União reduz plano para a aviação regional

Governo considera que a intenção de reformar 270 terminais em todo o País era exagerada e não tinha demanda suficiente

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Moreira Franco (e) previa, ao lançar plano no governo Dilma, que seriam gastos R$ 1 bi de subsídio a passagens
O projeto de estimular a aviação regional continuará no governo de Michel Temer, mas será drásticamente reduzido. Em vez de reformar 270 aeroportos do interior e investir R$ 7,3 bilhões, como anunciou Dilma Rousseff em dezembro de 2012, serão 53 projetos com um investimento de R$ 2,4 bilhões até 2020. Para o ministro de Transportes, Aviação Civil e Portos, Maurício Quintella, a nova lista "é bem mais realista" e de acordo com a situação financeira do governo federal.
"Fizemos uma triagem para avaliar o que se justificava tecnicamente e economicamente", avaliou Dario Lopes, secretário de Aviação Civil do Ministério dos Transportes. O governo já tem assegurado R$ 300 milhões do montante necessário para a reforma dos aeroportos.
A estimativa de levar voos comerciais para 270 aeroportos do interior do País era considerada exagerada no setor aéreo. "Não tem demanda e não vai ter", garante uma fonte de mercado. A ordem no governo é estabelecer prioridades, escolher cerca de 20 aeroportos e fazer as primeiras licitações das obras. Outro ponto que estava no programa de Dilma e deve ser rediscutido é a concessão de subsídios para empresas aéreas que fizerem voos regionais. A primeira estimativa do então ministro da Aviação Civil do governo Dilma, Moreira Franco, era liberar R$ 1 bilhão por ano para subsídios.
Dezenove aeroportos de São Paulo estavam na lista original do programa. Segundo o Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (Daesp), há apenas seis com operação regional e outros dois com potencial entre os 26 do Daesp. "O custo de manter um aeroporto é alto. Precisa ter equipamento de raio x e carro de bombeiros mesmo que só tenha um voo no local", explica o superintendente do Daesp, Ricardo Volpi.
O governo de Minas Gerais, com um plano próprio, saiu na frente e realizou, na semana passada, o voo inaugural do Projeto de Integração Regional - Modal Aéreo (Pirma). A iniciativa cria uma ligação aérea direta entre Belo Horizonte e 12 municípios do interior. O objetivo é promover o desenvolvimento econômico regionalizado, favorecer os negócios, e potencializar o turismo.
A primeira viagem foi realizada para São João del-Rei e durou 40 minutos. Também fazem parte do projeto as cidades de Curvelo, Diamantina, Divinópolis, Juiz de Fora, Muriaé, Patos de Minas, Ponte Nova, Teófilo Otoni, Ubá, Varginha e Viçosa.
Idealizado pela Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), o Pirma conta inicialmente com 60 voos por semana. As viagens não têm escalas e são realizadas em avião monomotor, para até nove passageiros.
Em Belo Horizonte, o projeto opera no aeroporto da Pampulha. As vendas das passagens ocorrem pela internet, por meio do site do governo mineiro. Os preços variam de acordo com a rota e vão de R$ 160,00 a R$ 550,00.
Segundo Marco Antônio Castello Branco, presidente da Codemig, uma pesquisa de mercado foi encomendada para traçar o perfil da população que poderia utilizar o serviço. Foram realizadas 2,1 mil entrevistas em 31 municípios.
"Percebemos no levantamento que o Pirma atenderia muitas pessoas que vêm a Belo Horizonte, seja por trabalho, questões de saúde ou de lazer. Conseguimos identificar o limite do custo do transporte aéreo compatível com a renda dessas pessoas. Vimos que as aeronaves de pequeno porte atendiam a esse limite", explicou Castelo Branco.
Uma licitação definiu a companhia Two Táxi Aéro como a responsável pelo transporte dos passageiros dos voos regionais. O risco econômico, porém, será da Codemig. "Compramos no atacado as horas de voo pelos próximos 12 meses e estamos agora vendendo à população. Carregaremos o ônus dos assentos que não forem comercializados", garantiu Castelo Branco.

Estado acena com incentivos fiscais para operação de aéreas no Interior

Lançado em outubro do ano passado, o Programa Estadual de Desenvolvimento da Aviação Regional gaúcho tem o objetivo de atrair empresas aéreas para rotas dentro do Rio Grande do Sul, beneficiando o desenvolvimento do Estado. O programa prevê a concessão de incentivos fiscais para as empresas, desde que as rotas regionais atendam a quatro ou mais municípios. Além disso, as empresas aéreas terão a obrigação de operar com pacotes para roteiros turísticos e eventos gaúchos.
A Azul Linhas Aéreas foi a primeira companhia a assinar o acordo com o governo gaúcho. A empresa oferece voos para Santa Maria, Pelotas, Passo Fundo e Uruguaiana. A rota entre Uruguaiana e Porto Alegre, que estava suspensa há dois anos e meio, foi retomada em 27 de maio com a realização de um voo entre as duas cidades.
O trecho, operado pela Azul, abriu o Plano Estadual de Desenvolvimento da Aviação Regional. A primeira-dama e secretária de Políticas Sociais, Maria Helena Sartori, prestigiou a decolagem do avião, que voou nas cores alusivas ao Outubro Rosa.
O secretário de Indústria e Comércio, Jorge Prestes Lopes, explicou que o investimento de cerca de R$ 90 mil previsto para as adequações foi gasto "entre projeto, equipamento e infraestrutura". A aeronave utilizada nesse voo tem capacidade para 70 lugares, e a empresa ofereceu passagens promocionais por R$ 139,00. O programa pretende colocar em operação, até 2017, vários aeroportos que possam atender cidades num raio de até 180 quilômetros.
O aeroporto Sepé Tiaraju, de Santo Ângelo, teve a repavimentação da pista de pouso e decolagem inaugurada em maio. A obra é a primeira do Brasil a ser concluída no âmbito do Departamento de Gestão do Programa Federal de Auxílio a Aeroportos (Profaa), sob gestão da Secretaria de Aviação Civil.
Também foi entregue um carro contra incêndio, requisito para operação de aeronaves de médio porte. A restauração da pista, do pátio de aeronaves, da cerca operacional e da sinalização vertical teve um custo de R$ 5,13 milhões, sendo R$ 3,6 milhões da Secretaria de Aviação e R$ 1,5 milhões do governo estadual.
A reforma do aeroporto de Santo Ângelo permitiu a ampliação de capacidade da pista, que passará da categoria 2C para a categoria 3C, o que viabiliza a operação de aeronaves Embraer 190, com capacidade para 100 pessoas, e de turboélices ATR 72-600, de 70 assentos.
A Azul já solicitou autorização da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para operar voos regulares no terminal da cidade a partir de setembro. A informação foi dada pelo representante da companhia aérea, José Luiz Felber: "Agora, falta pouco para que Santo Ângelo seja o sétimo destino operado pela Azul no Rio Grande do Sul", garantiu.

Aeroportos do interior perderam operações, e planos ficam no sonho

Menos de dois anos após sua reinauguração, o aeroporto de São José dos Campos, no interior de São Paulo, está às moscas. O terminal recebeu obras de modernização que aumentaram em mais de cinco vezes a área destinada aos passageiros, para 5 mil m2. A reforma foi feita com a estimativa de atender a um tráfego esperado de 600 mil passageiros por ano.
Meses depois da reinauguração, a Azul suspendeu os voos no local. Em junho de 2016, foi a vez de a Latam abandonar a operação no aeroporto. Hoje, só os passageiros da aviação executiva embarcam em São José dos Campos. Os guichês de check-in estão vazios, a lanchonete fechou e uma lona cobre o balcão da Localiza.
São José dos Campos foi uma das nove cidades brasileiras que saíram da malha das grandes empresas desde 2015. Em meio à crise econômica, elas deixaram para trás cidades como Pato de Minas (MG), Macaé (RJ), São Gabriel da Cachoeira (AM), Tucuruí e Porto Trombetas (ambas no Pará). Algumas ainda têm voos de empresas pequenas, que representam menos de 1% do mercado potencial.
"A aviação brasileira está diminuindo", resume o presidente da Associação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz. O motivo, explica ele, é que o setor sofreu um choque de custos ao mesmo tempo em que a demanda sofreu uma queda. "Diversos voos não se viabilizam mais. A solução foi cortar", conclui o presidente da Abear.
Em média, o número de decolagens de TAM, Gol, Azul e Avianca recuou 10% no primeiro semestre deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado. O movimento vai na contramão do que era prometido para a aviação regional.
A Azul é a única empresa entre as grandes que tem uma frota específica para a aviação regional - o turboélice ATR. A empresa voa hoje para cerca de 100 destinos e atua sozinha em cerca de 40 cidades. Nos últimos meses, no entanto, a Azul suspendeu voos no interior e se desfez de 18 ATRs. Foram 11 destinos cancelados, incluindo apenas uma capital, desde 2015.
A empresa iniciou operações em outras quatro cidades no interior no período, mas o saldo ficou negativo. "A aviação regional perdeu muitos voos, porque não se fez nada para melhorar os aeroportos e reduzir o preço do combustível", afirma o presidente da Azul, Antonoaldo Neves.
A maioria dos cortes de voos foi feito por falta de viabilidade financeira. Mas a infraestrutura falha também pesou. São Gabriel da Cachoeira e Coari, no Amazonas, por exemplo, tiveram voos cancelados por isso, diz Neves. "São coisas pequenas. Equipamentos quebrados e licenças que venceram que inviabilizaram a operação."
Mas, a seu ver, o maior problema é o preço do combustível. O querosene de aviação (QAV) no Brasil já é mais caro do que no exterior, mas no interior os valores são ainda maiores do que nas capitais. Um litro de QAV sai por R$ 1,36 nos EUA, R$ 2,25 em São Paulo e R$ 6,74 em Cacoal (RO). Como 37% do custo de um voo é composto pelo combustível, a mesma distância pode custar o dobro se o voo partir de cidades do interior do que de São Paulo. Para ser viável, o preço da passagem teria de ser muito superior, o que muitas vezes não cabe no bolso do passageiro.
A redução de voos para o interior reflete o que ocorre na malha aérea como um todo, explica Alberto Fajerman, diretor de relações institucionais da Gol. "Tiramos 20 aviões da frota neste ano. O mesmo avião voa para cidades grandes e pequenas, como se estivesse em um trilho, então vários destinos foram afetados."
A Latam também fechou bases no interior e colocou na gaveta planos de montar uma frota para voos regionais. "Estudamos seriamente esse projeto e chegamos a iniciar negociações com Embraer e Bombardier", diz a presidente da Latam Brasil, Claudia Sender. Ela ressalta que a empresa ainda acredita que o crescimento do tráfego aéreo virá das cidades médias e tem interesse em novos destinos regionais.

Terminais para a aviação executiva paralisaram as obras e viraram 'mico'

Há cerca de dois anos e meio, um projeto em Caçapava, localizada a 120 quilômetros de São Paulo, se apresentava como alternativa para desafogar o tráfego aéreo da capital paulista. O Grupo Penido, que atua em construção civil na região, recebeu no canteiro de obras o então ministro da Aviação Civil Moreira Franco, políticos locais, a imprensa nacional e regional e nomes importantes do setor aéreo, como o fundador da Embraer, Ozires Silva, para a cerimônia de concessão de outorga para explorar um aeroporto, o Aerovale.
Na ocasião, a promessa era investir R$ 250 milhões e iniciar as operações antes da Copa do Mundo. De lá para cá, a obra foi paralisada por questões ambientais, e a construtora entrou em recuperação judicial. Hoje, o que sobrou é uma imensidão de terra, um galpão fechado, máquinas paradas e uma pista inacabada.
O Aerovale é um dos 10 projetos de construção de novos aeroportos submetidos ao governo desde dezembro de 2012, quando Dilma Rousseff liberou à iniciativa privada a construção e exploração comercial de aeroportos para a aviação executiva. Desses projetos, cinco receberam o aval do governo, mas só um, em Igarassu (PE), está em operação.
Os grupos paulistas saíram na frente e tiveram os três primeiros projetos autorizados, entre julho de 2013 e fevereiro de 2014 - um aeroporto no bairro de Parelheiros, em São Paulo, do grupo Harpia; um em São Roque (SP), da JHSF; e o aeroporto de Caçapava, do Grupo Penido. Cifras bilionárias e projeções otimistas de inauguração marcaram os anúncios.
O primeiro projeto anunciado foi o de Parelheiros, em julho de 2013, que previa a construção de um aeroporto em uma área de 4 milhões de m2. O investimento previsto para a obra era de R$ 1 bilhão em 10 anos, e a inauguração era prometida para 18 meses. Hoje, o projeto está em "stand by", explica André Skaf, sócio da Harpia Logística.
Em meados de 2013, a Associação Brasileira de Aviação Geral estimava que o setor crescia a um ritmo de 6% ao ano e que a infraestrutura estaria estrangulada em pouco tempo. Hoje, o cenário é de retração. O número de pousos e decolagens da aviação executiva caiu 11% no primeiro semestre deste ano nos aeroportos da Infraero, na comparação com o mesmo período de 2015.
Além da retração no setor, os cenários político e econômico brasileiro também inviabilizam alguns empreendimentos, segundo o advogado Bruno Werneck, sócio da área de infraestrutura do escritório de advocacia Mattos Filho. Com o custo de financiamento maior, qualquer projeto de médio e longo prazos requer um retorno mais alto para ser atrativo.
"Imagine quanto precisa remunerar um projeto de R$ 100 milhões com a Selic (taxa básica de juros) a 14,25% ao ano", diz Werneck. O advogado ressalta que a mortalidade de projetos é uma situação "natural". "Existem 20 na largada, mas alguns vão morrendo no caminho e no fim sobram poucos. É natural."
De fato, o número de pedidos para explorar aeroportos foi minguando com o tempo - dos 20 pedidos de outorga registrados, só um foi feito nos últimos 18 meses e vários projetos estão congelados. Um deles é o aeroporto JMalucelli, em uma área de 360 hectares em Balsa Nova (PR).
"Não andou", resume Joel Malucelli, fundador do Grupo Malucelli, um dos maiores do Paraná. Segundo o empresário, o aeroporto ainda está nos planos, mas é um projeto para o futuro. "Ele ficará pronto quatro a cinco anos após as regularizações. Até lá, a crise já passou."
O empresário Rogério Penido, dono do Aerovale, disse que o empreendimento ainda está de pé. Localizado em uma área de 2,26 milhões de m2, o projeto prevê 117 hangares, 188 lotes industriais e comerciais, edifícios corporativos, dois hotéis, um centro de convenções, torres comerciais, outlet e quadras poliesportivas para locação. Para viabilizar a construção, o grupo está procurando investidores.