filho, Temer teria pedido "apoio financeiro" para as campanhas do PMDB em 2014 a Marcelo Odebrecht, que teria se comprometido com um pagamento de R$ 10 milhões.
Outro ex-executivo do grupo, Márcio Faria, relatou em sua colaboração uma reunião, em 2010, na qual Temer e o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) teriam pedido recursos para a campanha eleitoral daquele ano em troca de beneficiar a empreiteira em contratos com a Petrobras. O peemedebista nega irregularidades e afirma que todas as doações recebidas foram devidamente registradas.
Agora, uma nova colaboração da empreiteira Camargo Corrêa promete ressuscitar a Operação Castelo de Areia, anulada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2009 e que envolvia integrantes de sete partidos, entre eles o próprio presidente Temer.
Nos sete meses de governo, a Lava Jato também provocou baixa de ministros de Temer, envolvidos de alguma forma nas investigações, como o senador Romero Jucá (PMDB-RR), que deixou a pasta do Planejamento, e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que pediu demissão do Turismo.
Na entrevista, Temer voltou a negar que esteja interessado em disputar a reeleição em 2018. "Nós queremos colocar o Brasil de volta na pista. E nós ainda temos dois anos para isso", afirmou, definindo-se como "presidente zelador".